Thursday, 26 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

O Estado de S. Paulo

ELEIÇÕES 2006
Carlos Marchi

Alckmin vê quadrilha no governo Lula, que culpa tucano por PCC

‘Os dois candidatos à Presidência da República encerraram seu último enfrentamento, ontem à noite, no debate da TV Globo, com momentos duros: bateram boca, recorreram a palavras pesadas e a insinuações maliciosas em suas respostas. Acusado de deixar prosperar o PCC em São Paulo, o candidato Geraldo Alckmin (PSDB) reagiu: ‘O PCC não é ligado a meu partido, não, não, não.’ Antes, o candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT) provocara: ‘Se ele cuidou da segurança como diz que cuidou, o resultado é que a maior quadrilha de gangue agia dentro da cadeia.’

Alckmin replicou com mais dureza ainda: ‘A quadrilha do PCC está em penitenciária de segurança máxima, mas a quadrilha que o procurador-geral denunciou está toda solta’, disse, numa referência à denúncia do procurador Antônio Fernando de Souza sobre o esquema do mensalão. O duelo final das eleições de 2006 esquentou quando Lula, já no fim do debate, fez uma provocação a Alckmin, dizendo que ele ‘deixou nascer o PCC’ e pediu que contasse para o povo ‘de onde vem o dinheiro’ para as muitas propostas que apresenta para a área da segurança pública.

Alckmin replicou com uma verve que não lhe é comum: ‘Quando o Lula perguntou de onde vem o dinheiro, eu pensei que ele fosse explicar para você’, disse, dirigindo-se aos telespectadores’, ‘de onde veio o dinheiro do dossiê Vedoin.’

Bom de improviso, Lula retrucou: ‘O dinheiro, você sabe de onde veio. Foi uma secretária-geral do PSDB de uma cidade de Minas Gerais que mandou o padeiro mentir’, afirmou, referindo-se a Roseli Pantaleão, secretária-executiva do PSDB de Pouso Alegre (MG), que orientou Luís Armando Silvestre Ramos – que não é padeiro – a dizer à Polícia Federal que levara de Minas parte do dinheiro apreendido com petistas em São Paulo.

E foi além em seu ataque final, afirmando que o governo Alckmin gastou R$ 1.800 por criança, por ano, na Febem paulista, para fazer ‘uma casa de produção de criminosos’. O tucano contra-atacou com energia: ‘Eu não passo responsabilidade para os outros. O sonho de Mário Covas era reduzir o número de homicídios em São Paulo pela metade. Pois caiu 54%, e isso não é só número, é gente que está deixando de morrer.’ E cutucou Lula: ‘Eu não cortei dinheiro do Fundo Penitenciário’, disse, repetindo uma crítica que faz constantemente ao petista.

Alckmin perguntou a Lula por que todas as pessoas que perguntaram aos candidatos relataram problemas. O petista respondeu: ‘As coisas que estão acontecendo é o governo federal (sic.) que coloca dinheiro.’ E completou: ‘Não existe hoje neste país um programa social que não seja do governo federal, tirando os cento e sessenta mil qualquer coisa aí do Alckmin. Cada brasileiro sabe que não é possível consertar em quatro anos o que não foi feito em quarenta.’

Incisivo, o tucano cobrou a menção irônica de Lula aos ‘cento e sessenta qualquer coisa aí do Alckmin’. E disse: ‘Precisamos ser mais respeitosos. São 160 mil pessoas que recebem o Renda Cidadã, programa social do governo de São Paulo, não são cento e sessenta e qualquer coisa.’

Lula disse que não criou os programas sociais que são a marca principal de seu governo ‘por criar’: ‘Criei porque o movimento social organizado exigiu que fosse criado.’ E fez uma promessa: colocar mais 300 mil jovens no ProUni nos próximos quatro anos, se for eleito.

Ao final, Alckmin apelou aos eleitores e disse que o ‘não troque o certo pelo duvidoso (slogan de Lula)’ é ‘medroso’. Depois de uma hora e 49 minutos, os dois candidatos se cumprimentaram amistosamente no meio da arena, onde de pé e quase no corpo-a-corpo protagonizaram o confronto.’

Cristina Padiglione

Audiência chega a 38 pontos

‘A média de audiência da TV Globo durante o debate foi de 38 pontos, segundo a medição instantânea feita pelo Ibope na Grande São Paulo. Esse índice é uma prévia da audiência consolidada, que normalmente oscila 1 ou 2 pontos e só é fechada no dia seguinte à exibição do programa.

Das TVs ligadas na região, 58% estavam sintonizadas na Globo. Segundo a emissora, esse horário costuma render 31 pontos no Ibope. Cada ponto equivale a 54,4 mil domicílios com TV.

Em 2002, o último debate entre Lula e José Serra teve 38 pontos na Grande São Paulo. Na época, 1 ponto equivalia a 47,5 mil domicílios.’

