COPA & POLÍTICA
Goal-gol, meta, 17:37 30/06/06
‘Palavra-chave das últimas três semanas, é hoje entendida como tento, acerto. Goal-gol, no entanto, é o objetivo a alcançar. Meta.
Goalkeeper, embora dicionarizada, é uma expressão desconhecida das jovens gerações, assim também o equivalente em vernáculo, guarda-metas. Impôs-se a palavra goleiro e, com isso, ficou fora de moda o esforço persistente e continuado em busca dos acertos.
Fazem-se gols, ganham-se partidas, torneios, copas e canecos mas perdeu-se o conceito de meta, marca que já existia nas corridas dos circos romanos, hoje em desuso graças ao desvario pelos triunfos imediatos.
Goal-gol, agora só interessa como consagração imediata e definitiva. O sucesso da Copa do Mundo tem a ver com o seu caráter compacto e suas metas comprimidas num curto e intenso período de tempo.
JK tinha um Plano de Metas, estabeleceu objetivos e, talvez por isso, tenha entrado para a história como presidente-goleador. Apesar da sua formação positivista, Getúlio Vargas, o Pai dos Pobres, caudilho clássico, perseguiu um programa retórico e vago. A herança dos seus 15 anos de governo é grande mas difusa. Cada um dos avanços que comandou embutia retrocessos, alguns deles ainda não remediados. Caso do sindicalismo comprometido pelo peleguismo.
Ao anunciar o Fome-Zero no discurso inaugural, o presidente Lula parecia ter envergado a camisa das metas, com isso ganhou a admiração mundial. A quimera custou a levantar vôo, foi enfiada dentro do Bolsa-Família e, agora, convertida em gazua eleitoral com o aumento de 1,8 milhão no número de beneficiados às vésperas do pleito de Outubro.
A empolgante meta de acabar com ‘tudo isso aí’ tão repetida na campanha de 2002 parece uma caricatura em 2006. Dos presidentes brasileiros desde a redemocratização de 85, o atual é o que melhor utilizou nossos vícios políticos e mais reforçou o arcaísmo das nossas instituições.
Lula é o único presidente da República que já foi multado por comportamento eleitoral indevido (em 2004) e, não contente, resolve confrontar abertamente, sem qualquer pudor, os pareceres do Tribunal Superior Eleitoral no tocante à propaganda eleitoral e o rigor da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Aquela meta de decência que Luis Inácio Lula da Silva anuncia há um quarto de século não se ajusta àquele mínimo de compostura que se exige de um primeiro mandatário quando disputa uma reeleição.
A fatal degradação da Câmara dos Deputados não aconteceu por acaso, nem é endógena. É fruto de um deliberado processo de emasculação e esmagamento acionado pelo Executivo. A maior parte do mandato do presidente Lula foi ocupado pela disputa escancarada entre José Dirceu e Aldo Rabelo para controlar a ‘Coordenação Política’.
Sob este nome pomposo escondia-se a meta — nada honrada — de comprar a Câmara Baixa. Literalmente. A divergência entre os dois políticos aliados era apenas metodológica: Dirceu queria pagar em espécie, através do mensalão. Rabelo, mais sutil, pretendia cooptá-la através de vantagens ‘indiretas’, como a compra de ambulâncias superfaturadas (operação agora cognominada de ‘sanguessuga’).
Metas resultam de programas e o governo não é o único desprovido de grandes objetivos. A oposição não lhe fica atrás em matéria de penúria conceitual. Enfrentam-se no varejo, disputam estatísticas quase sempre deletérias, incapazes de montar projetos diferenciados e promover debates consistentes.
A virada nas sondagens eleitorais anunciada nesta sexta-feira é circunstancial. Não foi Alckmin quem subiu, Lula é que começou a cansar. A escancarada demagogia começa a emitir evidentes sinais de fadiga. Como todas, em todas as épocas e quadrantes.
Goals-gols continuarão como o eixo do mundo por mais nove dias. A competição pelos tentos continuará a mobilizar as atenções. Mas a noção de metas está cada vez mais distante.’
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