Depois de incentivar a punição dos meios que noticiem a falta recorrente de produtos na Venezuela, o governo do país oficializou a ofensiva contra a imprensa. Com a criação do Centro Estratégico de Segurança e Proteção da Pátria (Cesppa), na semana passada, o presidente Nicolás Maduro acirrou a disputa com os jornalistas. A classe agora pede a invalidação do novo órgão que, segundo os profissionais, nada tem de protetor: com o poder de controlar a informação, ele seria mais um ataque num país em que grande parte da mídia já está sob domínio do Estado.
A criação do Cesppa foi oficializada no diário oficial no dia 7. Traz artigos polêmicos; segundo um deles, o organismo “solicitará, organizará, integrará e avaliará as informações de interesse para o nível estratégico da nação”. Outro estabelece a possibilidade de censura ao permitir ao centro “proteger, neutralizar e derrotar os planos desestabilizadores contra a nação” – um discurso em consonância com o de Maduro, que acusa os jornalistas de promoverem uma “guerra” à segurança ao publicarem notícias críticas ao comando chavista.
– O governo já vinha baixando várias leis contra a liberdade de imprensa que fizeram com que emissoras regionais e algumas nacionais se impusessem uma autocensura diante da ameaça de perderem suas concessões. Essa nova intentona vai além, viola artigos da Constituição e dá ao governo o direito de controlar e decidir o tipo de informação que pode ser veiculada. É grave, um ato prévio à criminalização da informação – disse ao Globo Johan Perozo, secretário de Relações do Colégio Nacional de Jornalistas, a maior associação do setor na Venezuela.
Na semana passada [retrasada], Maduro já criticara uma manchete do “Diario 2001” sobre as longas filas nos postos de gasolina de Caracas e chegou a pedir a prisão do autor da reportagem, acusando o jornal de planejar “sabotar o sistema de distribuição” da gasolina.
– Estamos diante de um caso de arrogância sem fim, no qual o governo da Venezuela se outorga o poder de estabelecer o que pode ser informado (…), é como ser presidente, legislador e juiz ao mesmo tempo – criticou Claudio Paolillo, presidente da Comissão de Liberdade de Imprensa e Informação da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP).
Tentativa similar com Chávez
O Cesppa lembra um órgão criado em 2010 pelo então presidente Hugo Chávez, o Centro de Estudo Situacional da Nação (Cesna), também com o intuito de controlar a informação veiculada no país. A diferença é que o novo organismo confere a uma junta com braço militar a decisão do que seria um “atentado” da mídia contra a segurança, abrindo espaço para punições rigorosas.
Há três anos, o Cesna acabou impugnado tamanha foi a reação dos jornalistas venezuelanos. Eles pretendem empenhar a mesma estratégia agora.
– Se fizermos a mesma pressão, o governo pode voltar atrás. Faremos manifestações nas ruas e estamos preparando um processo junto ao Tribunal Supremo de Justiça – contou Perozo. (Com agências internacionais)
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Elisa Martins, do Globo