Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Luís Antônio Giron

‘A crítica musical do Brasil vive dias de caça às bruxas. É o clima da moda. A razão é uma suposta denúncia feita por Veja na edição da semana passada, sob o título ‘O mensalinho de Maria Rita’. O artigo, não-assinado, afirma que a gravadora Warner tentou corromper 30 jornalistas com um aparelho iPod, distribuído como estratégia de lançamento do CD Segundo, de Maria Rita. O aparelho teria sido motivo para a artista obter espaço nos jornais e revistas. Assim, alguns jornalistas teriam aceitado um jabaculê, ou jabá – ‘dinheiro ou qualquer coisa usada para corromper alguém, para ganhar uma inserção publicitária’ (segundo o Dicionário Houaiss). Maria Rita foi acusada de ser Rainha do Jabá. E todos os que avaliaram positivamente o CD, executados como bandidos. No caso do jornalista de ÉPOCA (leia-se: este que vos escreve), a gravadora teria ‘matado dois coelhos com uma cajadada’ porque ele produziu dois textos ‘simpáticos’ sobre ‘a filha de Elis’, um para esta revista e outro para a Bravo!. Ao contrário do que diz o texto, porém, este jornalista fez seu trabalho com honestidade crítica e decidiu devolver o aparelho intacto à assessoria. Isso por considerá-lo um exagero, já que eu havia recebido, em cima da hora, com ele, o CD e o DVD de Maria Rita, material mais do que suficiente para escrever meu artigo. A assessoria explicou que o iPod fora enviado aos críticos antes de o CD e o DVD ficarem prontos – e, no meu caso, tudo chegou ao mesmo tempo. Achei a estratégia de promoção desastrada, e segui o que julguei minha obrigação, sem pensar mais no descartado totem de consumo (tenho um desses, e não gosto de ouvir música com fone de ouvido). ÉPOCA publicou uma entrevista com a cantora e uma crítica ao CD, que mostrava o fracasso de seu projeto de fugir da influência dos pais.

Meu dever é esclarecer que as informações de Veja não foram conferidas. Os autores da denúncia anônima parecem ter cabulado a primeira aula de Jornalismo e incorreram em falta grave porque deixaram de me ouvir, como não o fizeram com outros que atacaram. Não checaram a informação nem mesmo com a assessoria de imprensa da cantora (que confirma ter recebido o aparelho que devolvi), valendo-se de fontes ocultas para difamar cidadãos sem lhes dar direito de resposta.

Em 22 anos de profissão, sempre condenei o jabá – modo de comprar a opinião da crítica. Paguei muitas vezes por minha independência. Munido dela, afirmo que Maria Rita é uma boa cantora e conquistou lugar merecido na MPB. Seus assessores gozam de alta reputação, conheço-os há 20 anos, e jamais recebi deles nenhuma oferta ilícita. O bom jornalismo cultural pede imparcialidade, análise e prestação de serviço. Sobretudo, exige que se verifique a idoneidade da informação junto às fontes. Eis uma regra que observamos na editoria de Cultura de ÉPOCA. Tão grave quanto o jabá é não ouvir todos os lados envolvidos em uma notícia, desprezando a lei básica da investigação – e violando um direito fundamental, o de defesa. Talvez seja por isso que os denunciadores de Veja não assinaram o texto. Eles intuem, no fundo de sua ausência de escrúpulo, que o patrimônio de um jornalista é seu nome, pois o ocultaram sob o artigo ignóbil. Esse patrimônio é, para mim, sagrado. Assino embaixo de tudo o que escrevi em minha vida profissional. Quando cometi erros, tratei de corrigi-los. Também assino embaixo do talento da intérprete que tentam enxovalhar.’



Miriam Abreu

‘Jornalistas repudiam acusação de jabá’, copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 7/10/05

‘Você que trabalha em redação já pensou se aquele brinde que chega em seu nome através de uma assessoria de imprensa tem como objetivo apenas divulgar um material ou tem por trás uma segunda intenção? Essa é uma boa pergunta para discussão entre os coleguinhas. E ela é inspirada na reportagem ‘O mensalinho da filha de Elis’, publicada na última edição da revista Veja. O texto da publicação caiu como uma bomba na imprensa e está sendo objeto de crítica, já que, como muitos jornalistas ouvidos pelo Comunique-se apontaram, não ouviu o outro lado da história.

