Cansada de se emocionar, orgulhosa da onda de solidariedade que despertou, a mídia começou a caça aos culpados: é preciso sentar no banco dos réus os responsáveis pelos mais de 600 mortos na catástrofe fluminense.
Na sexta-feira (14/1), a Folha de S.Paulo destacou no alto da sua primeira página uma acusação aos fenômenos cíclicos: ‘La Niña explica as inundações no globo, dizem estudos’. A matéria publicada na edição nacional (que circula no Rio) era categórica: a irmã do El Niño provocaria fortes chuvas na América do Sul durante o primeiro semestre e por isto foi acionado um alerta à Cruz Vermelha Internacional para se preparar para tragédias iminentes.
O editor de plantão certamente avaliou que a notícia era alarmista – e na edição paulistana, rodada em seguida, amenizou o texto. Mas manteve a chamada na capa e também o título da matéria da página C-19 (‘Chuvas na Austrália, Venezuela e Paquistão têm origem comum’. Por precaução, acrescentou em subtítulo: ‘La Niña, porém, não tem relação com as enchentes brasileiras’.
Sistema de prevenção
Assim, na primeira página de um dos jornais mais importantes do país, o leitor é alertado para a possibilidade de que La Niña seja a causadora da tromba d’água que desabou sobre a região serrana do Rio e, páginas depois, para acalmá-lo, lhe dizem exatamente o contrário.
O mais grave, porém, é que as suspeitas sobre La Niña parecem rigorosamente justificadas: uma semana antes da enxurrada, o semanário The Economist (muito citado pelos colunistas do jornal) avisava que a ‘menina travessa’, irmã do El Niño, provocaria fortes chuvas até o meio deste ano e que ela teria sido a responsável pelos dilúvios na Austrália e Venezuela (ver ‘Tough little girl‘).
Se a Folha tivesse levado a sério o alerta emitido pela revista com o aval do Instituto Internacional de Pesquisas Climáticas teria acionado com alguns dias de antecedência o sistema de prevenção do qual a mídia é peça fundamental.
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