Patrícia Villalba, Alexandra Penhalver

‘Tempo esgotado de novo?’, diz espectador

‘Um debate muito mais animado e bem-humorado sobre as eleições foi realizado entre convidados do Estado no restaurante Supra, no Itaim. As atenções só se voltaram completamente para o telão, instalado numa sala reservada, quando o presidente Lula e o candidato do PSDB, Geraldo Alckmin, chegaram a se olhar de perto na arena montada pela Globo. ‘Os dois pareciam estar com medo, cheios de tiques nervosos’, anotou o estilista Heitor Werneck, observador mordaz que é.

O programa de ontem foi visto na saleta do Supra como mais uma superprodução da Globo. Asséptico, perfeito como show de TV, e aí sobram elogios ao jogo de câmeras da emissora, que deixa à mostra do espectador os olhares de um candidato para o outro. Se vai servir ao eleitor que ainda está indeciso, são outros quinhentos. ‘A discussão política sendo apresentada como um show me preocupa porque as pessoas não prestam atenção no que eles estão falando. Vêem só a expressão corporal, a roupa, e menos o conteúdo’, analisa o poeta e professor de literatura Frederico Barbosa.

‘Esse formato chama mais a atenção para o gestual, muito mais do que os outros debates.’ Chamou a atenção, então, a aplicação – ‘não muito bem-sucedida’ – de botox que o presidente teria feito no rosto. Falou-se sobre qual seria o melhor terno, a melhor gravata.

‘Se ele fez botox, porque não aproveitou para tirar as bolsas debaixo dos olhos?’, questionou Werneck. ‘O marqueteiro não deve ter deixado. Poderia tirar a identificação dele com o povo’, opinou a advogada Rosely Buqui.

Voto nulo declaradíssimo – ele tem feito campanha com amigos na internet -, Werneck viu o debate com olhos de quem está acostumado com linguagem televisiva.

‘O Lula, com sua ironia, se mostra muito manipulador, o mesmo manipulador dos tempos de sindicalista, só que agora melhor vestido. O Alckmin é uma cópia mal-acabada do Juscelino, sendo que o ex-presidente, ao menos, sabia dançar. Ele, eu acho que não sabe.’

Por falar em dança, faltou emoção, despojamento. Não que fosse o caso de incendiar a arena, mas nem tanto cá nem tanto lá. ‘A platéia parecia supertensa quando os candidatos se aproximavam, encarando. As primeiras fileiras pareciam treinadas, mas mesmo assim tensas. Tiraram toda a emoção. Se sou eu, lendo uma pergunta sobre o remédio da minha mãe, seria um pouco mais enfático’, disse Werneck. ‘Amanhã, essa platéia vai direto para o acupunturista’, brincou a atriz Graziella Moretto, que não votou no primeiro turno porque estava viajando, não esperava pelo segundo turno e, agora, está aflita por ter de escolher entre os dois candidatos. ‘Preferia não ter de passar por isso.’

‘Tempo esgotado de novo?’, admirou-se Graziella. Foi consenso entre os nossos convidados que 40 segundos ou um minuto não são suficientes para uma argumentação consistente sobre os rumos do País. ‘É só uma projeção de dados e números, e a gente fica sem saber se alguém faz uma checagem para saber se são verdadeiros ou não’, resumiu Graziella.

No encontro promovido pelo Estado entre eleitores na semana passada, Rosely estava indecisa. Uma semana depois, ontem se declarou decidida, mas confessa que não foi por causa dos três debates a que assistiu. Disse que votará em Alckmin porque não concorda com a estratégia de Lula em se mostrar como homem do povo. ‘Não acho o Alckmin ideal, mas não quero um presidente de botequim, como se estivesse com os mais pobres numa mesa de bar.’

Formadora de opinião, a pequena platéia do Supra falou muito sobre o tom desalentador da eleição. ‘A partir do momento em que a primeira-dama requer a cidadania italiana dos filhos pensando no futuro deles, percebe-se que o desânimo é geral.’’

Marco Antonio Carvalho Teixeira

Mais debate e menos agressão

‘O debate promovido pela Globo, que fechou o ciclo de embates entre os candidatos Alckmin e Lula pelo voto dos brasileiros nesse segundo turno, significou uma ruptura com o modelo que vinha prevalecendo nos encontros anteriores, ao permitir que perguntas elaboradas por eleitores indecisos de todas as regiões, previamente selecionadas pelos organizadores, pudessem ser respondidas pelos presidenciáveis durante a maior parte do programa.

Esse novo formato teve o mérito de ampliar o cardápio de temas tratados pelos candidatos. Ao trazer questões diretamente ligadas às políticas públicas – como desemprego, educação, habitação, meio ambiente, previdência, saúde, segurança e transporte, entre tantas outras – e, na maioria das vezes, narrá-las conforme elas se apresentam nos seus cotidianos, os eleitores obrigaram os candidatos a se confrontarem de forma mais propositiva, reduzindo o clima beligerante que marcou os debates anteriores. Não que o conflito entre ambos tenha desaparecido; em muitos momentos Alckmin e Lula partiram para a agressão mútua fazendo uso de ironias e colocando em xeque a veracidade dos dados apresentados por cada um deles. A postura agressiva entre os presidenciáveis só prevaleceu quando eles passaram a fazer perguntas entre si.

