Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Internet vai reconstruir instituições falidas

A recente crise econômica mundial serviu não só para evidenciar fragilidades financeiras de diversas nações como para mostrar que boa parte das instituições tidas como sólidas até agora tem problemas igualmente sérios. Tudo o que se aprende na escola, da dinâmica das relações humanas ao compartilhamento de informações – vitais para negócios no mundo todo –, já é insuficiente para as necessidades atuais da sociedade digital.

Para o canadense Don Tapscott, 64, especialista em estratégia corporativa e autor de livros como Macrowikinomics – Reiniciando os Negócios e o Mundo, os serviços e as instituições só podem se reinventar com ajuda da colaboração via internet.

A tese é que as melhores soluções para problemas típicos da sociedade moderna, em transporte, saúde, educação e desenvolvimento social, virão da troca de ideias entre internautas do mundo todo, por meio de redes sociais, blogs e fóruns numa espécie de inteligência conectada. “Assim como a revolução industrial trouxe transformações, a internet é o novo meio que nos permite reconstruir a civilização”, diz.

Convidado para palestras no Brasil no mês que vem, Tapscott fala à Folha também sobre as formas como os governos podem promover políticas para incentivar a economia digital.

Crise econômica

“A crise mostrou que diversos fatores não estavam funcionando bem e serviu como um alerta: precisamos reconstruir as organizações que nos serviram por décadas. Muitas delas estão sem fôlego – desde os modelos de serviços, como sistemas de transporte e energia, até a educação.

“O mundo tem nada menos que uma escolha histórica: reinventar essas estruturas ou estará sob risco de sofrer paralisia institucional.”

Revolução digital

“Uma nova civilização está se formando. A sociedade tem à sua disposição a internet, plataforma mais poderosa da história para reunir as habilidades das pessoas. Essa articulação em torno da rede permite às populações colaborar como nunca para reinventar instituições sob os princípios para o século 21 – colaboração, abertura, compartilhamento, independência e integridade.”

Inteligência conectada

“O agrupamento de inteligência traz um um estado de alerta. As redes permitem o aprendizado colaborativo, um novo tipo de consciência coletiva que pode ser aplicada entre as organizações para inovar, criar prosperidade e impulsionar a sociedade.

“Não vivemos a ‘era da informação’. Vivemos a era da ‘inteligência conectada’.”

Colômbia

“O projeto Cidades Abertas, do qual participo na Colômbia, ilustra como é possível engajar a população para a criação de uma cidade inteligente e conectada, própria do século 21. Nossa primeira iniciativa utilizará técnicas digitais, desafios e debates eletrônicos para envolver os cidadãos e captar ideias para melhorias em governo, educação e desenvolvimento econômico.”

Impacto coletivo

“As pessoas podem se beneficiar da inteligência conectada nos setores privados e públicos. Se os governos desenvolvem políticas mais sofisticadas por meio da inteligência conectada, os benefícios serão compartilhados com os cidadãos. Se uma companhia usa inovação aberta para criar um produto superior, então esse produto será trazido ao mercado e o consumidor será beneficiado. Os impactos estão por todas as partes.

“Devemos ver um efeito no PIB dessa inteligência interconectada, mas não acho que consigamos medir o efeito em números.”

Geografia da inovação

“A inovação é mais propensa a vir de geografias com culturas mais abertas. Um país como a China tem grande capacidade de executar tarefas estruturadas e rotineiras, como instalar chips numa placa de circuito impresso. Mas, quando são demandadas criatividade e ideias inovadoras, a cultura militarizada, do comando e controle, é um grande impedimento.”

Mercados emergentes

“A Índia é um país interessante em inovação, mas tem problemas graves de disparidades econômicas, de acesso à educação e à infraestrutura básica. Se você juntasse as forças da China com o espírito de colaboração, abertura e criatividade da Índia, teria o rolo compressor ideal para o século 21.

“Talvez, com um pouco de força de vontade das empresas e do governo, o Brasil poderá começar a desempenhar esse papel.”

Políticas digitais

“Estarei no Brasil em agosto para palestras. Gostaria de encontrar os prefeitos de São Paulo e Rio para mostrar o potencial das Cidades Abertas, como em Bogotá.

“Também me ofereci para dar uma palestra no gabinete da presidente Dilma Rousseff, em Brasília, para discutir ideias e políticas para que o Brasil possa superar outros países na corrida por inovação em direção à economia digital. Acredito ser possível criar uma estratégia nacional. Espero que ela aceite o meu convite.”

***

[Camila Fusco, da Folha de S.Paulo]