Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O trabalho precário

A esperta decisão do STF a favor dos grandes meios de comunicação e dos espaços de poder deste país, de negar a necessidade de diploma para o exercício da profissão de jornalista, já está gerando seus frutos. E o resultado é a precariedade cada vez maior da condição de trabalho destes profissionais. A prefeitura de João Pessoa, na Paraíba, por exemplo, abriu edital para a contração de jornalista e oferece o salário de 510,00 reais, com uma carga horária de 40 horas. Exige apenas ensino médio e o registro no Ministério do Trabalho.

Outros meios de comunicação, nos grandes centros metropolitanos do país, não são tão explícitos. Oferecem cargos como escritor para web, produtor de conteúdo, assistente de produtor de conteúdo e outros afins, com salários de miséria. Na verdade, todos eles cumprem a função do jornalista que é a de colher informações e formatá-las dentro de um padrão noticioso. Com isso, vai pelo ralo a possibilidade de uma boa qualidade na divulgação da informação, uma vez que o jornalismo é um fazer que exige conhecimento, não só da técnica redacional, mas também do mundo. Não bastasse isso, e é o que é mais preocupante, percebe-se a precarização cada vez maior das condições de trabalho do profissional.

Consciência de classe

Quando um ‘produtor de conteúdo’ é contratado, ele acaba tendo de se enfrentar todos os dias com o corre-corre da notícia, com o estresse da criação intelectual, com a necessidade de checagem e rechecagem das informações, com o desafio de ouvir as várias versões do fato. Enfim, todas as fases de uma boa produção jornalística. Mas, no seu contracheque, todo esse esforço não tem amparo, uma vez que os salários são bem menores e as condições de trabalho as piores possíveis. A isso se soma a exigência da multifunção, com a qual o profissional tem de debater-se, fotografando, editando, dirigindo, filmando etc… Assim, a empresa, com as benesses do STF, acaba ‘ganhando’ cinco profissionais ou mais, enquanto paga – mal e porcamente – apenas um.

Não é sem razão que cresce o movimento nos sindicatos de jornalistas para a organização destes trabalhadores que hoje integram o mercado de trabalho do mundo jornalístico como mão-de-obra barata, num processo crescente de superexploração, típico das sociedades capitalistas periféricas.

Embora a Fenaj tenha definido, no último encontro do Conselho de Representantes, manter as portas fechadas para estes trabalhadores, outros sindicatos acreditam que este é um momento de se pensar a partir da consciência de classe, acolhendo os companheiros e companheiras que estão entrando neste mercado premidos pela necessidade de trabalhar. É função de um sindicato estar de olhos abertos para o seu tempo e ser capaz de compreender que a luta não deve ser contra os trabalhadores, e sim, contra os patrões e interesses do poder.

Condições de trabalho dignas

Acolher os trabalhadores sem diploma nos sindicatos de jornalistas não significa trair a categoria, não significa jogar a toalha, não significa render-se aos desígnios de um tribunal que julga com os olhos e mãos no poder. Não! Acolher estes colegas – equivocados na compreensão do que seja o jornalismo – é fazer um movimento tático de fortalecimento da luta de classes. Na briga do rochedo com o mar, o marisco não deve ser entregue a própria sorte. Ele tem de ser aliado e companheiro.

Os jornalistas, sempre tão alheios ao que diz respeito à luta de classes, às batalhas dos trabalhadores, precisam acordar. Cada dia mais a profissão é aviltada, o fazer jornalístico é relegado a uma mera informação sem contexto, as condições de trabalho se enfraquecem e empurram à competição desenfreada e o salário desaba enquanto as obrigações aumentam. Nós, jornalistas, estamos colocados numa hora histórica. Ou nos fechamos num gueto, ou entramos na luta pela recuperação do bom e velho jornalismo, aquele que informa e forma, o que contextualiza, o que oferece várias versões, o que interpreta a realidade. Para isso, precisamos abrir nosso coração e nossas portas aos colegas que entram na profissão pelas laterais, sem formação.

O que está em jogo aqui não é o ego nem a condição de ter ‘estudo formal’. O que deveria nos mover era a consciência de classe, numa luta única de condições de trabalho dignas dentro de um sistema que só busca explorar.

Guerra entre trabalhadores?

Por conta disso, o Sindicato dos Jornalistas de Santa Catarina vai discutir esse tema no dia 10 de abril, às 9h, no mini-auditório da Fecesc. Porque é preciso abrir os olhos, concretizar a solidariedade de classe. O que não significa que a luta pela obrigatoriedade do diploma tenha se acabado. Pelo contrário. Cada dia, neste mundo de exploração capitalista, fica mais claro que só a regulamentação bem demarcada pode por freio a ganância patronal. A luta pelo diploma é uma luta corporativa, não há que negar. Mas, se os patrões são corporativos, se as empresas o são, se os governantes são corporativos, porque aos trabalhadores isso soa como algo ruim? Ser corporativo é fazer parte de um corpo, é defendê-lo de todas as ameaças, é atuar juntos. Isso é o que temos de fazer.

E, se hoje o STF nos impõe uma derrota, nada nos impede de virar isso contra o poder instituído. Juntar os jornalistas e todos estes que agora entram no mercado de trabalho jornalístico como párias, mal pagos e superexplorados, pode ser o nosso golpe de mestre. Ou trazemos essa gente para lutar com a gente ou eles se organizam pela direita, como já se vê acontecendo, e ainda fazem a guerra contra nós. Eu não quero guerra entre trabalhadores. Eu quero consciência de classe e luta contra o sistema capitalista opressor e explorador.

E tu, que queres?

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Jornalista