A matéria de Veja acusa a gravadora Warner de se valer do chamado jabá para divulgar o novo CD de Maria Rita, Segundo. Trinta profissionais de imprensa receberam um mini-iPod – tocador de MP3 – junto com um DVD e o CD da cantora. Veja afirma que a intenção era, ‘obviamente, conquistar a simpatia dos jornalistas’ e que ‘a maioria escreveu resenhas e perfis chapa-branca – cuja tônica, curiosamente, é que a moça estaria se emancipando da influência materna’. A revista diz que ‘Istoé publicou que Maria Rita ‘está cantando esplendidamente’. Sua derivada, a Istoé Gente, lhe dedicou uma capa. No caso do jornalista da Época, a Warner matou dois coelhos de uma cajadada: ele escreveu uma matéria simpática na revista e outra mais elogiosa ainda na Bravo! (…)’.

Ainda segundo o texto, poucos veículos devolveram o iPod: a Folha de S. Paulo e O Globo. ‘O crítico do Jornal do Brasil esclareceu em sua resenha que recebeu um iPod mas ficou em cima do muro – disse que a cantora tem ‘talento até com repertório pouco inspirado’. O jornalista de O Estado de S. Paulo também ficou no morde-e-assopra – elogiou, mas ponderou que falta à cantora o ‘batismo da sarjeta’.

A reação foi imediata. Em artigo publicado no Comunique-se ontem, Luís Antônio Giron, da Época e colaborador da Bravo!, rebateu as acusações de Veja e criticou o fato da equipe da revista não ter escutado nenhum dos colegas que, apesar de não serem mencionados diretamente, estavam no centro da discussão. Ele, que diz ter devolvido o iPod, afirma que Sérgio Martins, repórter de Veja, lhe disse que a matéria foi encomendada. ‘Escrevi textos duplamente críticos’.

Um e-mail foi enviado por Giron a Eurípedes Alcântara, diretor de Redação de Veja, e Mario Sabino, redator-chefe, pedindo uma errata. ‘Mário disse que não era possível. Eurípedes nem respondeu’.

A editora assistente de Cultura da Istoé Gente, Mariane Morisawa, disse ao Comunique-se que a matéria de Veja é ‘repleta de incorreções’. ‘As razões para darmos capa para a notícia do novo CD estão na própria capa. Maria Rita vendeu 800 mil discos no país, tem uma história pessoal interessante. Recebi o iPod e devolvi, ao contrário do que dizem. O crítico Mauro Ferreira, que não ganhou o aparelho, falou tantas coisas boas como ruins sobre o CD, inclusive sobre o show de Maria Rita’. Questionada por que devolveu o iPod, Mariane acha ‘desnecessário’ ganhar o aparelho. ‘Não faz sentido eu receber um iPod já que o material necessário era o CD e o DVD’.

Naief Haddad, editor interino da Ilustrada, da Folha, julga o presente ‘inadequado’. ‘Quem ganhou o iPod foi o repórter Ronaldo Evangelista, que o devolveu. Ele não o levou para casa. Nem chegou a nos consultar, mas se o tivesse feito, teríamos pedido que devolvesse. Acho que a melhor política é não aceitar esses brindes ou qualquer tentativa de promoção envolvendo trabalho jornalístico’.

Dib Carneiro, do Caderno 2, do Estadão, diz que o crítico Jotabê Medeiros devolveu o iPod no dia seguinte, apesar de Veja dizer o contrário. ‘A crítica dele foi negativa e não ‘morde-e-assopra’ como diz Veja. Acredito que a revista cometeu um erro primário de não ouvir o outro lado’, rebateu. Para ele, dar o iPod aos jornalistas foi ‘desnecessário’. ‘O importante era o CD e o DVD para que pudéssemos fazer uma avaliação. Acho desnecessário dar um brinde como este, principalmente em se tratando de uma grande gravadora. Nós íamos fazer matéria de qualquer jeito. Achei uma idéia infeliz’.

