A ministra da Cultura, Ana de Hollanda, começou sua gestão dissipando as boas expectativas sobre ela (como as minhas) e, ao que parece, metendo os pés pelas mãos. Sua decisão de retirar do site do Ministério da Cultura as licenças Creative Commons causou perplexidade entre os defensores e ativistas de políticas compartilhamento de obras (textos, músicas etc).
O jornalista Luiz Egypto, editor do site Observatório da Imprensa, que trabalha com licenciamento Creative Commons, afirma que ‘o projeto Creative Commons é um avanço importante no que diz respeito à segurança jurídico-institucional dos processo de criação e produção colaborativa e de disseminação de conteúdos na internet. Lamento a decisão da ministra Ana de Hollanda. Não entendi o porquê da atitude’.
Em entrevista também a este blog, o sociólogo Sérgio Amadeu, conhecido ativista da inclusão digital e software livre e que implantou os Telecentros Comunitários em São Paulo durante a gestão Marta Suplicy, diz que a medida de Ana de Hollanda ‘afronta a política de compartilhamento iniciada no governo Lula’.
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Qual sua opinião sobre a medida adotada pela ministra?
Sérgio Amadeu – A questão é a seguinte: a ministra tomou uma atitude extremamente contraditória com a política do governo Dilma. A Dilma mantém o Blog do Planalto, instalado, implementado pelo presidente Lula em Creative Commons, e que continua em Creative Commons. E ela, a ministra, fez um ato que é afrontar a política de compartilhamento iniciada no governo Lula e afrontar a própria Dilma, que disse exatamente que iria continuar a política iniciada na gestão do Gilberto Gil e do Lula. Então ela, além disso, cometeu uma ilegalidade, porque não poderia tirar as licenças do Creative Commons das matérias e postagens que já tinham sido publicadas em Creative Commons.
E portanto licenciadas assim…
S.A. – Exatamente. Ela pode fazer daqui pra frente. Ou seja, ela está mal assessorada e está fazendo uma ação de confronto com a política implementada pelo governo do presidente Lula.
Na prática, o ato de Ana de Hollanda pode ter que consequências?
S.A. – Na realidade, nós vamos ter uma ministra do Ecad [Escritório Central de Arrecadação e Distribuição], e não uma ministra da Cultura. Ela veio para retroceder todo o avanço que havia sido conseguido no compartilhamento de cultura, na ampliação da cultura, na superação da visão de que cultura é apenas é apenas mercado. É basicamente isso.
Você está surpreso com a medida?
S.A. – Estou surpreso, sim. Eu não a conhecia, nunca tinha ouvido falar da ministra como uma gestora pública. E tinha uma expectativa positiva em relação a ela. Mas, infelizmente, a gente não pode manter essa expectativa porque ela tomou atitudes absurdas.
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Ministra deu uma canetada e se escondeu na concha
Leitores questionam o fato de que as informações divulgadas neste e em outros blogs e sites a respeito da medida da ministra Ana de Hollanda, sobre as licenças Creative Commons, não dão a versão da ministra.
‘Por que não a entrevistam, não ouvem as razões das medidas tomadas?’, pergunta um internauta que se identifica como Nelson.
‘Ouvir outro [lado] é fundamental’, diz, também, Victor, do blog Cartão Laranja.
Esses leitores/internautas reivindicam o que é justo. Só que cabe aqui uma observação: este [Fatos Etc.] e outros blogs e sites, revistas e jornais gostaríamos muito de entrevistar Ana de Hollanda para que ela desse a sua versão.
E há uma versão, até agora a única. A da Assessoria de Comunicação do Ministério da Cultura, já publicada em vários veículos e blogs desde sexta-feira (21/1), que diz, lacônica e evasivamente, o seguinte:
‘Nota de esclarecimento do Ministério da Cultura
‘A retirada da referência ao Creative Commons da página principal do Ministério da Cultura se deu porque a legislação brasileira permite a liberação de conteúdo.
‘Não há necessidade de o ministério dar destaque a uma iniciativa específica. Isso não impede que o Creative Commons ou outras formas de licenciamento sejam utilizados pelos interessados.’
Esta vazia informação está na home page do Ministério da Cultura, e a ‘notícia em destaque’ pode ser acessada aqui.
Como sabe qualquer jornalista, um ministro de Estado não dá entrevista se não quer. Dá só quando julga conveniente e, muitas vezes, para o jornalista que prefere. Ainda mais se esse ministro ou ministra está perdendo muito tempo em encontrar justificativas para atos difíceis de explicar. Em outras palavras, Ana de Hollanda preferiu não dar ainda sua versão sobre a medida. Portanto, a versão oficial sobre o tema é a que foi divulgada até o momento (2h05 de 25/1) pelo Ministério da Cultura. Essa ‘notícia’ está desde sábado (22) no portal do MinC.
Até esta data e horário, ao que parece, a última aparição da ministra foi a registrada pela coluna de Mônica Bergamo, da Folha de S. Paulo (22/1): ‘A ministra Ana de Hollanda, da Cultura, confirmou presença no show da irmã Miúcha, na terça. A cantora se apresenta no Sesc Pinheiros ao lado da Orquestra Sinfônica Municipal’.
A ministra continua com a palavra, mas, aparentemente, está preferindo fugir da questão e se refugiar em seu poder recém-conquistado. Deu uma canetada e se escondeu na concha. Portanto, por enquanto, continua valendo o que disse Sérgio Amadeu na entrevista acima: ‘Nós vamos ter uma ministra do Ecad e não uma ministra da Cultura’.
Aguardemos novas informações.
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Jornalista