Tanto durante o primeiro turno como no decorrer dessa etapa final, os presidenciáveis não conseguiram priorizar a discussão de políticas públicas durante os debates promovidos pelas emissoras de TV. Com esse novo formato, Alckmin e Lula se viram obrigados a tratar de temas do dia-a-dia e a falar de maneira mais clara sobre o que pensam e onde divergem sobre tais questões.

Quem venceu? É uma questão que cabe ao eleitor responder. Entretanto, vale a pena destacar que esse último debate teve o mérito de diminuir o espírito beligerante dos candidatos e colocá-los diante dos problemas vividos pelos brasileiros, que foram materializados nas perguntas feitas diretamente pelos eleitores ali presentes.

*Marco Antonio Carvalho Teixeira, cientista político e professor da Escola de Administração de Empresas da FGV-EAESP’



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No RN, afiliada da Globo sai do ar por 24 horas

‘A Justiça Eleitoral suspendeu por 24 horas a programação da TV Cabugi, afiliada da Rede Globo no Rio Grande do Norte, por desobediência à Lei Eleitoral. A Cabugi teria sido notificada, mas descumprido ordem judicial proibindo a veiculação da imagem do vice-governador Antonio Jacome no programa eleitoral de Garibaldi Alves (PMDB). A emissora alega que não recebeu notificação, só uma ligação de um juiz eleitoral.’



TVA À VENDA
Renato Cruz

Telefônica deve comprar TVA

‘O Grupo Telefônica, presidido por Fernando Xavier Ferreira, está perto de fechar um acordo para a compra da TVA, empresa de TV paga do Grupo Abril, que tinha 300 mil clientes no fim do ano passado, o equivalente a cerca de 7% do mercado de TV paga. A aquisição deve ser feita em etapas, já que existem restrições legais para que a operadora assuma as licenças de cabo. Para o MMDS, tecnologia de TV paga por microondas, não existe restrição.

As conversas foram confirmadas oficialmente. ‘O Grupo Abril confirma que existem negociações em andamento com a Telefônica’, informou a empresa, em comunicado. ‘Até o momento, no entanto, a TVA não tem nenhuma negociação concluída sobre eventuais mudanças na participação societária da companhia e cumpre as etapas para realização do IPO, conforme comunicado enviado à Comissão de Valores Mobiliários no final de setembro.’ Ao mesmo tempo em que negocia com a Telefônica, a empresa de TV paga dá andamento ao processo de abertura de capital.

As regras atuais impedem que uma concessionária de telefonia fixa assuma o controle de uma empresa de cabo. Também exigem que 51% do controle da companhia de cabo fique nas mãos de empresas nacionais. Há mais de um ano a Telefônica procura um jeito de entrar no mercado de TV paga. Primeiro, a empresa estudou operar o serviço de IPTV (TV por internet), em que o acesso de banda larga, pelo fio do telefone, é ligado a um conversor no aparelho de televisão, transmitindo vídeo.

Por causa de impedimentos legais, a empresa tentou duas outras saídas: o pedido de uma licença de DTH, TV paga via satélite, e uma parceria com a Astralsat, companhia que já possui uma licença para o serviço. As duas alternativas não foram para a frente porque a companhia não conseguiu fechar acordos de distribuição de conteúdo com as redes de TV aberta, como Globo e SBT. Boa parte da audiência da TV paga vai para os canais abertos. Sem eles, o negócio seria inviável.

O que colocou pressão na Telefônica para operar o chamado triple play (união de dados, voz e imagem em um só pacote) foi a entrada da Telmex no controle da Net, maior operadora de TV paga do País, por meio de sua controlada Embratel. Em seis meses, a Net conseguiu vender 115 mil linhas de telefonia. Pode parecer pouco perto dos 12,342 milhões de linhas que a Telefônica tem em serviço, mas a Net busca conquistar a fatia de clientes das classes A e B, responsáveis pela maior parte da receita da operadora.

A Telefônica e a Telmex são os maiores competidores do mercado latino-americano. O movimento da Telefônica pode ser visto neste contexto. Na terça-feira, quando divulgou os resultados, o presidente da Net, Francisco Valim, disse que o movimento da Telefônica e de outras concessionárias locais era defensivo. ‘Eles querem manter o monopólio na telefonia e acabar com a competição em banda larga’, acusou Valim. ‘Se incorporassem todo o setor de TV paga, a receita não iria aumentar nem 10%.’

As acusações de monopólio são feitas dos dois lados. Na quinta-feira, o diretor de Relações com Investidores da Telemar, José Luís Salazar, acusou a Net de ‘monopólio do triple play’.’



