Nas últimas semanas pudemos acompanhar a polêmica gerada em torno da discussão sobre as biografias não autorizadas de grandes artistas da música brasileira. Tudo começa com a notícia veiculada pela Folha de S.Paulo na qual informa sobre a adesão de Gilberto Gil e Caetano Veloso ao grupo Procure Saber, criado por grandes nomes da música como Roberto Carlos, Erasmo e Djavan. Em entrevista veiculada neste mesmo jornal (ver aqui), a porta-voz do grupo, Paula Lavigne, expõe a opinião do grupo sobre as biografias não autorizadas, que seria uma violação ao código civil, demonstrando assim por lógica que se alguém pretende publicar uma biografia de outra pessoa, este teria que autorizar antes da publicação.
Essas declarações geraram dezenas de manifestações de escritores (ver aqui), colunistas, jornais e artistas (ver aqui), questionando a liberdade de expressão, que segundo estes estaria seriamente ameaçada, uma vez que o biógrafo somente poderia publicar sua obra com autorização prévia do “biografado” ou do detentor de seus direitos de imagem, a exemplo das diversas obras que foram barradas pela justiça como Roberto Carlos em Detalhes, de Paulo Cesar de Araújo, editora Planeta, 2006 “, com a justificativa: violação da privacidade do músico.
Claramente existe uma tentativa de censura, pois se existem leis que já permitem a proibição de uma obra caso fique configurado que houve desrespeito aos artigos 20 e 21 do código civil, como demonstrado acima e citado em outra entrevista de Paula Lavigne ao Estadão (ver aqui), qual seria então a justificativa para esse grupo difundir a proposta de as obras somente sejam publicadas com autorização prévia do biografado. Há muitos eufemismos, mas a realidade é que se trata de censura prévia.
Censura prévia
Mais uma vez um grupo de minoria (pequena, mas poderosa), tenta influenciar a legislação com a justificativa de que as leis, hoje, não são efetivas para tolher as tentativas de invasão de privacidade ou lucro com a exploração da imagem alheia, porém o que na prática se põe em debate é se em prol de um direito, a privacidade, outro, a liberdade de expressão, seja ignorado. O que mais impressiona é vermos figuras como Caetano e Chico, que historicamente militaram e sofreram na pele a censura de grupos autoritários, defenderem e apoiarem tal proposta ou grupo que explicitamente mostra seu objetivo: proteger uma classe privilegiada e não permitir que haja opinião diversa daquela imposta pelo grupo. O que parece isso, senão uma ditadura?
Mais uma vez vemos como se dá a elite cultural no Brasil, que por mais que se diga de esquerda e revolucionária, só o é quando lhe interessa, mostrando-se capitalistas (ao propor até participação na obra), autoritários e fascistas que não aceitam opinião que não seja favorável. Se todos somos iguais diante da lei, qual a razão de separar determinada classe dando poder de censura sobre o que é publicado ao seu respeito.
Uma vez que esse grupo consiga atingir seu objetivo obviamente os próximos alvos serão os jornais, revistas, sites, programas de TV, pois certamente serão submetidos à censura prévia sobre o que circulará de determinada pessoa publica, eles que tomem cuidado, ou terão que pedir a benção antes de qualquer publicação, ao invés de um ditador Big Brother (menção a 1984, de George Orwell) teremos vários deles. Nada mais comunista! A censura é para todos.
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Marcos dos Santos Farias é analista de Logística, Campinas, SP