Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Folha de S. Paulo

ELEIÇÕES 2006
Editorial


Cinismo militante


“SUPERADAS as reações iniciais de surpresa e desencanto, que tomaram conta do
petismo ao eclodir a crise do mensalão, um espantoso e célere processo de
readaptação moral está em curso. Partem de setores expressivos da militância os
argumentos de que, na luta política, é inevitável conviver com a ‘sujeira’ -ou
coisa pior.


Um passo além, e já se registram manifestações de que a própria questão da
ética na política é secundária, face aos supostos benefícios que um governo,
mesmo corrupto, seria capaz de garantir à população mais pobre.


Como nos mais típicos casos de ginástica mental da época stalinista, há quem
considere agora puro ‘moralismo de classe média’ os princípios que, em outros
tempos, serviam de pretexto ao PT para arrogar-se um papel renovador na política
brasileira.


A leniência ética estendeu-se, assim, da esfera da prática para o campo da
teoria. A tal ponto chegou a desonestidade intelectual de alguns setores da
militância, que ouviram do próprio presidente Lula uma arrevesada e singular
advertência.


‘O PT foi construído para ser um símbolo de que era possível fazer política
diferente’, declarou em meio a uma aguada entrevista ao ‘Jornal da Band’, na
quinta-feira. ‘De repente, eu vejo que algumas pessoas do PT enveredaram pelo
mesmo círculo vicioso da política brasileira’.


Esqueceu-se de dizer, por certo, que tinha sido o primeiro a argumentar, numa
patética entrevista em Paris, que seu partido nada mais fizera a não ser o que
todos os demais faziam. Condutor da ‘virada pragmática’ que encaminhou governo e
partido ao pântano do valerioduto, quis refrear agora o ânimo dos que são mais
realistas do que o rei e mais caudilhistas que o caudilho.


Ao cinismo teórico dos que antes se diziam detentores da ética na política,
contrapõe-se a hipocrisia dos que, agora, indignam-se nos palanques ao verem
magnificada a herança que contribuíram para formar. A compra de votos para
aprovar a emenda da reeleição, no governo Fernando Henrique, constituiu um
ensaio, ainda tímido, do grande baile dos mensaleiros no Congresso.


O próprio instituto da reeleição teve como conseqüência a promiscuidade, que
agora se condena, entre atos administrativos e manobras de campanha. O recurso a
medidas eleitoreiras pelo governo Lula teve no populismo cambial do primeiro
governo FHC um precedente e um exemplo dos mais graves. E, se escândalos de
dimensão inédita varreram o governo atual, não se sabe o que teria acontecido
com o anterior se tivessem sido instauradas as CPIs que PSDB e PFL se empenharam
em barrar.


O espetáculo oscila do ridículo ao deprimente e parece dar alguma razão a
quem afirma que todos, afinal, se indiferenciam do ponto de vista ético. Mas que
de uma avaliação da realidade se deduza um princípio de conduta, e que do
‘rouba, mas faz’ se passe ao ‘rouba, mas é de esquerda’ -eis uma aberração que,
décadas depois de Lênin, Stálin, Trótski e Mao, reveste de tons de farsa a
tragédia, que se esperava extinta, da cegueira militante.”


Hudson Corrêa


Preso por negociar dossiê diz que dinheiro veio do PT


“O advogado Gedimar Pereira Passos -preso anteontem em São Paulo, onde
receberia um dossiê contra José Serra, candidato do PSDB ao governo do Estado-
disse à Polícia Federal que recebeu de um representante do PT o dinheiro para
comprar os documentos. Ele disse não saber o nome do petista, mas o descreveu à
PF.


Outra parte do dinheiro veio, segundo Passos, de uma revista cujo nome também
não revelou, e que pagaria pelo acesso ao dossiê para publicar uma reportagem
com exclusividade.


O dossiê -uma fita de vídeo, um DVD e seis fotos- foi elaborado pelo
empresário Luiz Antonio Trevisan Vedoin, apontado como chefe da máfia dos
sanguessugas. A função de Passos na operação, segundo disse ele à PF, seria a de
conferir a ‘autenticidade’ do material.


Por conta da negociação, Vedoin foi preso anteontem. A Justiça Federal o
acusou de ocultar provas e chantagear pessoas envolvidas com a máfia dos
sanguessugas.


O dossiê mostra Serra em 2001, então ministro da Saúde, participando da
entrega de 41 ambulâncias em Cuiabá (leia texto na pág. A6). Esses veículos,
pagos com verbas federais, foram vendidos a municípios pela máfia dos
sanguessugas, que costumava superfaturar as unidades (veja quadro).


Há ainda fotos, sem data, em que o candidato a presidente pelo PSDB, Geraldo
Alckmin, aparece cumprimentando uma pessoa identificada pela PF como Sinomar
Martins Camargo, representante da empresa Santa Maria, que pertencia aos
sanguessugas e fornecia ambulâncias. Assessores de Alckmin afirmaram que as
imagens são do 48º Congresso Estadual dos Municípios, em 2004.