Ivan Cláudio, editor de Cultura da Istoé, não quis falar sobre o assunto, mas disse que deve escrever algo a respeito. Nani Rubem, do Segundo Caderno de O Globo, chegou a falar pelo telefone com o Comunique-se, mas tinha um compromisso e não pôde conceder a entrevista. Como nossa redação não conseguiu entrar em contato com o Caderno B, do JB. (*) Ler Errata no fim da matéria

Marcos Vinícius, da assessoria Gilda Cardoso & Marcos Vinícius, que presta serviço tanto para a Warner como para Maria Rita, explicou que a decisão de enviar o iPod tinha como objetivo ‘facilitar a vida de todo mundo’, já que o disco atrasou na fábrica e que quem fosse entrevistar a cantora poderia ouvir as músicas horas antes da coletiva. ‘Nunca, em 16 anos de assessoria de imprensa, pensei em comprar algum jornalista’.

‘A Veja queria desde o primeiro CD uma exclusiva com Maria Rita. Não achamos certo, todos têm direitos iguais’, diz Vinícius, como se a revista tivesse ficado frustrada com o não recebido. O assessor também considerou grave o fato de Veja não ouvir os jornalistas.

Quem não se sentiu à vontade com o recebimento do iPod devolveu o aparelho, conta Vinícius. Ele não quis citar os nomes de quem o fez.

A redação do Comunique-se tentou insistentes contatos com Eurípedes Alcântara, diretor de Veja, que não se encontrava. Foi deixado o telefone de contato para retorno. Por volta das 18h30min, nossa redação ligou mais vez. Informamos que havia muitos jornalistas rebatendo não apenas o conteúdo da reportagem mas também a forma de apuração da mesma. Alcântara não nos atendeu, mas disse, através da secretária Miriam, que o que Veja tinha para falar está na reportagem da revista desta semana. Ou seja, não tivemos resposta.

Uma análise da situação segundo Carlos Chaparro

Colunista do Comunique-se e professor da Universidade de São Paulo, Chaparro lembrou que o jornalismo brasileiro tem uma ‘tradição fortíssima de corrupção na relação jornalistas-fontes’. ‘É bom lembrar que, até 1967, jornalista não pagava imposto de renda e ganhava um salário, o Jeton, das instituições públicas das quais fazia cobertura. Era considerado normal’.

Para o colunista, a regulamentação profissional, no final da década de 60, contribuiu e muito para moralizar a relação entre fontes e jornalistas. ‘O jabaculê é um artifício de sedução do jornalista não com a intenção de corromper, mas de manter azeitadas as relações com o profissional de imprensa e com as redações. Essa tradição vem das relações públicas implantadas no século XX. É o brinde, o almoço, convites para festas e até coisas piores. Infelizmente faz parte de nossa cultura’.

Chaparro acredita que o jornalista honesto pode receber um brinde que não vai se corromper, quer devolva ou não o jabá. ‘A honestidade profissional não se mede pelo que ganham ou não, e sim se deixam ou não de se corromper. Ela está acima da tradição’.

Ele defende a mudança no comportamento das fontes. ‘Se querem jornalistas honestos, que contribuam para isso. Está na hora de se incluir no cenário da responsabilidade social a honestidade da informação. Acho bom que se devolva o brinde, não para dizer que é honesto, mas para educar as fontes’.

O colunista acha que uma boa maneira para contribuir para essa educação é passar a dizer no rodapé da matéria que o jornalista recebeu brinde, como fazem nas reportagens de Turismo.

(*) ERRATA – Ao contrário do que foi aqui publicado, as pessoas que foram procuradas ontem, Letícia Pimenta, editora, e Leonardo Maia, repórter, não fazem parte da equipe do Caderno B, e sim, da Revista Programa. O Comunique-se vai tentar novo contato, dessa vez com os editores do Caderno B.’



Cassio Politi e Fabíola Tarapanoff

‘Jabás: Veja não checou. E errou.’, copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 7/10/05

‘Alvo de críticas ao longo desta semana, a reportagem da revista Veja cometeu, deliberadamente, erros que ferem os princípios básicos do bom jornalismo. A reportagem ‘O mensalinho da filha de Elis’ atingiu em cheio duas de suas concorrentes: Época e IstoÉ, além da derivada IstoÉ Gente. Concorrência nas bancas à parte, a questão principal é a seqüência de deslizes cometidos por uma das mais importantes publicações do País, de propriedade da Editora Abril. Faltou à matéria, publicada na edição 1.925, de 05/10, cumprir um mandamento primordial: ouvir todas as partes envolvidas. E, não menos grave, publicou informações erradas.