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Teles lideram consolidação da TV por assinatura

‘Antes das conversas entre TVA e Telefônica, a Net, da Embratel, anunciou compra da Vivax

O primeiro grande movimento das operadoras de telecomunicações no mercado de TV paga foi a entrada da Telmex no controle da Net, anunciada em junho de 2004. Posteriormente, a empresa do bilionário mexicano Carlos Slim Helú foi substituída por sua controlada Embratel como acionista da Net. Formalmente, a Embratel tem 49% de participação na Net. Tanto as Organizações Globo quanto a Telmex já admitiram, porém, que os mexicanos passariam a ser majoritários se a lei assim o permitisse.

A Embratel começou a oferecer telefonia aos clientes da Net no segundo trimestre deste ano, o que colocou pressão sobre a Telefônica para achar uma solução para integrar televisão ao seu pacote de serviços. No dia 13, a Net anunciou que vai comprar a Vivax, segunda maior empresa de TV a cabo do País, reforçando sua presença no interior de São Paulo. Juntas, as duas empresas terão 75% do mercado de TV a cabo e 45% do mercado de televisão por assinatura do País.

Na terça-feira, Francisco Valim, presidente da Net, afirmou que as concessionárias locais (Telefônica, Telemar e Brasil Telecom) podem tirar do mercado as empresas de TV por assinatura, por causa de sua força financeira. Entre janeiro e junho, as empresas de telefonia fixa faturaram R$ 34,5 bilhões, segundo estudo da Associação Brasileira de Telecomunicações (Telebrasil). No mesmo período, as empresas de TV paga tiveram receita de R$ 2,6 bilhões, o equivalente a 7% do total da telefonia fixa.

Acontece, no entanto, que a Net é uma peça essencial na estratégia da Telmex no Brasil. A Embratel não tem a chamada última milha, conexão de rede que chega à casa do cliente, e a rede de TV a cabo é hoje, em todo o mundo, a principal alternativa à infra-estrutura de telefonia.

Existe um desequilíbrio econômico entre empresas de telefonia e de TV a cabo, mas o mesmo não pode ser dito dos dois principais grupos que disputam o mercado. Em 2005, a Telefónica registrou, no mundo, faturamento de US$ 48,4 bilhões. A Telmex e a América Móvil, que pertencem a Carlos Slim Helú, faturaram juntas R$ 31,3 bilhões. ‘É um mercado de gente grande’, reconheceu Valim.

A Telemar, maior empresa de telecomunicações do País, tenta entrar nesse mercado com a compra da Way TV, empresa de TV a cabo de Minas Gerais. Ela aguarda a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) se manifestar sobre a transação. Por ter capital nacional, a Telemar não precisaria ficar limitada a 49% do controle, como aconteceu com a Embratel na Net e deve acontecer com a Telefônica na TVA. A Associação Brasileira de Televisão por Assinatura (ABTA) enviou um documento à Anatel pedindo a proibição da compra da Way TV pela Telemar. Existe uma cláusula no contrato de concessão que proíbe a empresa de operar TV a cabo em sua área.

A compra da TVA daria outras vantagens à Telefônica. Além da entrada na TV paga, a empresa teria acesso a freqüências para banda larga sem fio com tecnologia WiMax. Comandada por Leila Loria, a TVA opera o serviço de MMDS, TV via microondas, em São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba. As freqüências do MMDS também podem ser usadas para o WiMax. A Anatel tentou leiloar mais freqüências este ano, mas foi impedida pelo Tribunal de Contas da União (TCU).’



REPÓRTER GABO
Ubiratan Brasil

García Márquez, o repórter

‘No final dos anos 1950, enquanto uma brilhante geração de repórteres americanos (Guy Talese, Tom Wolfe, Jimmy Breslin, Hunter S. Thompson) ensaiava escrever uma não-ficção apurada, com técnicas em geral associadas ao romance e ao conto, o colombiano Gabriel García Márquez utilizava as mesmas ferramentas para escrever, na imprensa diária de seu país, o que logo se convencionou chamar de jornalismo literário.

Entre agosto de 1954 e março de 1955, Gabo acompanhou incidentes locais para escrever reportagens investigativas – não meramente informativas, mas com uma estrutura que vai além de apenas enumerar fatos. Os textos, publicados em Textos Andinos, tratam de um deslizamento (Balanço e Reconstituição da Catástrofe de Antióquia), de uma marcha de protesto (O Chocó Que a Colômbia Desconhece) e da sobrevivência de um náufrago (O Náufrago Sobrevivente Passou 11 Dias em uma Frágil Balsa).

Um traço marcante dessas reportagens é o sutil desvio de interpretação oferecido pelo escritor – se é rigoroso com os dados, apresentando milimetricamente todos os detalhes da história, ou se, por outro lado, lança mão de metáforas, García Márquez apresenta uma leitura variada dos fatos. Cada informação, comprovada ou não, conquista uma parcela de verdade.

