Uma das dificuldades trazidas pelo impacto das novas tecnologias é a rapidez com que palavras precisam ser criadas para batizar coisas até então inexistentes.
No âmbito do que até podemos chamar de cultura digital, gestam-se novos paradigmas de percepção, de estrutura de pensamento, de ‘normalidades’. Um volume imensurável de informações tecnologicamente acumuladas, organizadas e disponibilizadas de formas até então insuspeitadas, geram instâncias inéditas de poder. Isso é claro, indiscutível. Já o que move o desejo e o interesse humano não tem nada de novo – pode faltar liberdade e sinceridade para ser nominado, mas novo não é. Muitos resultados de antigos padrões de ação também não são novos. A censura, por exemplo.
A proibição de temas e palavras a serem publicadas está historicamente datada, mas uma nova retórica tomou seu lugar. Os jornalistas de dois dos poucos jornais representativos da ‘grande imprensa’ que ainda subsistem no mercado não poderem fazer comentários profissionais em seus blogs, sites ou twitters, em nome da ética, é estranho, mas faz sentido… A informação descontextualizada não informa. Tirar referências de credibilidade das fontes e deixar ‘livre’ a tribuna ‘a todos’ evita o empoderamento referencial que pode vir a incitar o pensamento crítico consequente.
Apenas um começo?
Pode-se considerar liberdade jornalística a participação de cidadãos com acesso a rede? Não sei. A categoria funcional do jornalista desaparecerá diante da falência de um modelo de empresas? Não sei. Podemos chamar a seleção de flagrantes fotográficos enviados por cidadãos que gostam de sentir-se participativos, de jornalismo? Não sei. Jornalismo, o verdadeiro, o investigativo, é uma atividade que sobreviverá aos novos modelos das empresas? Não sei.
Sei que a assunção da idéia de que uma categoria profissional que investiga e divulga o resultado de suas investigações deva perder o reconhecimento institucional de sua formação acadêmica por decisão da instância mais alta da Justiça no país, em meio a tantas outras formações profissionais mantidas sem incômodos para o progresso da sociedade, é no mínimo bizarro. Sei que ver surgir no âmago do jornalismo – atividade (antes) tida como parâmetro indicador do grau de liberdade de uma nação – o controle e a interdição da expressão individual na internet (o espaço virtual da ‘liberdade’) é digno de exame.
Um jornalismo diferente espera para ser praticado, em larga escala, de forma conseqüente, com liberdade e ética, ditada por valores antigos, muito antigos, num espaço novo, do qual a internet pode ser apenas um começo. A Rede pode estar simplesmente indicando, tecnologicamente, do que o ser humano é capaz.
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Jornalista e Professora de Jornalismo da Escola de Comunicação da UFRJ, Rio de Janeiro, RJ