Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Ciberativismo mostra sua força no Brasil

Em vez de paus e bandeiras, celulares e internet. É com essas “armas” que a juventude está indo para as ruas manifestar contra o aumento no preço das passagens de ônibus. O ciberativismo, apontado como elemento fundamental na derrubada de regimes árabes e nas ocupações de espaços públicos nos EUA e na Europa em 2011, mostra a sua força em terras tupiniquins. Pelo Facebook, os organizadores do Movimento Passe Livre (MPL) conseguiram a adesão de centenas de milhares de pessoas, sendo que uma boa parcela participou efetivamente dos protestos realizados nesta segunda-feira em diversas cidades do país. “A internet é uma ferramenta fundamental para a organização das manifestações”, diz a estudante Mayara Vivian, uma das organizadoras do MPL. “Funciona como os antigos panfletos nas portas das fábricas.”

O evento criado no Facebook para São Paulo contou com mais de 270 mil adesões. No Rio foram mais de 70 mil confirmações. Para o professor de Comunicação da ECO/UFRJ Henrique Antoun, além de facilitar a organização, as redes sociais cumprem papel fundamental na divulgação de informações. Durante os protestos, câmeras e celulares registram o ponto de vista dos manifestantes que circula imediatamente pela internet.

Antoun compara a situação atual com a repressão do Estado no final da década de 1960. Naquela época, estudantes foram às ruas com reivindicações específicas, como o aumento do número de vagas nas universidades e a melhoria das condições das faculdades e eram duramente repreendidos pela polícia. Até que em março de 1968, o estudante Edson Luís de Lima Souto foi morto, gerando uma onda de passeatas pelo país. Na última quinta-feira, o Facebook e o Twitter foram inundados com vídeos e fotografias de uma manifestação em São Paulo, mostrando policiais atirando balas de borracha e bombas de gás lacrimogêneo contra jovens com as mãos para o alto. “O movimento ganhou força pela indignação que atravessou as redes sociais com as imagens da repressão policial contra uma reivindicação mais do que justa. A polícia tem o monopólio da violência e deve agir à altura dessa responsabilidade”, afirmou.

“É resultado de um trabalho de base”

Porém, Antoun não se apressa em comparar o movimento brasileiro com a chamada Primavera Árabe. Na sua opinião, as manifestações em alguns países do Oriente Médio enfrentavam a censura e o cerceamento à liberdade de expressão. “Pode se tornar um ‘Outono brasileiro’, mas temos que esperar os desdobramentos do movimento. A Primavera Árabe lutou contra o cerceamento à liberdade, que a internet tornava inócuo. Isso não existe aqui”, opina.

Mayara ressalta a importância da conjuntura e da construção do movimento pela base. Ela conta que o MPL já atua desde 2005 em diversas cidades, sempre pautando o debate em torno da qualidade dos transportes públicos, com mobilizações de destaque em 2006 e 2011. “A questão transcende as redes sociais, é resultado de um trabalho de base. Como ferramenta, elas são fundamentais, mas não é o Facebook que organiza o ato”, explica.

******

Sérgio Matsuura, do Globo.com