Ao retratar a catástrofe de Antióquia, por exemplo, o repórter Gabo descobre o detalhe revelador, aquele com o qual critica a ineficiência das autoridades, mais interessadas em se autopromover do que atender aos aflitos: somente dois dias depois de ocorrida a tragédia, que vitimou 67 pessoas, o secretário de Obras Públicas finalmente aparece em público para o ridículo ato de resgate do cadáver de um coelho entre os escombros.

García Márquez também trata com habilidade da completa confusão de notícias veiculadas na cidade, tanto por fontes oficiais como anônimas. Aqui, o grande escritor se revela ao resgatar depoimentos dos sobreviventes e também ao reconstituir, de forma criativa, os últimos passos das vítimas.

O rigor, a busca obsessiva pelo detalhe, aliás, é mais forte em O Chocó Que a Colômbia Desconhece. O fato foi inusitado – cidade pequena, perdida, quase sem esperança, Chocó é surpreendida por uma manifestação de seus habitantes que, depois de horas ininterruptas de protesto contra a desoladora situação, saem em uma marcha pacífica.

Gabo parte de pormenores geográficos e levantamentos estatísticos que impediram o desenvolvimento da cidade para justificar a cívica reivindicação dos moradores. Aos poucos, a narrativa assume uma velocidade à medida que cresce a irritação dos cidadãos e o escritor escolhe o humor para registrar a rápida progressão de acontecimentos.

Seis meses depois de publicada a matéria, García Márquez retomou o assunto em Chocó Irredento, em que anuncia a contagem de um novo aniversário da longa história da ineficiência dos governos. Ao mesmo tempo, retrata uma nova marcha, agora migratória, em direção ao Panamá. Impossível não reconhecer seu gosto de amargura. Além de informar, o escritor consegue ainda o precioso resgate de um estilo jornalístico, o satírico, comum no século 19 e que, por meio da graça, conseguia respostas mais imediatas.

Editada em livro ,15 anos depois de sua publicação no jornal El Espectador, a história do náufrago Luiz Alejandro Velasco revela o auge criativo atingido por García Márquez em sua produção jornalística. Se no livro Relato de um Náufrago o autor utilizou a primeira pessoa para contar a história, nos textos jornalísticos o que se destaca é a transcrição dos fatos mais emocionantes contados pelo marinheiro.

Novamente, Gabo não deixa escapar nenhum detalhe, o que revela o vínculo do repórter com o texto – a narrativa do náufrago traz indicações pontuais de local, data e hora dos acontecimentos, além de reproduzir a versão oficial do acidente divulgada pela marinha. Como Truman Capote fizera na exaustiva pesquisa para A Sangue Frio (ele jurava ter feito investigações em mais de 8 mil páginas ), García Márquez não despreza nenhuma informação e dialoga com a exatidão obsessiva.

Curiosamente, o escritor publicara, dias antes, uma crítica de A Nave da Revolta, filme que teria um papel marcante na descrição do náufrago Luiz Alejandro Velasco ao estimular o jogo duplo de ficção e realidade, sem que o leitor descubra realmente os limites de cada um.

A coleção de cinco volumes que a editora Record lança nos próximos dias conta ainda, como terceiro volume, com Da Europa e da América, que enfoca o período (1955-1960) em que García Márquez atuou como correspondente internacional, quando presenciou na Europa uma fase de intensas experiências políticas e dinamismo ideológico. Para os críticos, trata-se da experiência de maturação cultural, criativa e estilística do autor colombiano.

O quarto volume, Reportagens Políticas, traz 28 trabalhos escritos entre 1974 e 1995 e que compõem um mosaico de duas décadas da história contemporânea. Aqui, Gabo oferece sua visão da queda de Salvador Allende, da passagem de Che Guevara pelo Congo, além de relembrar a Angola revolucionária dos anos 1970 e de comentar sobre a morte do papa João Paulo I.

O último volume, Crônicas, traz textos mais intimistas, publicados entre 1961 e 1984. Livros, filmes, cidades visitadas, denúncias, recordações, medos confessáveis (como o de aviões) são motivo para uma escrita ágil combinada com um olhar perspicaz.’



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Trechos de cada volume

‘TEXTOS CARIBENHOS: ‘Frances Drake é uma respeitável dama norte-americana que mantém uma minuciosa e diária correspondência com os astros. Noite após noite, sem vassoura nem fórmulas apocalípticas, esta bruxa moderna vai ao terraço de sua casa em Hollywood para receber os desinteressados e eficazes conselhos que, por seu intermédio, enviam-nos os sereníssimos e silenciosos corpos siderais.’ (Maio de 1948)

