Todas as pessoas de uma mesma comunidade partilham valores, normas de comportamento, idéias e atitudes em comum que tornam possível a convivência em sociedade. Dá-se o nome a essa faculdade de consciência coletiva. Ampliar essa consciência não é tarefa fácil. Campanhas governamentais de combate à dengue, por exemplo, visam, muitas vezes sem sucesso, a ‘conscientizar’ cidadãos sobre os riscos de não se tomar atitudes que dificultem a proliferação do mosquito.
Realmente, não é fácil mudar a consciência cristalizada de uma população que pouco lê e tem enormes dificuldades de acesso aos bens culturais. Assim, cabe ressaltar o papel da internet na transformação dessa mentalidade coletiva e, ao mesmo tempo, destacar o quão ameaçadora essa transformação pode vir a se tornar para aqueles que se perpetuam no poder ancorados na ignorância das pessoas.
É importante destacar que o mundo virtual foi, inicialmente, uma criação com objetivos militares originária da Guerra Fria. A ideia de rede descentralizada visava justamente a impedir que um ‘centro’ fosse atacado e fosse destruído, assim, todo o sistema de comunicação dos EUA. A rede se popularizou pelo mundo bem depois, basicamente pela facilidade de acesso e manuseio e pelo fato de que a maioria dos procedimentos são gratuitos.
A expulsão do hacker
Qualquer pessoa com mais de 40 anos duvidaria que, há 20 anos, o computador se tornasse um objeto tão essencial à vida de grande parte das pessoas como a televisão o é. A possibilidade de interação e de troca de informação é tamanha que muitos reclamam de uma avalanche de dados impossíveis de serem lidos. Apesar disso, após 10 anos de popularização da ferramenta, um filtro parece que está sendo criado pelos internautas, eliminando o que não presta e absorvendo o que realmente interessa para suas vidas.
Conscientizar pessoas, ao contrário da televisão, que aliena, parece ser um dos papéis importantes que a internet está tendo neste começo de década. Exemplos expressivos dessa mudança ou ampliação da consciência coletiva são os movimentos políticos on-line. Hoje, há mobilização para tudo e, o melhor dessa história, é que estão funcionando. Veja o exemplo da comunidade e blog ‘Rouba mas faz, nunca mais’. Formado por pessoas de todos os segmentos sociais, esse movimento está incomodando muita gente desinteressada por mudanças, grupo esse formado basicamente por políticos.
No sábado (22/5), o blog foi atacado com uma tentativa de tirá-lo de circulação. Mas a internet é descentralizada – não há dono, nem central de controle. Destruindo um blog, cria-se outro. O blog não foi tirado do ar também porque o grupo é formado por gente de todos os segmentos da sociedade e quando o grupo é heterogêneo assim, pertencem a ele desde advogados até porteiros, de jornalistas a guardas noturnos, de empresários até garis. E, obviamente, havia muitos, mas muitos técnicos de informática que voluntariamente expulsaram aquele hacker mandado por político ladrão.
Além da submissão e complacência
Não é à toa que a China censura a internet. Não pensem que a medida visa a proibir os chineses de verem sites pornográficos, por exemplo, ou de proibi-los de verem os shows de Madonna pela internet. A medida visa justamente a proibir o povo de pensar! De mudar ou de transformar a realidade que o governo de Pequim quer manter intacta.
No Brasil, para o bem, a coisa tem sido diferente. O povo, através da internet, tem-se mobilizado silenciosamente. Congressistas são pressionados a votar por aquilo que a população deseja. Poucos percebem as lentas transformações sociais vindas a partir desse recurso tecnológico. No entanto, à medida que os equipamentos são barateados, mais gente vai ter acesso a informações, ampliando a consciência coletiva e agregando outros valores que não aqueles da submissão e da complacência com os desmandos dos políticos apavorados por mudanças.
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Jornalista, Salvador, BA