Na tradição política brasileira, o acesso ao rádio e à televisão tanto dos candidatos a cargos eletivos quanto dos partidos é garantido por lei. Os candidatos, por meio dos partidos, têm direito à propaganda eleitoral em períodos imediatamente anteriores às eleições. Já os partidos têm como uma de suas funções permanentes a difusão dos programas partidários via rádio e televisão. Tanto num caso quanto no outro, as questões que historicamente têm sido levantadas sobre a matéria dizem respeito: 1. ao período de veiculação; 2. à distribuição do espaço de tempo entre os partidos e os candidatos; 3. às eventuais restrições ou censura ao conteúdo das mensagens veiculadas; e, sobretudo, 4. à gratuidade da veiculação.
Apenas como forma de relembrarmos, a regulamentação do acesso dos candidatos, através dos partidos políticos, ao rádio e à televisão brasileira, pode ser dividida em três grandes fases:
A primeira vai de 1950-1962 e caracteriza-se pelos sucessivos avanços na direção da democratização da disputa eleitoral. O Código Eleitoral do regime de 46, em vigor a partir de 1950, instituiu a propaganda eleitoral nos noventa dias anteriores às eleições, garantindo aos candidatos acesso ao rádio (a primeira emissora de televisão do País só viria a ser inaugurada em setembro daquele ano) o qual deveria ser pago mediante tabela de preços igual para todos.
A segunda fase iniciou-se com o Código Eleitoral de 1965 e se estendeu ao longo de todo o regime militar, refletindo o autoritarismo político e o artificialismo do sistema bipartidário. Enquanto se consolidava no País um sistema nacional de telecomunicações, aumentando a importância da mídia no processo político. O símbolo maior desse período será a Lei Falcão (1976), que estabelecia uma série de restrições às mensagens de propaganda eleitoral com o claro objetivo de impedir o avanço dos candidatos e dos partidos de oposição ao Regime. Em 1962, a propaganda eleitoral gratuita é incluída pela primeira vez na legislação e, até 1974, coexistem as possibilidades de acesso pago e gratuito. A partir de 1974, a propaganda eleitoral passa a ser exclusiva e obrigatoriamente gratuita, condição que, formalmente, permanece até os nossos dias.
Cenário construído na (e pela) mídia
Finalmente uma terceira fase iniciou-se com a chamada Nova República em 1985. Então a tendência à democratização do acesso dos candidatos é retomada. Os conflitos de interesses entre candidatos e partido de um lado, e concessionários de radiodifusão de outro fazem, todavia, com que a cada ano eleitoral novas e diferentes regras sejam adotadas, provocando uma permanente indefinição legal. Um das últimas regras marcantes de propaganda eleitoral está configurada na Lei 8.713, de 30 de setembro de 1993, que estabelecia normas específicas para as eleições de 03 de outubro de 1994.
Agora desde o dia 15 de março, o Brasil demonstrou novamente a sua vocação natural de estar sempre atrasado em relação ao campo político eleitoral. Por 4 votos a 3, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) decidiu que o Twitter não pode ser usado para propaganda eleitoral fora dos prazos estipulados, isto é, dia 5 de julho. Na prática, a partir de agora o uso de redes sociais antes da data prevista pela Justiça eleitoral é irregular e pode trazer penas aos postulantes.
Temos a seguinte situação a ser pensada nesse caso: na discussão do acesso de candidatos e partidos políticos à mídia, é necessário lembrar o fato, cada vez mais evidente, de que vivemos em sociedades centradas na mídia (media-centric), na era da vídeo-política, como defende Sartori, e que, portanto, a política não pode ser reduzida aos horários de propaganda eleitoral e partidária, da mesma forma que as eleições não podem ser reduzidas às campanhas eleitorais. Ao contrário. A política deve estar cada vez mais presente, difusa e permeada no conjunto da programação do rádio e da televisão, nos telejornais, nas novelas, nos filmes, nas séries, no mundo virtual (Twitter, Facebook, e-mail, bloggs…) e até mesmo nos eventos esportivos. Afinal, as eleições estão cada vez mais sendo decididas no contexto de um cenário de representação política, construído na e pela mídia e que vai muito além das campanhas eleitorais, tanto no que se refere à sua duração quanto ao seu conteúdo.
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[Davys Sleman de Negreiros é mestre em Ciências Sociais pela Universidade Federal de São Carlos, pesquisador do NEMP-UFSCar (Núcleo de Estudos sobre Mídia e Política) e docente do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Rondônia]