TEXTOS ANDINOS: ‘Na segunda-feira, 12 de julho, um pouco antes das sete horas, os meninos Jorge Alirio e Licirio Caro, de 11 e oito anos, saíram para cortar lenha. Era um trabalho que realizavam três vezes por semana, com um pequeno facão de cabo de osso, gasto pelo uso, depois de tomarem café em companhia do pai, o areeiro Guillermo Caro Gallego, de 45 anos. Viviam com a mãe e outros quatro irmãos em uma casa localizada junto à quebrada de El Espadero, que se desbarranca a sete quilômetros de Medellín pela estrada de Rionegro. Naquele dia, porém, Jorge Alirio e Licirio não tomaram café com o pai, pois este saiu mais cedo que de costume (…) Não se haviam afastado um quilômetro de casa, quando Jorge Alirio ouviu um ruído, ‘como uns cavalos’, e viu que na base da montanha rolava um pequeno alude em direção à casa dos pais.’ (Balanço e Reconstituição da Catástrofe de Antióquia)

DA EUROPA E DA AMÉRICA: ‘Onde há um rico e há um pobre, há sempre um bom filme’, disse Cesare Zavattini, um dos três grandes do cinema italiano. De acordo com esse critério, no Lido de Veneza e especialmente aos domingos, há nas praias mil bons argumentos para mil filmes bons, melhores do que os projetados no Palácio do Cinema.’ (Um Tremendo Dram de Ricos e Pobres, setembro de 1955)

REPORTAGENS POLÍTICAS: ‘A CIA tem microfones ocultos em muitos hotéis da América Latina graças à cumplicidade dos proprietários. Escuta em seus próprios escritórios as conversas dos políticos de esquerda, graças à cumplicidade dos serviços locais de inteligência que, além disso, enviam para elas as listas diárias de viajantes ao exterior e as carteiras de identidade de qualquer cidadão.’ (Entrevista com Philip Agee)

CRÔNICAS: ‘Foi uma vitória mundial da poesia. Num século em que os vencedores sempre são os que batem mais forte, os que conseguem mais votos (…), é alentadora a comoção provocada pela morte de um homem que dedicou a vida a cantar o amor.’ (Sobre a morte de John Lennon)’



MERCADO EDITORIAL
Roberta Pennafort

Brasil, Portugal e Angola se juntam para formar editora

‘Uma portuguesa, uma brasileira e um angolano se uniram para montar a primeira editora do País voltada exclusivamente a obras escritas em português. A proposta da Língua Geral, cujo lançamento oficial será na terça, na Casa de Cultura Laura Alvim, no Rio, é promover o intercâmbio entre autores lusófonos e mostrar particularidades da literatura dos países que compartilham conosco o idioma.

A iniciativa partiu da produtora cultural portuguesa Conceição Lopes, radicada na cidade desde 1980. Ela logo conseguiu o apoio da empresária brasileira Fátima Otero, a quem já conhecia, e do escritor angolano José Eduardo Agualusa, com quem se encontrou na edição da Feira Literária Internacional de Parati (Flip) de 2004.

‘A ligação Brasil-Portugal-África é forte em mim. Sempre achei que faltava fazer a conexão’, diz Conceição, gerente geral da editora. ‘Nasci em Portugal e lembro de ver angolanos e moçambicanos voltando para lá, depois da entrega das colônias, na década de 70. Eram os ‘retornados’. Anos depois, vim para o Brasil e me apaixonei.’

As primeiras coleções lançadas pela Língua Geral serão: Ponta-de-lança, que revelará autores brasileiros (começando com Ronaldo Cagiano e Christiane Tassis) e portugueses (Faíza Hayat e Patrícia Reis), e a Mama África, que publicará dois angolanos (Zetho Cunha Gonçalves e o próprio José Eduardo Agualusa) e dois moçambicanos (Nelson Saúte e Mia Couto). Esta tem como público crianças e adolescentes e é ilustrada por artistas africanos.

Conceição lembra que são poucos os brasileiros lidos em Portugal (assim como acontece a africanos e portugueses no Brasil). A exceção é Paulo Coelho, claro, fenômeno mundial. ‘Os africanos são mais bem aceitos em Portugal do que os brasileiros’, conta a produtora, que tem feito contato com editores de seu País para tratar da possibilidade de futuros lançamentos de brasileiros e africanos. Ela já sonha com um encontro misturando diferentes sotaques da língua portuguesa, em sua terra natal. Está acertado, para o ano que vem, a publicação de títulos das duas coleções por lá.’



INTERNET
O Estado de S. Paulo

Google é multado pela Justiça de Minas

‘O Tribunal de Justiça de Minas fixou, anteontem, multa diária de R$ 5 mil para o Google, controlador do Orkut, por descumprimento de ordem judicial. No dia 17, a Justiça determinou a exclusão de um perfil falso do Orkut e a quebra do sigilo do responsável pela página. A vítima, uma empresária, teve seus dados copiados na página falsa, cuja suposta autora se dizia homossexual.’



TELEVISÃO
Keila Jimenez

Elis marca fim de ano na Globo

‘Quem disse que só de Roberto Carlos e Xuxa vivem os especiais de fim de ano da Globo? A emissora já começou a gravar seu pacotão de atrações comemorativas e até há novidades este ano.

