É mais do que normal a presidenta dar entrevista à Veja. Político, por acaso, vai recusar espaço midiático? Gostem ou não os que se consideram progressistas, a Veja tem uma tiragem grande, mesmo que inflacionada pelos contratos governamentais que seus executivos articulam, especialmente com estados capitaneados por tucanos.
Muitos que se consideram progressistas pensam que Veja, Folha de S.Paulo, Estado de S.Paulo e O Globo, enfim, o chamado “Partido da Imprensa Golpista (PIG)”, não existem mais, só por eles, progressistas, não serem mais audiência desses veículos. Na realidade, a morte da imprensa tradicional ainda não passa de wishful thinking. Ela pode não ter mais o peso de outrora, mas ainda não morreu.
Lá no meu trabalho mesmo, uma pequena amostra em microcosmo da burocracia miúda brasileira, que eu saiba, apenas duas pessoas leem o Conversa Afiada, de Paulo Henrique Amorim. Já a Veja, todo mundo cita quando quer parecer ser bem informado – muito embora uma boa parte não leia nada, ao que tudo indica. Caros Amigos, Fórum e mesmo CartaCapital, mais consolidada, só uns dois sabem do que se trata.
Nesse contexto, que deve se repetir na classe média Brasil afora, seria razoável que Dilma se recusasse a falar com a Veja? Nem Cazuza se recusou a figurar nas páginas amarelas da Veja, que produziu uma de suas capas mais agressivas, tendo esta se transformado em modelo jornalístico de linchamento público de uma personalidade: “Cazuza, vítima da Aids, agoniza em praça pública”.
Tom ameno
Já escaldada por este tipo de uso dos seus entrevistados promovido pela tradição de Veja, a assessoria de imprensa da presidenta Dilma muito provavelmente costurou milimetricamente os desdobramentos futuros da reportagem. Tanto que a capa da revista em que figura a conversa com a presidenta tem um tom bastante ameno.
De cabo a rabo, ganha todo mundo. A presidenta amplia seu palanque e a revista incrementa sua tiragem.
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[Lucas Costa é funcionário público, Recife, PE]