O jornalista Luís Antônio Giron, de Época, foi o centro das acusações. A matéria de Veja afirma que ele recebeu um iPod (tocador portátil de MP3) da gravadora Warner e, em troca, teceu elogios à cantora Maria Rita tanto na publicação onde trabalha quanto na Bravo!, para onde escreve resenhas ocasionalmente. Não é verdade. A assessoria de imprensa da Warner confirmou que Giron ‘devolveu o iPod intacto’, dia 15/09, dois dias depois de ter-lhe enviado o aparelho. Em um texto encaminhado por e-mail espontaneamente pelo jornalista ao Comunique-se nesta semana, Giron afirma que recebeu o iPod, sim, junto com CDs e DVDs. Descartou o iPod e ficou com o restante do material, que serviria de base para suas críticas. Para isso, consultou o diretor de redação e editor responsável de Época, Aluizio Falcão, no dia 14/09. Foi aconselhado a devolvê-lo sem usar e seguiu a instrução. A informação foi confirmada por Falcão.

A reportagem de Veja não está assinada. Pode ter sido escrita por uma ou mais pessoas. Uma delas é Sérgio Martins. Ao atender o telefonema da reportagem do Comunique-se, na quarta-feira (05/10), ele se limitou a informar que ‘o texto é de cunho editorial’ e passar os contatos de quem deveria responder. No mesmo dia, foram feitas seguidas tentativas de contato por telefone com Eurípedes Alcântara, diretor de redação de Veja. Não houve retorno nem uma posição oficial. Nesta quinta, um mesmo e-mail foi enviado três vezes. O conteúdo: sete perguntas buscando a versão da revista (leia abaixo). Até a publicação desta matéria, nenhuma resposta foi encaminhada por e-mail.

Outro deslize: Veja afirma que 30 críticos de música receberam o equipamento, classificado de ‘jabá’. Foram, na verdade, 12. O subtítulo: ‘gravadora presenteia jornalistas com iPods. E eles agradecem falando bem da cantora’. No título, a associação com o mensalinho, escândalo que colocou holofotes na lama da corrupção para denunciar esquemas de falcatruas de políticos, é, no mínimo, exagerada. Os iPods ofertados aos jornalistas custam R$ 590,00 (valor abaixo da faixa de R$ 600,00 a R$ 1.000,00 mencionada pela revista). Uma passada de olho pelos jornais das últimas semanas basta para perceber que textos elogiosos ou críticos à cantora Maria Rita, que acaba de lançar um novo álbum, são conseqüências naturais de quem ganha espaço na mídia.

A Editora Três, outra acusada, não é ‘só flores’ com a estrela. Faz, sim, elogios à cantora. Mas no texto de Mauro Ferreira, intitulado Segundo, sobre o CD de Maria Rita, publicado na mesma edição citada por Veja, ele diz que ela ‘tirou o peso de sua voz, mas conta com repertório irregular’. Conceituou com apenas três estrelas o trabalho da artista. Uma avaliação nada positiva.

Na mira

Na semana em que a reportagem de Veja estava sendo fechada, Martins, um dos autores anônimos (ou único autor), contatou a redação da Bravo!, publicação especializada em cultura, também da Editora Abril. Soube que a Bravo! não recebera o iPod, mas que Giron, sim. Giron tem emprego fixo em Época, mas escreve para Bravo!. Se tivesse tentado contato com Giron nesse dia, Martins teria conseguido checar a informação e mudar a matéria. Giron escreveupara essa revista uma resenha, que Veja considerou elogiosa. Não critica, é verdade. Elogia, moderadamente, assim como outros veículos. Nada que lembre o Mensalinho ou coloque o autor sob suspeita, no nível do ex-deputado Severino Cavalcanti. Aliás, Giron faz uma comparação indigesta, da qual a própria Maria Rita procura se esquivar: entre ela própria e a mãe, Elis Regina, morta no início dos anos 80 (leia o texto de Bravo! na íntegra).

No final da manhã de sexta-feira (30/09), Giron recebeu um telefonema dos companheiros de Bravo!. ‘Você está na lista do Mensalinho’, informou um colega, que ficara sabendo disso pelo próprio Martins. Giron passou parte do dia tentando entrar em contato com a redação de Veja. Sem sucesso. Só foi atendido quando a revista já estava praticamente fechada. O máximo que conseguiu foi encaminhar um e-mail em sua defesa, que foi publicado por Veja, mas, segundo ele, editado.