Entre elas está Por Toda a Minha Vida, especial sobre Elis Regina. Dirigida por Ricardo Waddington, a atração vai misturar dramaturgia, depoimentos de familiares e amigos da cantora, além de uma parte musical.

O especial faz uma espécie de retrospectiva da vida e da carreira de Elis e já está em produção. A Globo estuda a possibilidade de mesclar ainda no programa um show com grandes cantores interpretando sucessos de Elis.

OUTRA CENA

Protagonizado por Bruno Gagliasso, Dom, de Ronaldo dos Santos, traz os dramas e dilemas de um jovem paranormal que tenta mostrar a relação entre a ciência e o imponderável. Além de Gagliasso, integram o elenco Zezé Polessa (mãe), Werner Schünemann (pai), Luigi Barricelli e Fernanda Paes Leme (irmãos). A mocinha da história será interpretada por Camila Rodrigues. O programa começa a ser produzido em novembro.

Outro especial, criação de Márcio Trigo, é o infantil Os Cara-de-Pau, que começou a ser gravado este mês. A atração de auditório mistura reportagens com brincadeiras e será comandada pela dupla Marcius Melhen e Leandro Hassun, devendo ir ao ar em cinco domingos consecutivos, a partir de 10 de dezembro.

Há ainda o conto de Natal Papai Noel Existe, de Renato Modesto, também a ser gravado em novembro. E Lu É Luana, especial de Luana Piovani com direção de José Lavigne. Sob o contexto de um réveillon, a personagem de Luana se meterá nas maiores confusões ao lado de três bonitões. Marcello Antony está no elenco.

Engomadinho da vez

É assim, vestido de corsário que Felipe Camargo aparecerá em Paixões Proibidas, nova novela da Band. Ao lado de Michel Bercovitch o ator gravou cena na semana passada na Casa do Cônsul de Portugal, no bairro de Botafogo, no Rio.

Entre- linhas

Disposta a montar um grande banco de elenco, a Record agora está no encalço dos atores que acabaram de fazer Cristal no SBT. Bianca Castanho e Marisol Ribeiro estão entre as cobiças da TV de Edir Macedo.

Bandeirantes e Gazeta interrompem a programação normal amanhã para falar de eleições. A RedeTV! faz um balanço às 22 h. SBT vai de flashes e a Globo, além de dois boletins Globo Notícia, promete um saldão de todo o País no Fantástico.

A cobertura do voto na Band será encerrada por um Canal Livre à meia-noite.’

Aluízio Falcão

Os novos filhos da pátria armada

‘Vimos, no começo do mês, imagens de militares adentrando a selva amazônica e procurando resgatar 157 corpos das vítimas de uma tragédia aérea. Cumpriram admiravelmente sua tarefa e com isso também resgataram a simpatia dos brasileiros pelas forças armadas.

Os jovens oficiais envolvidos na operação não se queixavam do seu árduo e quase impossível trabalho. Visivelmente solidários, fundiam a sua dor com a dor das famílias enlutadas. As cenas contrastaram, dramaticamente, com as protagonizadas por outros militares, em outros tempos, quando eles prendiam, torturavam e matavam civis rebelados contra a ditadura em sua fase mais cruel. Do lado de fora dos porões, choravam famílias em desespero, a começar pelas viúvas, as Marias e Clarices do samba imortal de João e Aldir.

Durante as buscas das vítimas no desastre, vi no Jornal Nacional um jovem capitão, exausto e tresnoitado, afirmando que não descansaria o espírito enquanto corpos permanecessem na mata. Cada um dos mortos, disse ele, teria um túmulo a ser visitado pelos parentes. Orgulhei-me do Exército e da Força Aérea que mantenho com meus impostos. Não pude, claro, esquecer outras vítimas sumidas para sempre, os presos políticos assassinados nas masmorras do arbítrio. Mas registro aqui a devida estima aos filhos da pátria armada, restauradores da imagem de suas corporações. Imagem manchada por antepassados que agiam de forma oposta, humilhando e ofendendo compatriotas indefesos. Os militares de hoje, os profissionais, nada têm com os crimes pretéritos. Eram crianças, nos terríveis anos 70, quando a ‘tigrada’ pisava o chão dos quartéis com as botas manchadas de sangue.

Vamos refletir, que é sempre útil, enquanto podemos colaborar, embora humildemente, para a memória política do Brasil. O nível de profissionalização das forças armadas, de acordo com Samuel Huntington, é o elemento mais relevante para dissuadir militares da intervenção na hierarquia do poder. O seu compromisso é com a vida cívica, uma dimensão diferente, que envolve o cumprimento de deveres estabelecidos na Carta Magna, um deles o de obediência ao seu comandante em chefe, o civil que preside a República. Dentre todas as obrigações, a mais edificante é a de servir aos cidadãos quando atingidos por traumas e sofrimentos. Tanto mais ampla seja a profissionalização de oficiais e soldados, menor será a sua tentação de intervir no curso de acontecimentos já mediados pelos três poderes constituídos.

