Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Pela neutralidade e igualdade na internet

Na internet, quando envio meus uns e zeros para algum lugar, eles não deveriam ter de esperar na fila atrás dos uns e zeros de pessoas ou corporações abonadas. Esse é o modo como a internet foi planejada, e é fundamental para um conceito chamado ‘neutralidade da rede’, que garante que os provedores de serviços de internet não podem escolher favoritos.

Recentemente, grandes empresas de telecomunicações defenderam que seu investimento na infraestrutura da rede deveria lhes dar mais controle sobre como ela é usada. Os nerds estão em pé de guerra e tem havido um longo e ruidoso debate público durante o qual a Comissão Federal de Comunicações (CFC) pareceu desenvolver um plano para preservar a neutralidade na web.

A ação mais recente da CFC sobre o tema veio parcialmente em resposta à decisão de um tribunal federal de recursos em abril que parecia limitar a autoridade da agência sobre os provedores de serviços de internet. Em maio, o presidente da CFC, Julius Genachowski, divulgou um plano para classificar a internet no Título 2.º da Lei das Comunicações de 1934. Isso significa que a agência estaria reconhecendo legalmente um fato tão óbvio que me sinto estúpido ao digitá-lo: usamos a internet para nos comunicar. Com essa noção radical estabelecida, a CFC teria jurisdição para proteger o interesse público na rede, incluindo a garantia de neutralidade. Mas, desde o anúncio da sua intenção, a CFC não deu continuidade e as corporações envolvidas estão procurando assumir as rédeas antes que os funcionários públicos o façam.

A primeira investida, no início do mês, foi uma proposta do Google e da Verizon. A parte que eles gostariam que notássemos, e a parte que me empolgou, é onde dizem que não deveriam ter prioridade para a transmissão de conteúdo na internet, o que significa que todos os dados legais deveriam ser tratados do mesmo modo. Oh, Google-Verizon! Nós, os cidadãos amantes da liberdade da internet não poderíamos estar mais de acordo.

Grana esperta

Infelizmente, algumas partes da proposta contradizem radicalmente o nobre princípio delineado acima. Primeiro, Google e Verizon gostariam de excetuar disso a internet sem fio, o que nos leva a pensar se eles nos acham tão estúpidos assim. Todo o mundo já ouviu que o futuro da web será sem fio. Nós já entramos fundo na era iPad/BlackBerry/Android, e não há caminho de volta. Assim, limitar a igualdade e o jogo limpo para o território cabeado seria meio como uma legislação sobre direitos civis que tratasse da ocupação de assentos em ônibus, mas excetuasse escolas, locais de trabalho e cabines de votação.

Segundo, as companhias caíram numa ideia bizarra para o que parece uma ‘pista rápida’ hipotética separada da internet ‘pública’. Empresas graúdas poderiam conseguir acesso a esse serviço separado, garantindo transmissão mais rápida dos uns e zeros corporativos.

Passei uma década trabalhando com a indústria fonográfica, um setor em que as grandes excluem todo o resto. Criatividade e inovação ficam muito atrás do dinheiro em importância e todos perdem, até as grandes. Elas se isolaram da mudança por tanto tempo que cavaram seu túmulo.

Na condição tanto de músico quanto de aficionado por música, sempre quis ver as ideias musicais melhores e mais empolgantes subirem ao topo. Mas todos nós conhecemos a história do negócio musical: o sucesso é mais frequentemente comprado que conquistado. O dinheiro esperto procura riscos baixos, de modo que a música mais segura, mais insossa atrai mais investimentos, e somente a música mais segura, mais insossa chega às ondas aéreas e às prateleiras do Wal-Mart.

Responsabilidade gigante

A música é subjetiva, claro, por isso os leitores não precisam concordar com minha afirmação sobre o que é inovador e o que é lixo.

Mas com os negócios não é assim e a última década da indústria musical é um claro exemplo do que pode ocorrer quando a profundidade dos bolsos e não a qualidade das ideias é a medida do sucesso. Agora que as grandes gravadoras se tornaram obsoletas, bandas como a minha podem se dar melhor sem a sua ajuda do que com ela.

A lição é que clubes de privilegiados não nutrem as melhores ideias, que são o motivo mesmo dos mercados: a competição deve supostamente manter todo o mundo alerta. Claro, é um estorvo que o rádio toque essa música ruim, mas isso não fará nossa economia sucumbir. Mas podem imaginar o que ocorreria se deixássemos o mesmo acontecer com as próprias ideias? A internet é o mercado mais puro para ideias que o mundo jamais viu, e o poder espantoso desse campo de jogo nivelado revolucionou tudo.

O Google sabe disso melhor que ninguém. Ele começou numa garagem e se tornou um líder industrial por ter grandes ideias e não montanhas de dinheiro. Mas, agora que a internet já existe há tempo suficiente para ter desenvolvido seus próprios gigantes, precisamos garantir que eles não arruínem o que é grande na tecnologia que os produziu.

Seguir com os planos

Precisamos garantir que eles não esmaguem a indústria de ideias como os gigantes musicais esmagaram o setor musical. Espero que o Google continue fazendo sucesso (sério, sou um acionista), mas este deve ser pelo poder de suas ideias e não por seu poder de desnivelar o campo de jogo.

A declaração de Google e Verizon, que foi amplamente criticada ao ser divulgada, provavelmente não é a única proposta que veremos dessa gente graúda. A boa nova é que a administração Obama tem prometido repetidas vezes que apoia a neutralidade na rede. Neste momento, a FCC pode proteger duradouramente a liberdade e a igualdade na internet.

O que precisamos agora é que o presidente da CFC se junte a seus cinco comissários e dê andamento aos planos que estabeleceu há muitos meses. Sr. Genachowski, nós, cidadãos da internet, estamos com o senhor.

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Cantor da banda OK Go