Trevisan portava também, em uma pasta azul, uma lista com 12 prefeituras. Ao
lado de cada uma foram listados valores de R$ 64 mil a R$ 66 mil.


Com Passos foram apreendidos, segundo a PF, US$ 139 mil e R$ 410 mil em
dinheiro. O empresário Valdebran Padilha da Silva, filiado ao PT de Mato Grosso,
também foi preso. Ele, que seria o outro comprador do dossiê, estava com US$ 109
mil e mais R$ 758 mil. A polícia não autorizou a divulgação de imagens do
dinheiro.


Ontem a PF deteve pela segunda vez Paulo Roberto Trevisan, tio de Vedoin,
após a Justiça decretar sua prisão. Anteontem, a PF havia dito que ele era primo
de Vedoin. Trevisan, encarregado de levar o dossiê a São Paulo, foi detido pela
primeira vez quando embarcaria de Cuiabá para a capital paulista, na
quinta-feira à noite, e liberado depois. Ele seria recebido por Valdebran e
Passos no aeroporto de Congonhas, em São Paulo.


Inicialmente, segundo Passos, Vedoin teria pedido R$ 20 milhões pelo dossiê.
O preço foi então reduzido a R$ 2 milhões, de acordo com o depoimento.”




***


Ex-candidato a prefeito, dirigente do PT de Mato Grosso diz ser amigo de
um dos presos


“O secretário-geral do PT em Mato Grosso, Alexandre Cesar, afirmou ontem que
Valdebran Carlos Padilha da Silva, preso anteontem quando tentava comprar um
dossiê contra José Serra (PSDB), ajudou a arrecadar dinheiro a sua campanha
eleitoral à Prefeitura de Cuiabá em 2004. Valdebran está filiado ao PT desde
agosto de 2004.


Na Justiça Eleitoral, consta que a Saneng Saneamento e Construção, da família
de Valdebran, doou R$ 50 mil para a campanha de Alexandre Cesar. A reportagem
não localizou o advogado de Valdebran.


A Polícia Federal concluiu em fevereiro deste ano um inquérito sobre suposto
caixa dois do PT em Cuiabá na eleição de 2004, confirmando gastos com gráficas e
vídeos de ao menos R$ 3,5 milhões não-declarados à Justiça Eleitoral.


Cesar negou caixa dois e disse, na época, que a responsabilidade era do então
tesoureiro nacional do PT, Delúbio Soares, por ‘um erro contábil’.


Embora diga não saber nada sobre o dossiê, Cesar disse ter uma relação de
amizade com Valdebran, que também seria ligado ao deputado federal Carlos
Abicalil (PT).”




***


Em vídeo de dossiê, Serra elogia bancada de MT por emendas


“Um DVD de 23 minutos e 44 segundos é a peça principal do dossiê contra José
Serra (PSDB) que Luiz Antonio Vedoin, 31, chefe da máfia dos sanguessugas,
tentou vender ao petista Valdebran Padilha Silva. Com imagens editadas, o DVD
mostra Serra em um evento no mês de maio de 2001, em Cuiabá (MT), no qual foram
entregues a prefeituras de Mato Grosso 41 ambulâncias fornecidas por empresas
envolvidas na máfia dos sanguessugas.


Na época, Serra era ministro da Saúde. As ambulâncias haviam sido compradas
com dinheiro do ministério. Numa cena, Serra -acompanhado dos deputados Pedro
Henry (PP-MT) e Ricarte de Freitas (PTB-MS), acusados de pertencer à máfia dos
sanguessugas- entra num ônibus de atendimento que estava sendo entregue.


Dante de Oliveira, então governador, pergunta: ‘Foi empresa daqui [que
adaptou o ônibus]?’. Henry responde: ‘Sim, e todas as ambulâncias também’. Serra
diz ‘gostei’ sobre o ônibus. Atrás dele, o então prefeito de Cuiabá, Roberto
França, diz: ‘[O responsável] É o famoso Darci [Vedoin, pai de Luiz
Antônio]’.


Darci aparece pelo menos quatro vezes no início do DVD ao lado do filho Luiz
Antonio e orientando os motoristas na manobra das ambulâncias. Não há imagem
dele ao lado de Serra. Na solenidade subiram ao palco Serra, Henry, Ricarte e o
deputado Lino Rossi (PP-MT), apontado como campeão no recebimento de propina
pela máfia dos sanguessugas. Na época, os três eram do PSDB.


O DVD mostra uma pequena parte do discurso de Serra e uma entrevista para
repórteres. ‘É a primeira vez que vejo uma bancada de deputados fazer isso no
Brasil, porque são investimentos relativamente modestos e que têm produtividade
muito alta e atinge muitos municípios’, diz o ex-ministro.


