Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Entidades querem responsabilização de TV que exibiu estupro

Mais de 30 entidades defensoras de direitos humanos se reuniram nesta quinta-feira, 9 de janeiro, para discutir providências a serem tomadas em relação à veiculação por parte do programa televisivo “Cidade 190” de imagens do estupro de uma criança de nove anos. A matéria foi exibida pela TV Cidade, afiliada da Rede Record em Fortaleza (CE), na terça-feira (7/1), e vem sendo criticada por expor a vítima, desrespeitando uma série de direitos. O caso já está sendo analisado pela Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão (PRDC).

O grupo lançou uma nota pública na qual afirma que “o vídeo do estupro em questão retrata agressões aos direitos da criança em diversos aspectos, desrespeitando a legislação infantojuvenil e as normas em vigor para a radiodifusão”. Além disso, exigem a “responsabilização imediata da emissora TV Cidade (Cidade 190) e de seu corpo editorial pela transmissão do vídeo que expõe criança em cena de violência sexual”.

A PRDC já havia, em reunião realizada nos dias 16 e 17 de dezembro, proposto a subscrição por parte das emissoras de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para adequar os programas policialescos das emissoras em Fortaleza. O episódio ocorreu em meio aos 30 dias que foram dados para que as emissoras analisassem o conteúdo do documento e se manifestassem. Ao longo de 2013, foram instaurados mais de 20 procedimentos administrativos contra as emissoras, a partir de denúncias de violações de direitos. A TV Cidade é acusada em uma dessas ações por veicular em janeiro de 2013 cenas de um homem praticando sexo com um animal.

As entidades reunidas para tomar providências programaram para o dia 15 de janeiro, às 9h da manhã, um ato público saindo da Praça da Imprensa em direção à TV Cidade, para denunciar as violações cometidas por programas como o “Cidade 190”. Além disso, uma representação foi elaborada e será entregue ao Ministério das Comunicações, assinada pelas entidades envolvidas.

“Em desespero”

Segundo o assessor jurídico do Centro de Defesa da Criança e do Adolescente (Cedeca), Rafael Barreto, embora seja recorrente a violação dos direitos humanos por programas policialescos, “a diferença desse caso foi a veiculação de um vídeo de cena de sexo explícito envolvendo uma criança”. O artigo 241-A do Estatuto da Criança e do Adolescente prevê pena de 3 a 6 anos de cadeia e multa para quem divulgar por qualquer meio vídeo que contenha cena de sexo explícito envolvendo criança ou adolescente.

Barreto aponta como problema grave a política editorial dos programas policialescos que “espetacularizam a violência” envolvendo crianças e adolescentes. “Deixam a criança perfeitamente identificável, ainda que não mostrem seu rosto”, complementa. 

A integrante do Intervozes Raquel Dantas, que participou da reunião das entidades, denuncia os interesses que levam empresas de comunicação a exibir programas como o “Cidade 190”. “Não resguardam a imagem dessas pessoas mais pobres, porque é o conteúdo que elas precisam para explorar essas pessoas que mal têm como se defender, que acreditam às vezes que os programas policiais substituem o poder público”.

O procurador da PRDC, Francisco Macedo, considera “imprescindível que as emissoras mantenham determinados parâmetros para evitar expor essas pessoas envolvidas de perto”. Segundo ele, “a reportagem foi além do exigido e do permitido, indo ao interior da residência e tendo os pais concedido entrevista”. A procuradoria orientou para que não haja novas exibições das imagens e solicitou à emissora cópia do vídeo para análise.

Em nota lançada pelo departamento de jornalismo, a TV Cidade afirma que as imagens da criança vítima do estupro “foram divulgadas a pedido expresso de seu pai que, em desespero, solicitou essa providência por entender que tal procedimento ajudaria a punir o criminoso”. Finaliza o texto afirmando que “renovamos nossos intentos de propiciarmos a punição de delinquentes, sem ficarmos distantes dos desejos sociais pela punibilidade”.

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Bruno Marinoni, do Observatório do Direito à Comunicação