Os incidentes entre José Serra e repórteres multiplicam-se. O repórter brasileiro está entre os mais mansos. Mesmo quando suscita tema delicado, mantém-se distante, muito distante, dos modos incisivos dos repórteres americanos e europeus, que não admitem a função profissional condicionada a cuidados com ares hierárquicos, muito menos a ares intimidatórios.
José Serra conviveu bastante em jornal, no grupo de formulação de editoriais da Folha. Como político, pôde ver a maneira quase dócil do repórter brasileiro na abordagem e na relação funcional com políticos, empresários de porte e ocupantes de cargos de relevo em governo. Como frequentador de Redação, José Serra pôde ver que a transposição do trabalho dos repórteres no jornal depende do trabalho interno de edição. Este, sim, definidor dos realces, do tom, das localizações, do uso de fotos (e das legendas do tipo “Fulano segura um copo”, para a foto do fulano segurando um copo).
Apesar daquelas oportunidades de aprendizado e compreensão, José Serra mantém um clima hostil e intimidatório na proximidade de repórteres. Daí seguem-se agressões verbais em direção errada e às quais não falta um componente de covardia, dada a improbabilidade da resposta adequada.
Mas é indispensável reconhecer que os jornalistas não são alvos exclusivos da agressividade verbal de Serra. Sua prometida campanha na base de paz e amor é mensurável pela sucessão de artigos que cobram menos ataques pessoais e alguma abordagem de temas paulistanos. Nessa deformação da campanha Fernando Haddad tem sua cota de responsabilidade.
Disputa eleitoral
Se Haddad tem ideais a propor a São Paulo, não se justifica que adira à troca de agressões alheia à razão de ser de eleições. Não falta matéria-prima -na campanha, na política, na vida- para uns dois tarugos que deem resposta a Serra, e pronto. A partir disso, é olhar para o que interessa ao eleitor.
A tentativa de homicídio verbal é própria de campanhas eleitorais. Mas desde que seja em torno de posições quanto aos problemas preocupantes do eleitorado, desde que se dê motivada pelo confronto conservadorismo administrativo (predominante em São Paulo) ou de buscas inovadoras. Chega de jogo sujo nas campanhas. Rebaixá-las assim é trapaça.
Não tenho capacidade de imaginar como é a cabeça de um prefeito e a de governador que esbanjam fortunas em festividades, obras de engodo, dia disso e daquilo, futebol, tudo onde “a espera por atendimento de um endocrinologista é de dez meses”, “pacientes reclamam que exames mais específicos, como densitometria, chegam a demorar até dois anos”, revelação do jornalista Nilson Camargo sobre medicina em certas áreas da capital (Folha, pág. A2, 13/10/12).
A meu ver, não menos doentes do que tais necessitados são o prefeito e o governo de sua rica São Paulo. Mas doentes de outros males. Cabeças razoavelmente sensatas, ou medianamente sadias, não tolerariam desperdiçar nem um minuto e nem um centavo dos seus poderes enquanto não exterminassem realidades revoltantes como a da perversidade exposta por Nilson Camargo.
Diante disso, a disputa eleitoral em São Paulo-capital volta a ser submetida ao “kit Serra”, composto de insultos, desdizer-se, agressões verbais e mania de perseguição.
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[Janio de Freitas é jornalista, colunista da Folha de S.Paulo]