Rossi, Henry e Ricarte são entrevistados: ‘Eu estou patrocinando R$ 6 milhões
de emendas para o Orçamento deste ano. Todos os deputados do PSDB estão no
Orçamento patrocinando emendas para isso’, diz Rossi. No final aparece a legenda
‘TV Vídeo Productions’.


Integram o dossiê ainda um vídeo que conteria as imagens da solenidade, sem
edição, e seis fotografias -quatro delas de Serra no mesmo evento e duas de
Geraldo Alckmin cumprimentando uma pessoa que, segundo a PF, é Sinomar Martins,
ligado a Vedoin. Segundo representantes da campanha de Alckmin, a imagem é do
então governador de São Paulo no 48º Congresso Estadual de Municípios, em
2004.”


Lilian Christofoletti


Berzoini nega que PT tenha pago por dossiê


“O presidente nacional do PT, Ricardo Berzoini, negou ontem que o partido
tenha repassado dinheiro para o advogado e ex-agente da Polícia Federal Gedimar
Pereira Passos, preso anteontem em São Paulo, acusado de tentar comprar um
dossiê contra o candidato do PSDB ao governo do Estado, José Serra. Berzoini
condenou o que chamou de ‘tentativa de chantagem’ contra tucanos.


O presidente do PT também divulgou nota sobre o assunto. ‘Diante da
consolidação da liderança de nossa candidatura presidencial e da frustração
daqueles que desejaram destruir o PT, não nos surpreende que ocorram episódios
dessa natureza, com o objetivo de conturbar a disputa eleitoral, que está sendo
conduzida de nossa parte para o debate exclusivamente programático’,
afirmou.


Com relação ao petista Valdebran Padilha da Silva, também preso anteontem
pela PF, o presidente do PT disse que encaminhará ao Diretório Nacional um
pedido de suspensão do filiado e de abertura de um procedimento disciplinar.


A nota tem apenas quatro parágrafos. Três são reservados para comentar a
edição da revista ‘IstoÉ’ desta semana, que divulgou reportagem sobre o suposto
envolvimento de Serra com a máfia dos sanguessugas.


‘O PT considera graves as novas acusações relativas ao escândalo dos
sanguessugas publicadas pela ‘IstoÉ’ e que envolvem o governo anterior. Ao
contrário dos nossos adversários, não prejulgaremos, mas exigimos a rigorosa e
isenta investigação das denúncias, para apurar todas as responsabilidades’,
disse Berzoini.


O petista afirmou ainda que o PT ‘sempre rejeitou o denuncismo eleitoral e a
produção ilegal de dossiês, até mesmo por já termos sido vítimas desse tipo de
procedimento’.


A Folha não conseguiu ouvir o presidente do PT de São Paulo, Paulo Frateschi.
A assessoria disse que ele foi informado sobre o teor da reportagem, mas que
estava em reunião.”




***


Compra de dossiê é ‘abominável’, diz Lula


“O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou considerar ‘abominável’ que
pessoas ligadas ao PT tenham sido presas tentando comprar um dossiê que ligaria
o candidato do PSDB ao governo de São Paulo, José Serra, ao esquema dos
sanguessugas. Lula, ao deixar Aracaju ontem de manhã, saiu também em defesa de
Serra, ao dizer que ele tem ‘experiência política e história política’ para
explicar as acusações.


‘Eu acho que um dossiê contra o Serra é um dossiê igual a tantos outros
dossiês que circulam por esse país. Eu acho abominável as pessoas tentarem
comprar notícias.’


Anteontem, a Polícia Federal apreendeu US$ 248,8 mil e R$ 1,168 milhão (cerca
de R$ 1,7 milhão ao todo), em um hotel de São Paulo, em poder do petista
Valdebran Carlos Padilha da Silva, empreiteiro mato-grossense, e de Gedimar
Pereira Passos, advogado e ex-agente da PF. Eles estavam intermediando a compra
de vídeos, fotos e documentos que mostrariam suposto envolvimento de Serra e de
Geraldo Alckmin (PSDB) com o esquema.


Segundo Lula, a prática de distribuir dossiês em véspera de eleição é ‘uma
coisa absurda’. ‘Nessa época do ano, as denúncias aparecem como se fossem
vendavais’, disse.


Serra, segundo o presidente, não pode ser considerado culpado por
antecipação. ‘O Serra tem experiência política, história política para explicar
o que aconteceu. […] Se amanhã o Serra não tiver culpa no cartório, quem é que
vai dizer: olha, erramos. Se sair erramos, vai sair numa letrinha bem
pequenininha, que ninguém nem vai conseguir saber’, declarou.


Ao ser questionado sobre a acusação feita pelo empresário Luiz Vedoin, de que
Serra teria conhecimento do esquema das ambulâncias, Lula respondeu: ‘Não faço
julgamento. Há muito sensacionalismo’.


