Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Intelectuais pela liberdade

Se o Brasil conhece hoje a sua história no século 19, devemos isso aos biógrafos que se debruçaram sobre a vida dos homens que nos governaram por mais de 80 anos naquele período. Alguns desses estudiosos foram Oliveira Lima, autor de D. João 6º no Brasil (1908); Octavio Tarquínio de Sousa, de A Vida de d. Pedro 1º (1952); e Heitor Lyra, de História de d. Pedro 2º (1938-40).

Sem entender a vida de nossos monarcas, não entenderemos o país – porque este refletia o que se passava sob as coroas dos dois primeiros e a cartola do último. Aliás, graças aos biógrafos, sabemos que foi Pedro 2º quem trocou a coroa pela cartola – mais civil, moderna e democrática. Suponha agora que alguém da família Orleans e Bragança (ainda com representantes de peso no Rio e em São Paulo, Petrópolis, Paraty e Paris) considere tal informação desprimorosa para com o seu ilustre. Sob o artigo 20 do Código Civil, ele pode tirar essa biografia de circulação ou até impedir que seja publicada.

O mesmo está ao alcance dos herdeiros de Joaquim Nabuco, Getúlio Vargas, Oswaldo Aranha, Juscelino Kubitschek, Tancredo Neves, Carlos Lacerda, Celso Furtado ou de qualquer homem público. Mas esses nunca fariam isso porque são pessoas esclarecidas e sabem da importância de seu parente para a história – inclusive no que, possivelmente, ele cometeu de errado.

Não deveríamos esperar pelo futuro

Não se pode também escrever a história moderna do Brasil sem falar na música popular, no futebol, na televisão e em seus homens e mulheres. Hoje existem restrições legais a isso. Mas é fatal: um dia, todas as histórias serão contadas. O futuro está cheio de biógrafos.

Sábado último [7/9], na Bienal, li com orgulho um manifesto assinado por 49 importantes intelectuais pedindo liberdade para as biografias no Brasil. Não deveríamos esperar pelo futuro.

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Ruy Castro é colunista da Folha de S.Paulo