Eis uma pergunta difícil.
O historiador e filósofo francês Marcel Gauchet, entrevistado neste mês pelo jornal Le Monde, tenta uma interpretação. Para ele, a imprensa diária atravessa um momento crucial de definição de objetivos, de público, de conteúdo. Mas, passado o tremor de terra, o nível de exigência em relação à mídia impressa será mais elevado.
Talvez isso seja o que em inglês se chama um wishful thinking. Talvez Gauchet tenha razão. Ele pensa que a internet não transforma qualquer pessoa em jornalista e ‘o que se pede ao jornalista é a interpretação, o recuo, isto é, história e geografia’, tarefa para profissionais de alto nível com um texto competente. Gauchet é um intelectual para quem a leitura do jornal é a prece da manhã, de meio dia e da noite.
Para o filósofo, a tão proclamada crise da imprensa escrita é sobretudo um mal entendido entre ‘um leitor à procura de um conteúdo que não lhe é oferecido e do outro lado uma imprensa que procura um público que não existe’.
Os jornais que diminuem o tamanho das matérias, privilegiam as histórias vividas e privam o leitor de uma análise de jornalistas competentes cometem um suicídio, segundo Gauchet.
Perdas e danos
Em fevereiro foram divulgados os números de vendas da imprensa cotidiana francesa no ano passado e o resultado não é nada brilhante, comparado ao ano anterior. Dos grandes jornais, somente o quarto e o sexto mais lidos (Aujourd’hui en France e Les Echos), tiveram crescimento (de 1,50% e 1,62% respectivamente). Le Figaro, L’Equipe e Le Monde, os três mais lidos (nessa ordem) perderam 2,29%, 3,63% e 5,15% de leitores. O quinto jornal mais lido do país, o irreverente e sempre surpreendente Libération, perdeu 6,80% em relação a 2007.
Mas esses números que parecem objetivos não devem impressionar demais nem os jornalistas nem os patrões. O diretor do Office de Justification de la Diffusion (OJD) – equivalente do nosso Instituto de verificação de circulação –, Patrick Bartement, lembra numa reportagem sobre a erosão da imprensa escrita, publicada também neste mês, que o ano de 2007 foi atípico, pois as vendas foram engordadas pelo ‘efeito Sarkozy’: primeiramente com a eleição, em maio, depois com o novo estilo extrovertido do novo presidente. Sarkozy vendia jornal.
Segundo Bartement, o correto seria comparar 2008 a 2006 e, nesse caso, não há números catastróficos. O Le Monde cai 3,76%, o Libération cai 3,40% e o Figaro perde 0,77%.
Os números oficiais do OJD apontam uma tiragem média diária que coloca o jornal de direita Le Figaro, em primeiro lugar, com uma pequena vantagem em relação ao segundo e ao terceiro colocados: Le Figaro, 320 mil exemplares; L’Equipe, 311 mil exemplares; Le Monde, 300 mil exemplares; Aujourd’hui en France, 190 mil exemplares e Libération, 123 mil exemplares.
Dentro de um panorama de perdas e danos, o sexto diário mais vendido da França, o jornal de economia Les Echos, teve um crescimento de 1,62% no ano passado. Jean-Marie Charon, sociólogo especializado em mídia, analisa esse resultado atípico: ‘A imprensa econômica pode ter se beneficiado com a crise de 2008, pois o grande público tinha necessidade de entender o que se passava’.
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Jornalista