Quem estuda comunicação conhece a distinção entre mídias lean back (“inclina para trás”, como a TV) e lean forward (“inclina para frente”, como a internet). As primeiras, ligadas à contemplação. As segundas, à ação. Só que essa distinção está para cair por terra. O prenúncio é a chegada do Google Glass, que integra consumo de mídia com a vida, simultaneamente.
Cineastas “revolucionários” como Eisenstein ficavam incomodados com o fato de o cinema ser mostrado para pessoas em repouso. A ideia era que os filmes provocassem a ação política, mas como fazer isso com as pessoas sentadas na poltrona? Com o Google Glass (e outras tecnologias que virão), surge a primeira mídia que muda essa percepção. É possível consumir mídia e agir ao mesmo tempo. E mais: coordenar a ação com outras pessoas conectadas, em tempo real. Isso faz a alegria dos candidatos a Eisenstein dos nossos dias. E desperta preocupações (a mesma lógica dos simpáticos flash mobs foi também usada nos saques das lojas de Londres).
Os smartphones são um passo ainda imperfeito na integração de mídia e vida. Neles é preciso alternar “atenção” e “ação” o tempo todo. Daí o fenômeno dos “zumbis” de celular, que andam pelas ruas esbarrando nos outros (mais gente morre hoje nos EUA ao dirigir enviando textos no celular do que por beber e dirigir). Com o Google Glass, o vórtice da mídia quer envolver todos os recantos da vida (levando anúncios até lá). Claro, tudo isso se a tecnologia pegar. Pode ser que as pessoas ainda não estejam preparadas para trocar sua consciência fashion por um mergulho permanente na mídia.
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Ronaldo Lemos é colunista da Folha de S.Paulo