Para o presidente, no Brasil as pessoas ‘têm uma facilidade imensa de
condenar e tem uma timidez muito grande de perdoar’. Lula afirmou que não
participará de nenhuma tentativa de desqualificação de adversários. ‘A história
do Brasil tem exemplos de pessoas que foram acusadas de matar pessoas, perderam
a eleição e depois ficou por isso mesmo. Então, quem quiser fazer bandidagem,
por favor, não queira o Lula como parceiro, porque não aceito esse tipo de
coisa.’


Lula disse que não conhece as pessoas que foram presas e, sem maiores
explicações, deu um recado a quem tentou comprar o dossiê. ‘Se alguém fez isso,
vai pagar o preço.’


Bolívia


O presidente previu que haverá maior tranquilidade no relacionamento com a
Bolívia após o pedido de demissão do ministro dos Hidrocarbonetos daquele país,
Andrés Soliz Rada, considerado um radical. ‘Eu acho que agora as coisas entraram
em maior tranqüilidade, na medida em que um ministro pede demissão.’ Rada é
considerado o idealizador da nacionalização das refinarias da Petrobras no
país.


‘O melhor caminho para a Bolívia é atrair capital estrangeiro. Mas para que
um investidor coloque dinheiro é preciso que haja, primeiro, tranqüilidade
política e que haja seriedade jurídica.’”




COTAS EM DEBATE
Ferreira
Gullar


Somos todos irmãos


“PARTICIPO DA preocupação de que se provoque o surgimento do ódio racial no
Brasil. Esse ódio, felizmente, não existe, muito embora ainda não estejamos
livres do preconceito racial, que existe e deve ser rechaçado, onde e quando se
manifeste, conforme, aliás, prevê a legislação brasileira.


Abordo esse problema em razão do livro ‘Não Somos Racistas’, que Ali Kamel
acaba de publicar, onde o examina com seriedade e lucidez. O assunto,
evidentemente delicado e polêmico, exige ser tratado com isenção, o que o autor,
no meu entender, consegue.


Lendo-o, deduzi que ninguém, no Brasil, está pregando abertamente o conflito
racial. Não obstante, a defesa de certas teses sociológicas, surgidas na década
de 1950 e que visavam desfazer o ‘mito da democracia racial brasileira’,
lançaram as sementes desse possível conflito.


Os defensores daquelas teses afirmavam que a referida ‘democracia racial’
fora inventada para encobrir o racismo, que seria a verdadeira causa da
desigualdade social entre negros e brancos. Tal desigualdade não podia ser
explicada, afirmam eles, apenas pela pobreza dos negros e pardos, pois tinham um
fundo racial. Esse racismo, segundo eles, por ser disfarçado, seria pior que o
dos brancos norte-americanos.


Já ouvi afirmações semelhantes e, em resposta, lembrei que a luta dos negros
norte-americanos, durante os anos 60 e 70, que obteve importantes vitórias
contra o racismo, na verdade, o que conseguiu foi eliminar discriminações que os
negros brasileiros desconheciam, como não poder freqüentar os mesmos
restaurantes que os brancos, não poder usar os mesmos banheiros nem estudar nos
mesmos colégios. Quantos dos meus colegas de escola eram negros e mulatos! Se o
racismo explícito e arrogante é melhor que o disfarçado, então de nada valeram
as vitórias dos companheiros de Martin Luther King. Teria sido melhor, então,
manter as discriminações de antes? Quem advogava teses como essas deveria
entender que, se o racismo que está dentro de alguém não se manifesta em
discriminações e ofensas, só serve para envenenar quem o traz consigo.


E sabem por que o racismo disfarçado, segundo eles, é pior? Porque impede o
negro de lutar por seus direitos. Mas, se o que importa são os direitos e os
negros brasileiros já gozavam de mais direitos que os seus irmãos
norte-americanos, custa aceitar que o racismo daqui fosse pior que o de lá.


Torna-se então evidente que o objetivo daquelas teses era provocar o conflito
entre negros e brancos, sob a alegação de que é o preconceito racial que impede
a ascensão social dos negros, e não a pobreza. Logo, o inimigo do negro é o
branco.


Conforme demonstra Ali Kamel, essas teses fizeram a cabeça de muita gente,
contribuindo para que o nosso ideal de nação miscigenada e tolerante vá sendo
substituído por uma suposta nação bicolor, na qual os brancos oprimem os negros.
Procura-se de todas as maneiras impor essa visão ao país, muito embora os dados
objetivos demonstrem o contrário.


Para comprovar que os brancos brasileiros oprimem os negros, usa-se o exemplo
de que negros e pardos ganham a metade do salário dos brancos, ainda que tenham
o mesmo nível educacional. Ali Kamel argumenta, porém, que ter o mesmo diploma
não significa ter o mesmo nível de conhecimento nem o mesmo preparo; se os
brancos estudaram em colégios bons e os negros em colégios péssimos -e é o que
acontece- aqueles estarão mais aptos a exercer determinadas funções.