Se contasse com dados verdadeiros, Veja causaria um escândalo. ‘Um dos objetivos da matéria era, sem dúvida, me atingir, pois trabalho numa empresa e escrevo para a concorrente’, acusa Giron. ‘Um dos autores da matéria é ele’, denuncia, referindo-se a Martins. A informação foi checada pelo Comunique-se e confirmada por uma fonte ligada a Martins. ‘O Martins trabalhou comigo há muito tempo, no [extinto] Notícias Populares. Ele participou do caso da Escola Base.’

A Revista IstoÉ Gente defendeu-se das acusações em sua edição online. Sinal de que Veja provocou um desconforto nos colegas de mercado. Época vai se defender na edição que vai às bancas no final desta semana.

E-mail

A assessoria de imprensa da Warner optou por não atender o pedido do Comunique-se de identificar os 12 veículos que receberam iPod. Alegou que não pretendia expor profissionais aos ataques da revista publicada pela Abril. Segundo a assessora Gilda Matoso, a matéria pode ter sido motivada pelo fato de Maria Rita ter recusado uma exigência de Veja para conceder uma entrevista exclusiva anos atrás. A partir de então, matérias negativas sobre a cantora teriam começado a ser publicadas. Esta questão é uma das sete que foram levadas à direção de Veja, que não retornou os telefonemas nem respondeu os e-mails enviados pela editora do Comunique-se, Miriam Abreu, por três vezes. Leia a íntegra do e-mail de autoria do Portal, que não obteve resposta:

Caros Eurípedes Alcântara e Marcos Sabino,

Temos tentado manter contato com a direção de Veja para fazer uma série de perguntas baseadas na reportagem ‘O mensalinho da filha de Elis’, publicada na página 115, da edição 1925, datada de 5 de outubro de 2005. Ontem, ligamos insistentemente para conseguir uma posição desta conceituada publicação. Como não obtivemos resposta para cada pergunta, enviamos abaixo as questões da entrevista que precisamos fazer para esclarecer nossa matéria.

Em respeito aos cerca de 500 mil leitores do Comunique-se, dos quais 120.000 são jornalistas, incluindo profissionais da própria Veja, assessores de comunicação, RPs e estudantes de jornalismo, faz parte do nosso trabalho apurar este caso e dar o devido retorno a esta comunidade.

Atenciosamente,

Miriam Abreu

Editora

1 – Luís Antônio Giron, da Época, afirma que, em conversa com Sérgio Martins, repórter desta revista, este disse que a matéria ‘O mensalinho da filha de Elis’ foi ‘encomendada’. Isso é verdade?

2 – Vocês também receberam o iPod? Se sim, o que fizeram com ele? E se devolveram, quando isso foi feito? Têm algum documento que possam enviar à redação do Comunique-se para provar a devolução à Warner?

3 – Segundo a assessoria de imprensa da Warner, a reportagem em questão seria uma retaliação à tentativa frustrada de Veja de obter uma entrevista exclusiva com Maria Rita no lançamento do primeiro CD da cantora. O que vocês têm a dizer sobre isso?

4 – Luís Antônio Giron, da Época, Mariane Morisawa, da Istoé Gente, e Dib Carneiro, do Estadão, afirmam que a Veja publicou a matéria sem ouvir os dois lados, não cumprindo uma regra básica do bom jornalismo. É verdade que vocês não ouviram nenhum profissional destes três veículos citados, além daqueles citados na reportagem em questão?

5 – O envio de brindes como demonstrativo do lançamento de produtos é algo que existe desde de sempre. Editoras enviam livros, muitas vezes de alto valor, para serem avaliados. Jornalistas de turismo são convidados para passar fins de semana, com direito a acompanhante, para avaliação de um novo hotel de luxo etc. Considerando então que não se trata de fato novo e que a Veja, como todos os demais veículos de imprensa, já tinha conhecimento desta prática, por que somente agora decidiu abordar esse assunto, dedicando uma página a um tema tão antigo? Considerando que o objetivo da Veja, como de todos os demais veículos, é informar a sociedade, por que a revista não prestou este serviço anteriormente?

6 -Profissionais do Comunique-se, formado por 15 jornalistas que cobrem jornalismo, consideraram descabida a comparação deste caso ao de corrupção, batizado de mensalão. Dado que foram enviados aparelhos, de baixo custo (us$ 99), carregados com as músicas da própria cantora, com objetivo de divulgação. A Veja acredita que isso realmente pode ser caracterizado como mensalinho?

