Wednesday, 25 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

‘Hoje, as pessoas moram no Google’

Matéria-prima para A rede social (‘The social network’), o filme mais popular do momento nos Estados Unidos, com uma bilheteria de US$ 50,8 milhões, o livro Bilionários por acaso – A criação do Facebook, de Ben Mezrich, chega às livrarias brasileiras no dia 22 [de outubro], via editora Intrínseca, propondo uma investigação sobre a juventude alfabetizada (e conectada) pela internet. Autor de Bringing down the house, romance-reportagem que inspirou o longa-metragem de sucesso Quebrando a banca, com Kevin Spacey, em 2008, Mezrich reuniu em sua nova publicação cada passo dado pelo americano Mark Zuckerberg e pelo brasileiro Eduardo Saverin, estudantes de Harvard, para desenvolver um site de relacionamento. Da noite para o dia, o site que Zuckerberg montou, financiado por Saverin, rendeu bilhões, mas gerou um racha entre eles que acabou nos tribunais. Segundo Mezrich, as divergências e decepções entre eles serviram de mote para traições dignas de uma tragédia shakespeariana.

Daí o interesse do diretor David Fincher, de O curioso caso de Benjamin Button, em verter o livro às telas. Dirigida por Fincher, a adaptação das pesquisas de Mezrich só estreia no Brasil no dia 3 de dezembro. Mas, nesta entrevista, o escritor antecipa alguns detalhes do longa ao Globo e perfila a geração de cordão umbilical digital.

***

Bilionários por acaso parte da criação do Facebook para construir um perfil da geração que cresceu conectada na web. Que cara essa geração tem?

Ben Mezrich – Quando cursei a universidade, se um garoto quisesse sair com uma menina ele precisava engolir sua timidez e mandar uma cantada esperta. Agora, ficou mais fácil. Você abre uma conta no Facebook e estabelece uma relação, que pode até se limitar ao plano virtual. Na minha juventude, a geografia era física. Falávamos de casas, de quintais. Hoje, as pessoas moram no Google. A geração de hoje é menos solitária quando está no computador, tuitando, mas isolada quando fica fora dele.

Você defende a tese de que o Facebook vai superar o Google e demais sites…

B. M. – O Facebook propiciou uma integração generalizada, como nenhum outro site conseguiu. Ele tem uma agilidade e uma funcionalidade com índices de resultado superiores aos demais. A eficiência pesou na adesão. E a maneira como essa adesão pode interferir no curso da História é o que me interessou na feitura do livro, para além das frustrações de seus criadores. Percebi que o Facebook poderia gerar um comportamento similar ao que a televisão gerou no passado: unindo todo mundo em torno da mesma mídia ao mesmo tempo.

Mas para entender esse ensaio de mudança histórica a rixa entre Mark Zuckerberg, que criou o Facebook, e o brasileiro Eduardo Saverin, que financiou, parece essencial. De que modo essa rixa retrata a instabilidade das relações dessa geração?

B. M. – Comecei a escrever o livro ao receber um e-mail de um sujeito de Harvard que dizia: ‘Sou o melhor amigo do cara que criou o Facebook.’ Ali, notei que havia uma nova aristocracia, formada por jovens brilhantes, mas capazes de se esfaquear para alcançar uma afirmação individual. Quando pesquisei os processos, percebi a ironia que era construir um império bilionário às custas de uma amizade.

Como a quebra da amizade entre Zuckerberg e Saverin foi transposta para as telas?

B. M. – A principal diferença entre o filme e o livro está na pesquisa que o diretor fez do processo contra Zuckerberg. Ele se ateve mais a documentos do que eu. Mas, de modo geral, há uma fidelidade surpreendente para um cineasta tão autoral como Fincher, o que mostra seu respeito ao livro e à história do Facebook. E ele passa por um aspecto com o qual concordo: Zuckerberg e Saverin não devem voltar às pazes, pois Eduardo se sentiu traído por não receber o crédito.

O filme vem sendo associado ao Oscar, em especial pela atuação de Jesse Eisenberg como Zuckerberg. A escalação dele te agradou?

B. M. – Muito. Toda a escalação, aliás.

O sucesso do livro se deu enquanto teóricos de Comunicação investigavam a simbologia política que o Facebook carrega. O que há de político num site que conecta bilhões?

B. M. – O Facebook oferece a milhões de pessoas a possibilidade de se expressar de modo democrático, sem censura. Mas ele já começa a criar uma forma de exclusão em relação a quem que não é usuário. Se é libertador como veículo de expressão, é um meio de extremo isolamento.

Você preferiu dar esta entrevista por telefone a recorrer a email ou Twitter…

B. M. – Fico muito on-line, mas não como os jovens que cresceram tendo o computador como o principal veio de comunicação.