A causa da desigualdade salarial não se deve, portanto, ao racismo, mas à
diferença na formação educacional. Segundo as mesmas estatísticas, os amarelos
ganham o dobro dos brancos (7,4 salários mínimos contra 3,8), e a razão disso é
que eles estudam em média 10,7 anos, enquanto os brancos estudam apenas 8,4
anos. Deve-se deduzir daí que os amarelos oprimem os brancos no Brasil? A
conclusão certa é que ganha mais quem estuda mais. Eis por que a solução para o
problema da desigualdade social é precisamente a educação, isto é, oferecer aos
brasileiros pobres, sejam negros, mulatos ou brancos, ensino de qualidade.


O conceito de nação mestiça é um entrave a quem deseja o conflito racial. Por
isso, embora os negros sejam apenas 5,6% da população brasileira, diz-se que os
pardos, que somam 42%, também são negros e, assim, tenta-se ocultar o elevado
grau de mestiçagem que nos caracteriza como povo. É uma pena.


O livro de Ali Kamel deve ser lido e refletido com a mesma isenção com que
foi escrito.”




TELEVISÃO
Daniel Castro


Em alta, Angélica agora tem cachê de estrela


“Há cinco anos, a apresentadora Angélica vivia um processo inicial de crise
de imagem. Uma turnê musical foi cancelada às vésperas da estréia, por absoluta
falta de público. Seu programa infantil raspava nos dois pontos no Ibope, algo
inaceitável para a Globo _que por pouco não a dispensou.


A loira, porém, acordou a tempo. Contratou uma assessoria de imagem (de Edson
Giusti), que, em sondagens de mercado, percebeu que sua carreira de
apresentadora infantil tinha se esgotado. Era hora de apostar em outro público.
Angélica, então, desistiu de ser cantora e virou apresentadora do ‘Vídeo Game’,
para jovens, e, neste ano, do ‘Estrelas’, para mulheres adultas.


As mudanças começam agora a dar efeito em sua conta-corrente. No mês passado,
Angélica fechou seu maior contrato publicitário. Virou ‘porta-voz’ no Brasil da
L’Oreal, o que a obrigou a tingir seus cabelos em um tom de loiro dourado. Por
seis meses, receberá R$ 450 mil, um cachê de mega-estrela _Ana Paula Arósio, por
exemplo, ganhava R$ 1 milhão por ano da Embratel.


Seu ‘Estrelas’ passou a ter ações de merchandising, um indicador de sucesso
comercial. Sua assessoria detectou que o mercado publicitário a vê agora como
uma mulher segura e amadurecida. A popularidade está em alta. Foi capa de
revista (sem contar as de celebridades) em seis dos últimos 12 meses.


REDES UNIDAS 1Respectivamente presidentes da Band e da Rede TV!, João Carlos
Saad e Amilcare Dallevo Jr. vão se casar no mesmo dia, o próximo 23. Saad já é
casado no civil. Terá agora sua união com Claudia Saad abençoada por um pastor
evangélico. Sua mulher freqüenta a mesma igreja de Íris Abravanel, a Vida Nova.


REDES UNIDAS 2Dallevo e Saad são hoje parceiros nas disputas do setor de
radiodifusão. Suas emissoras compõem a Abra (Associação Brasileira de
Radiodifusores).


TARJA PRETAO autor de ‘Páginas da Vida’, Manoel Carlos, adverte: apesar de
sua novela estar repleta de fumantes e de declarar que sua intenção é a de
criticar o tabaco, ninguém na trama terá câncer por causa do vício.


SIMPLES DEMAIS 1A modelo Caroline Bittencourt já não é mais nome quase certo
no elenco da versão brasileira de ‘The Simple Life’, o ‘reality show’ de Paris
Hilton.


SIMPLES DEMAIS 2Ela ficou ‘desvalorizada’ na Record depois que declarou a uma
revista que leva uma vida simples e que adora fazer compras em supermercado. O
perfil das participantes tem de ser exatamente o oposto _o de mulheres que só
conhecem as gôndolas em Veneza.


POEIRA POPO quadro ‘Poeira das Estrelas’, apresentado pelo físico Marcelo
Gleiser no ‘Fantástico’, entrou para o ranking dos programas que mais recebem
elogios dos telespectadores que ligam para a central de atendimento da
Globo.”


