A disputa diplomática em torno do fato de Julian Assange continuar refugiado na embaixada do Equador em Londres e a decisão de Quito de lhe conceder asilo diplomático têm implicações potencialmente profundas para o princípio da imunidade diplomática, a noção de que o espaço das embaixadas é “inviolável”, e para a diplomacia, de modo amplo.
Em meio a acusações de que o Reino Unido pode ter ido longe demais ao avisar ao Equador, antes do anúncio da concessão de asilo, que pode acabar por entrar na embaixada e deter Assange, a diplomacia britânica agora está numa sinuca de bico.
Londres vai querer evitar criar um precedente internacional que algum dia poderia ser usado contra uma de suas próprias missões.
O governo britânico enfrenta um dilema do qual não existe saída positiva. Como observou o ex-diplomata Oliver Miles, no London Review of Books, o governo britânico está igualmente ansioso em evitar criar o precedente oposto: deixar Assange permanecer como fugitivo dentro da missão equatoriana, desafiando um mandado de prisão europeu.
O ex-embaixador britânico em Moscou Tony Brenton disse à BBC ontem: “Acho que o Foreign Office se excedeu um pouco. Se vivemos em um mundo onde os governos podem revogar a imunidade de modo arbitrário e invadir embaixadas, então a vida de nossos diplomatas e a sua capacidade de trabalhar normalmente em lugares como Moscou, onde eu estive, e a Coreia do Norte, ficarão quase impossíveis”.
Recintos invioláveis
O caso já está tendo repercussões negativas no Reino Unido, em meio a alegações equivocadas dos equatorianos e outros de que a carta enviada pela embaixada britânica em Quito -e divulgada pelo Equador- contém a ameaça de “invadir” a embaixada.
Embora ela não faça isso, a carta de fato alude a uma “base legal” que o governo britânico crê que poderia usar para entrar no recinto.
A carta faz referência específica à Lei de 1987 sobre Recintos Diplomáticos e Consulares, que rege como os ministros devem tratar a designação de áreas diplomáticas.
A lei detalha de que maneira -mas não sob quais circunstâncias, exceto em questões de segurança pública e segurança nacional- o chanceler britânico poderia “des-reconhecer” uma missão.
O Equador já declarou que enxergaria tal ação como “hostil e intolerável”.
Mas o problema que torna a questão insolúvel se encontra na seção seguinte, na qual é dito que qualquer “des-reconhecimento” deve estar de acordo com a lei internacional -neste caso, a Convenção de Viena de 1961 sobre as relações diplomáticas.
Os diplomatas ficarão mais preocupados com o artigo 22 da convenção, que declara os recintos das embaixadas “invioláveis”.
Para Brenton, Londres vai querer evitar a qualquer custo entrar na embaixada.
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[Peter Beaumont, do Guardian, em Londres]