O que temos visto na tevê brasileira? Pára-quedistas pousando em florestas inacessíveis; grupos fardados reconstruindo pontes danificadas por inundações ou abrindo novas rodovias; e batalhões patrulhando ruas de grandes metrópoles em ocasiões de risco à segurança pública – eis alguns exemplos que engrandecem os militares do País tanto quanto a sua digna participação na 2.ª Guerra Mundial, em defesa da liberdade.

Rubem Braga, Egydio Squeff e Joel Silveira, repórteres que cobriram as ações da FEB na Itália, nos deram testemunhos valiosos para o conhecimento do generoso perfil humano dos nossos oficiais, sargentos e pracinhas nas frentes de combate. Nestes dias que correm, o Exército deveria motivar seus recrutas a ler aquelas reportagens, já reunidas em livros. Assim eles teriam uma idéia da instituição a que servem obrigatoriamente durante um ano de sua juventude. A leitura valeria muito mais do que preleções e ordens-do-dia recheadas de um patriotismo de soneto, artificial e pobre de conteúdo.

As famílias hoje recebem a solidariedade militar nas ocasiões de tragédia iminente ou consumada. Nos tempos de chumbo, peregrinavam inutilmente pelos quartéis em busca de informações que não vinham e, quando vinham, eram inquietadoras. Às vezes prisioneiros conseguiam fazer chegar aos seus parentes cartas clandestinas que denunciavam os seus terríveis padecimentos. O escritor Marco Antonio Tavares Coelho, por exemplo, em seu livro Herança de um Sonho, mesmo adotando linguagem sóbria e sem lamúria, transcreve cartas para a sua mulher, que resumem o horror daqueles tempos nas celas de martírio. Abaixo, alguns trechos aqui reunidos para um rápido entendimento do leitor de jornal:

(…) ‘Nem água, nem pão. Nem um urinol. É uma câmara de execução em que só se pensa na morte’. (…) ‘Cinco vezes colocaram-me no ‘pau-de-arara’; horas longas de ‘choques’; cauterizadores queimando partes mais sensíveis do corpo. Mas, antes, exigiram que eu colocasse o capuz e uma espécie de quimono de judô, de brim forte. Razão dessa ‘roupa’: por ela me seguravam para jogar-me com mais força nas paredes de cimento; nu era mais difícil, pois o corpo escorregava das mãos deles, porque vivia molhado pelo suor. De todos lados recebia murros e pontapés.’ (…) ‘Minha sorte é que eles também cansavam. Uma vez disseram-me: ‘Seu filho da puta: (esse é o tratamento protocolar) você está apanhando há quatro horas, mas logo continuaremos.’ (…) ‘Nestes intervalos para ‘descanso’ eu não dormia, penso. Caía numa modorra ou desmaiava de dor, não sei bem.’

(…) ‘Como não havia nem um urinol na cela, urinei e defequei ali mesmo. Mas, como rolava pelo chão e a escuridão era absoluta, fiquei lambuzado, da cabeça aos pés.’ (…) ‘Retiraram o capuz e vi-me colocado diante da figura mais sádica dos sádicos do DOI – o ‘doutor Homero de Souza’. Esse nome é evidentemente falso. O ‘doutor’ corre também por conta do disfarce. Na verdade, é oficial do Exército. Fisicamente forte, só fala com ódio e de seus olhos injetados expele raiva.’

Aí estão provas do que Hannah Arendt escreveu sobre o totalitarismo como forma de tornar o indivíduo estranho ao mundo, privando-o até do seu próprio eu. Sabemos que em seus diversos formatos, todo Estado autoritário se apóia no estamento armado ou tem dele uma adesão tácita. O aspecto mais odioso do autoritarismo é o controle que pretende exercer do cotidiano de cada cidadão e, o que é ainda mais execrável, de suas mentes. Esta segunda intenção mostra-se menos viável, pois é da vida interior dos homens e mulheres, em todas as épocas, que brotam a subversão, a rebeldia e a dissidência capazes de remover os tiranos.

No Brasil, felizmente, não há mais torturadores e torturados. É bom ver as forças armadas constituídas por uma geração emergente na democracia e profissionalizada em todos os escalões. Estes batalhões solidários que aparecem na tevê redimem a Aeronáutica, o Exército e a Marinha daquilo que o historiador Élio Gaspari chamou de ‘o maior desastre de sua história’. Um desastre, sim, porque institucionalizou a tortura como prática militar e deixou claro, perante a história, que os generais não souberam governar.

Os quatro volumes da reveladora tetralogia de Gaspari (As Ilusões Armadas) também deveriam ser lidos por todos os oficiais, em todos os quartéis. Eles veriam que o autor reconstrói, passo a passo, o monumental desacerto dos militares quando usurparam o poder dos civis. A plena consciência deste erro consolidaria mais ainda o perfil democrático e humanitário das forças armadas que recebem, merecidamente, o aplauso e o respeito do povo brasileiro.’



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