Laura Mattos


‘Espectador tira TV do fundo do poço’


“A programação da TV saiu do fundo do poço em que se encontrava nos anos 90
graças à pressão do telespectador. Essa é a tese do livro ‘TV sob Controle – A
Resposta da Sociedade ao Poder da Televisão’ (Summus Editorial, 184 págs., R$
33,90), que o sociólogo e professor de comunicação da USP Laurindo Lalo Leal
Filho lança nesta semana. Fundador da ONG TVer, voltada ao debate da qualidade
da televisão, Lalo é também autor do polêmico artigo ‘De Bonner para Homer’. No
texto, publicado em 2005 pela revista ‘Carta Capital’, ele relata ter
descoberto, numa visita de professores ao jornalismo da Globo, que William
Bonner, editor-chefe e apresentador do ‘Jornal Nacional’, referia-se ao
telespectador como o obtuso personagem Homer Simpson. À época, Bonner disse que
a definição servia para ‘destacar a necessidade de clareza nos textos escritos
para um público heterogêneo’. Leia trechos da entrevista que Lalo concedeu à
Folha.


FOLHA – O título do livro é ‘TV Sob Controle’. Controle não é censura?


LAURINDO LALO LEAL FILHO – Estou falando de controle democrático, não de
censura. Não tenho medo da palavra ‘controle’. A televisão é controlada em todas
as democracias. É um controle exercido pela sociedade.


FOLHA – O sr. afirma que na década de 90 a televisão chegou ao fundo do poço.
Está se referindo a quê?


LALO – A esses programas que claramente violentavam a dignidade humana,
expunham pessoas a situações vexatórias. São os telejornais ‘mundo cão’, que
vieram do ‘Aqui Agora’, e programas de auditório, inclusive os de Faustão e
Gugu.


FOLHA – Por que isso ocorreu em meados da década de 90?


LALO – Porque se acirrou a concorrência. Há um problema estrutural na TV
brasileira: 80% do mercado publicitário se concentra na Globo. Os 20% restantes
têm de ser conquistados pelas outras, que acabam rebaixando a programação, além
de recorrerem a outras formas de financiamento, como Telesena, no SBT, e igrejas
evangélicas, na Record, Band etc. Essa era de fundo do poço gerou uma reação da
sociedade.


FOLHA – O que mudou na programação graças à reação do público?


LALO – O fato de Ratinho e cia. não terem mais espaço é um avanço, assim como
a diminuição de programas policiais. Alguns foram tirados do ar, outros tiveram
a duração encurtada ou mudaram a linha editorial. São exemplos da pressão do
público e da conscientização de anunciantes. A mudança de horário do ‘Pânico’,
que passou para mais tarde, é reflexo prático do esforço do Ministério da
Justiça de estabelecer novas normas de classificação de faixas etárias. ‘Cobras
& Lagartos’ teve de se ajustar ou poderia ser classificada para exibição
mais tarde. Outro avanço é a ação do Ministério Público, que conseguiu que João
Kléber fosse tirado do ar e a Rede TV!, obrigada a exibir programas de direitos
humanos. Outra ação importante foi no caso da falsa entrevista do PCC no Gugu,
que foi tirado do ar. Pode parecer pouco, mas é muito num país em que a TV não é
regulamentada.


FOLHA – O livro fala que o preconceito das universidades com a TV freou o
debate. Isso acabou?


LALO – Demorou muito para a universidade perceber o papel social da
televisão, mas esse preconceito diminuiu porque o poder da TV se tornou
incontestável. Em grande parte, as escolas de comunicação colaboraram com
pesquisas e desenvolveram um pensamento crítico em relação à TV. Aos poucos, as
ciências sociais passaram a estudar o tema.


FOLHA – Por que a intelectualidade não queria falar sobre televisão?


LALO – Há a herança, desde a ditadura, da idéia de que grandes transformações
sociais e políticas levariam à transformação da TV. A televisão era vista como
algo menor em relação às grandes lutas sociais. O pioneiro na quebra desse
pensamento é [o sociólogo] Sérgio Miceli, com ‘A Noite da Madrinha’ [ensaio de
1972 sobre a fama de Hebe Camargo e o poder da TV]. Se a universidade não
discutir TV, quem discutirá?


FOLHA – Ficou famoso o texto em que o sr. relata que William Bonner, nos
bastidores, refere-se ao telespectador como Homer Simpson. Ele não acabou
crucificado por algo que pode ser generalizado na Globo?


LALO – Durante a visita que fizemos à Globo, das 10h às 14h, quem falou em
Homer foi Bonner. Ele disse que o apelido foi dado na Redação, mas não ouvi mais
ninguém falando assim. Do ponto de vista emblemático, isso pode ter marcado meu
texto, mas o que quis ressaltar foi a forma como são selecionadas as notícias no
‘JN’. Participei de reuniões de pauta de outros telejornais e nunca havia visto
uma maneira tão simplista e simplória de aceitar ou descartar uma reportagem. A
decisão parte ou de idiossincrasias do editor-chefe [Bonner] ou da linha
editorial da empresa, que está clara a quem decide, mas não explícita para o
espectador.


FOLHA – A TV Cultura hoje pode ser considerada uma emissora pública?