7 – Na apuração parcial acerca de matérias publicadas sobre o lançamento do CD da cantora Maria Rita, feita hoje pelo Comunique-se, verificou-se que muitos veículos que não receberam o aparelho dão destaques positivos à cantora Maria Rita em suas críticas de música. Isso indica que, para obter elogios da imprensa, essa e outras artistas não precisam comprar a opinião da imprensa, sobretudo por valores baixos, como R$ 600, R$ 1000 ou US$ 99 (preço de um mini-iPod em sites de e-Commerce dos Estados Unidos). A direção de Veja considera possível que veículos de grande expressão se vendam por um aparelho de US$ 99?’



Comunique-se

‘Leia o texto de Giron publicado pela Bravo!’, copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 7/10/05

‘O jornalista Luís Antônio Giron, da revista Época e colaborador da Bravo!, foi citado por Veja!, em matéria desta semana como tendo elogiado a cantora Maria Rita em troca de receber um iPod. A revista, da Editora Abril, menciona o texto da edição de outubro como tendo sido elogioso. Leia a íntegra do texto publicado na Bravo!. Leia o texto na íntegra:

Por que ouvir Maria Rita

Ainda que o fantasma de Elis paire sobre a filha, não é lícito nem simpático comparar dois tempos que só se colam pelo DNA

Minha carreira começou em 1983, um ano depois da morte de Elis Regina. Não tive a oportunidade de entrevistá-la. Passei a infância ouvindo os discos e vendo os programas de TV da ‘Pimentinha’. Ouvi muito Elis, até enjoar. A ponto de não precisar mais escutá-la – defeito de minha impaciência e não do grande canto da intérprete.

Quando Maria Rita surgiu no horizonte musical, em 2001, com um show no Supremo, em São Paulo, dois anos depois com o CD Maria Rita e agora com este Segundo, a seqüência de audições me tem soado como uma reedição de Elis. Não tem jeito, não consigo ouvir nada mais que Elis em Maria Rita, mesmo sabendo que ela é contralto e a mãe era mezzo-soprano; o repertório seja outro; e boa parte do público jovem de Maria Rita jamais ouviu uma faixa da mãe. É Elis e pronto. Em setembro, fui fazer entrevista com ela por ocasião do lançamento de Segundo. Lá estava a moça de 28 anos se submetendo a baterias de entrevistas ‘exclusivas’, rodeada de staffs – estes por sua vez cercados de outros staffs.

Eu disse a Maria Rita que havia gostado do disco, porque dessa vez a voz timbrava em contralto mais que em mezzo, ‘e você está mais você do que Elis…’. Ela me interrompeu: ‘Você está vendo mais Elis em mim do que eu vejo, e meu público já nem pensa mais nisso!’. Mania de crítico, respondi, mas acho que Maria Rita tem razão. Por pertencer a uma geração intermediária entre ela e a mãe, por ser quarentão, tenho ouvido excessivamente miasmas de Elis em Maria Rita. Para mim, mesmo no segundo CD, ela é uma cantora assombrada pelo espectro da mãe. Mas encantada pela linda voz e a originalidade que busco a qualquer custo nas 12 faixas de Segundo como se procurasse Wally numa multidão de referências de Elis.

É inevitável perceber a escolha do repertório, ainda que dos supernovos Marcelo Camelo e Rodrigo Maranhão, o acompanhamento do combo e a voz, timbrada na genética. Tudo, no entanto, me remete à mãe. Sou eu, confesso, que estou assombrado. Não é lícito nem simpático comparar gerações tão distantes: alguém vivo de 30 anos com alguém morto que faria 60, dois tempos que não se colam senão pelo DNA de mãe a filha. Vamos deixar assim, Maria Rita cantar como se não lhe conhecêssemos a filiação. Na forçada metempsicose às avessas, esvazio a alma de citações e referências. Vamos fazer como os zen-budistas e limpar a mente. Só assim posso vir a gostar do excelente Segundo. Errado sou eu.

Segundo (Warner Music), Maria Rita. Produção: Lenine e Maria Rita. Arranjos: Tiago Costa e Maria Rita. Músicos: Tiago Costa (piano), Sylvinho Mazzucca (baixo) e Cuca Teixeira (bateria). Preço médio: R$ 28.’