Friday, 15 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Um dia, o hacker bate à porta

Na quarta-feira (4/5) faz duas semanas que usuários do PlayStation Network, a rede que interliga jogadores do console de videogames da Sony, está fora do ar. Não é um sistema pequeno: são 77 milhões de usuários. A promessa é de que tudo lentamente volte a funcionar nos próximos dias. Mas a queda, motivada por um ataque hacker, levanta muitas perguntas sobre privacidade e as conveniências de uma vida passada online.


A segurança da rede do PlayStation foi quebrada entre 17 e 19 de abril. Dados que incluem identidade, senhas e endereços dos 77 milhões de usuários foram levados pelos invasores. Embora eles tenham tido acesso também ao banco de dados com números de cartões de crédito, a empresa acredita que estejam seguros. Estavam encriptados. (Por que o resto não foi igualmente encriptado? É uma excelente pergunta que a Sony não conseguiu responder).


Foi a própria Sony que decidiu derrubar o sistema, no dia 20. Sem explicações claras. Descobriu que a falha explorada pelos hackers continuava lá e, aparentemente, deu trabalho resolver. Não envolvia só a rede de gamers. Também o Qriocity, sistema que vende música e filmes sob demanda nos EUA, Europa e Ásia, foi atingido. Ou seja: afeta uns tantos americanos com televisões modernas que já alugam filmes via internet.


Perda total


Há apenas uma semana, a discussão na tecnologia envolvia Apple, Google e os celulares que acompanham os passos de seus usuários. É desconfortável que empresas colham dados particulares da clientela sem deixar claro que isso ocorre.


Mas empresas deste porte têm ações na bolsa, estão sujeitas a processos, quando antipáticas demais perdem fregueses. O risco maior destes grandes bancos de dados é que a segurança não é perfeita. Outros, não sujeitos à moderação das leis do mercado ou do Estado de direito, às vezes conseguem botar as mãos em nossos dados. Foi o que ocorreu no caso da Sony.


O PlayStation Network é um dentre muitos exemplos da computação em nuvem. Este é o caminho que a internet está tomando. Se nos últimos anos o hábito foi de manter toda nossa informação em computadores pessoais, mudou. E não à toa. Nossa vida digital não se limita mais a computadores pessoais. Tem o computador de casa e o do trabalho. O celular inteligente. O tablet. Cada aparelho faz parte do cotidiano em momentos diferentes. E precisamos que todos estes aparelhos tenham acesso ao mesmo conjunto de dados. A solução é colocar tudo na internet.


Quem migrou para e-mail online, como Gmail ou Hotmail, está na nuvem. Quem usa Google Docs, idem. Parte da decadência da Microsoft, que vendia software, se explica pelo rumo da computação para a nuvem. As redes sociais todas só fazem sentido na nuvem. Rádios online, que começam a se popularizar? Nuvem.


Daí o risco duplo. Se temos informação demais em computadores alhures, precisamos confiar que a segurança é plena. Só que mesmo uma empresa do quilate da Sony, hoje, não é capaz de garantir tal segurança. Quando o pior acontece, sequer com transparência podemos contar. A Sony explica muito pouco. O segundo risco é na vida prática. Quando um serviço da nuvem sai do ar, perdemos tudo por completo. No caso, uma turma ficou sem jogar videogames. Mas poderia ser o e-mail, ou uma planilha. O impacto é grande.


Alternativa única


No início de abril, uma penca de servidores da Amazon.com ficou fora do ar, afetando vários serviços que incluem a rede social Foursquare. A Amazon também silenciou. Em janeiro, clientes americanos da telefônica AT&T que tinham iPads 3G também viram suas identidades violadas. O caso do PlayStation é maior, mas não isolado.


Na expressão da revista britânica The Economist, são as dores de crescimento da computação em nuvem. Maior estabilidade há de vir no futuro. Se a Justiça e os consumidores punirem como cabe, transparência também virá. Até lá, no entanto, a vida estará sujeita a turbulências, e a conclusão de sempre permanece inevitável. A engrenagem da internet não permite privacidade. A alternativa é sair da rede.

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Jornalista