LALO – Não, ela hoje é uma televisão comercial. A partir do momento que entra
na disputa do mercado publicitário, há interferências na programação, na
linguagem, que passa a ter referência não mais no cidadão, mas sim no
consumidor.


FOLHA – O sr. diz que as emissoras comerciais deveriam financiar a TV Cultura
e outras TVs públicas. Não é contraditório com sua afirmação de que a maioria
das TVs privadas não está conseguindo se sustentar?


LALO – Vamos falar primeiro da Cultura. O dinheiro das TVs comerciais seria
uma das formas de financiá-la. As outras seriam o dinheiro dos governos e o
patrocínio cultural, não qualquer comercial, como vem ocorrendo hoje. Com essa
‘cesta’ de financiamento, as redes públicas não estariam submetidas ao poder
estatal ou da publicidade. Mas é claro que falo de um modelo ideal. É preciso
haver uma reformulação completa, a Globo não pode receber 80% da verba
publicitária quando tem 50% da audiência. Outra distorção: as empresas estatais
praticamente financiam as emissoras comerciais com sua verba de publicidade. É
preciso uma nova lei geral de comunicação para corrigir isso.


FOLHA – O sr., quando Lula assumiu a Presidência, disse ter esperança de que
ele iria reformular a legislação da comunicação. Isso não ocorreu.


LALO – Isso é um problema sério. No Brasil, temos uma TV de conteúdo sofrível
do ponto de vista da diversidade, da sofisticação da linguagem, mas de alta
qualidade técnica, que pode se colocar no nível das melhores do mundo. Isso é
imposto a uma população que não tem outra forma de entretenimento e informação.
É um poder de pautar vidas, hábitos e a política, e impõe medo a todos os
governos. Esperava que Lula, respaldado pela votação estrondosa, modernizasse a
legislação.”


Thiago Ney


TV e games ganham nova musa


“Ser interrompido por conversas no meio de um jogo ou assistir a outras
pessoas brincando de videogame são duas das coisas mais irritantes que existem.
Mas é com esses ingredientes que o programa ‘Combo Fala + Joga’ ganhou aura cult
na TV e tornou estrela a jovem Luiza Gottschalk.


Exibida de segunda a sexta às 22h no canal UHF PlayTV -ligado à Gamecorp,
produtora que tem Fábio Luís, filho do presidente Lula, como sócio-, a atração é
ancorada alternadamente por Luiza e por Luciano Amaral (o Lucas Silva e Silva de
‘No Mundo da Lua’, da TV Cultura) e é, basicamente, um ‘talk-show’ em que
apresentadores e convidados conversam enquanto jogam videogame.


Assim, é comum ouvir, no meio das entrevistas com gente como o produtor
Carlos Eduardo Miranda, Juca Kfouri, e integrantes das bandas CPM 22 e NXZero,
coisas como: ‘Não existe fórmula. Para cada artista… olha o couro que eu estou
tomando…’, ‘Pô, morri’.


O espectador assiste aos games por meio de um telão colocado atrás dos
‘jogadores’.


Em meio a experientes convidados e diálogos cortados por ‘drogas’, ‘carambas’
e ‘vamos começar de novo’, Luiza brilha. Aos 22 anos, loira, 1,73 m -e sem
namorado-, ela conquistou o jovem público da emissora porque conhece o assunto:
é fera em games, universo reconhecidamente masculino.


‘Há muito mais homens do que mulheres jogando, mas não existe preconceito’,
diz ela, que afirma que os meninos costumam ser melhores do que as meninas. ‘Mas
porque eles praticam mais’, explica, com autoridade -já ganhou campeonato de
Fifa Soccer [jogo de futebol].


O ‘Combo Fala + Joga’ foi o primeiro trabalho de Luiza na TV (hoje ela
apresenta também a parada de clipes ‘Vale 10’). Sua formação é de atriz
-estrelou a primeira peça (‘Rolos, Paqueras e Muita Diversão’) aos nove anos e é
formada no Teatro Escola Célia Helena.


Nascida em São Paulo, Luiza passou a infância numa colônia na Serra da
Mantiqueira (MG), onde os pais (um descendente de alemão e uma índia) tocavam
uma criação de salmão. Seu irmão, Peter Gottschalk, é piloto da Fórmula Super
Clio.


A esgrima é um hobby, gosta de mitologia grega, estuda canto e música (‘adoro
Moacir Santos, é uma referência musical’) e, ainda, é atacante do time de
society do Pinheiros.


No programa, conversa com qualquer entrevistado com desenvoltura. ‘O ‘Combo’
é um bate-papo, mas às vezes a gente dá mais ênfase no jogo do que na conversa’,
diz.


A PlayTV tem contrato de direito autoral e de imagem com Luiza até abril de
2008. ‘Ela vem sendo preparada desde 2003. Sabíamos que haveria um retorno’, diz
o diretor de programação, André Vaisman.”




***


Edição da feira de games egs está ameaçada


“Em novembro de 2005, Luiza Gottschalk não conseguiu circular pela feira
Electronic Game Show, no Expo Center Norte (SP), devido ao tumulto provocado
pelo assédio de fãs. Neste ano, o evento, maior do gênero da América do Sul
(público de 25 mil pessoas), está ameaçado de não acontecer.


Ivan Cordon, que organiza a EGS Brasil, diz que a data está definida: entre
17 e 19/11, no mesmo local. ‘Dependemos do apoio de um grande patrocinador. Ou
adiaremos para abril.’


Ainda em novembro, no dia 19 ocorre o ‘Video Games Live’, apresentação do
compositor de trilhas de games Tommy Tallarico.”


Ivan Finotti


Foi bom ganhar da Luiza


“Dizem que essa moça, a bela Luiza Gottschalk, é mais do que simplesmente a
musa dos games. Dizem que ela é fera no joystick, que ganhou campeonatos e tudo.
Eu não sabia de nada disso no mês passado, quando fui convidado para dar uma
entrevista no programa ‘Combo Fala + Joga’. Por isso, cheguei sem medo de
enfrentar a musa.


Fiz bem, porque ganhei fácil. Aliás, ganhamos, já que fui junto com a
jornalista Juliana Calderari falar do livro que acabamos de lançar, ‘O Destino
de Harry Potter’ (Conrad).


Luiza bem que tentou aplicar um ‘golpe’: ‘Não se preocupem com o jogo. Também
não podem deixar de jogar, mas o principal é a entrevista.’ Sei…


Não levei a sério essas palavras e, enquanto falava sobre o sétimo e último
livro da série de J.K. Rowling, venci Luiza no jogo de esqui na neve e também na
luta de espadas. A Juliana detonou num game de golpes marciais.


Foi legal encontrar por lá o Luciano Amaral, que alterna a apresentação do
programa com a musa. Ele fazia o menino Lucas Silva e Silva em ‘No Mundo da
Lua’, seriado da TV Cultura dos anos 90. Ao encontrá-lo, lancei um ‘Sou seu fã
desde aquele época!’.


Saímos vitoriosos, mas acho que a Luiza deixou. Estava fazendo média com os
convidados… É por isso que virei fã dela também. Desde criancinha.”


Bia Abramo


Entre aprendizes e infelizes…


“‘É SÓ televisão’, a gente tenta se convencer, mas persiste um certo
mal-estar. Em um momento, estamos num mundo de néon, eficiência, dentes brancos,
salários em dólar; noutro, voltamos para um mundo da precariedade cotidiana e de
seus personagens patéticos. O mundo número um é visto pela janela do arranha-céu
e mostra o balé das luzes dos carros à noite, que transforma a cidade em um
sistema circulatório de brilhos; é o mundo de ‘O Aprendiz’. O mundo número dois
está na glosa humorística do ‘Show do Tom’ e chama-se ‘O Infeliz’.


Exibir um esquete paródico logo depois de um programa de grande audiência é
um truque inaugurado pelo ‘Casseta & Planeta’. É uma boa idéia a TV mangar
da TV.


Mas quando o ‘Casseta’ entra com a gozação da novela, há uma continuidade: o
mesmo espectador que se emociona com as desventuras do drama pode também se
distanciar e rir dos exageros.


Entre ‘O Aprendiz’, de Roberto Justus, e ‘O Infeliz’, de Tom Cavalcanti, há
um abismo intransponível.


É verdade que há elementos comuns, mas é como se os programas estivessem
sendo produzidos não simplesmente para fatias diferentes de público, mas para
audiências formadas por espécies diferentes.


Enquanto o primeiro é endereçado a uma classe média com parte das habilidades
profissionais, um tanto de gana e muita falta de escrúpulos para almejar o topo
do ‘grand monde’ empresarial, o segundo é dirigido às pessoas a quem tudo
(educação, saúde, cultura, segurança, auto-estima) foi sistematicamente negado
para que os primeiros pudessem estar onde estão.


Nos traços exagerados da caricatura, presente tanto no programa humorístico
quanto no ‘reality show’, as diferenças tornam-se mais agudas e apontam para uma
ruptura na substância mesma de que são feitos uns e outros. Assim, tornam-se
espécies distintas, incapazes de conviver uma com a outra.


Os indivíduos da espécie ‘Aprendiz’, com sua ambição deslavada e
subserviência às regras do jogo, escarnecem da espécie ‘Infeliz’ a cada impulso
vencedor, como se dissessem: ‘A cada passo adiante, eu me afasto desse destino
infeliz de ser pobre’. Por sua vez, por trás da paródia ‘Infeliz’, está uma
incompreensão profunda, essencial dos modos, medos e mitos que movem esses seres
do ‘Aprendiz’. Daí que as piadas não funcionam, nem de lá nem de cá: o humor
pressupõe um terreno comum que não mais existe.”




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