Se você escrever que o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), é mentiroso, corre o risco de pagar uma indenização de R$50 mil. Esta é a multa que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu aplicar ao jornalista Ricardo Noblat, como reparação de danos morais, por ter chamado o senador de “mentiroso, patife, corrupto, pervertido, depravado, velhaco, covarde”. A decisão foi tomada ontem (quarta-feira, 12/3), por unanimidade, pela Terceira Turma do STJ.
A relatora do caso, ministra Nancy Andrighi, afirmou que é natural que haja críticas dos cidadãos e da imprensa em relação a um senador da República, mas não se pode tolerar que a crítica desvie para a ofensa pessoal. Os outros quatro ministros da turma também votaram pela condenação, acompanhando o voto da relatora. A defesa de Noblat vai recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) assim que a decisão for publicada.
O advogado Murilo Leitão, que representa o jornalista e blogueiro, disse ao Congresso em Foco que não houve ofensa. De acordo com o defensor, o jornalista usou as expressões com base em contextos da época em que Renan foi alvo de várias acusações em seu primeiro mandato como presidente do Senado. Alvo de uma série de denúncias, o peemedebista renunciou à presidência e escapou, duas vezes, da cassação do mandato em votação secreta em 2007. As críticas, segundo Murilo, não foram gratuitas e tiveram amparo também em outros veículos de comunicação do país.
“Honra abalada”
Na ação, Renan Calheiros argumentou que teve a honra abalada por publicações do Blog do Noblat, que afirmaram que o parlamentar mentiu em discursos feitos na tribuna do Senado, omitiu bens à Receita Federal, usou “laranja” para compra de veículos de comunicação e simulou tomada de empréstimo para beneficiar lobistas. Em resposta à acusação, Noblat sustentou que não houve ofensas ou inverdades, já que os fatos foram amplamente divulgados na imprensa nacional e investigados pela Polícia Federal.
Na decisão de primeira instância, Renan Calheiros perdeu a causa. O juiz do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDFT) que examinou o caso entendeu que não houve ofensa ou injúria contra o parlamentar. ”Não há que se falar em indenização por danos morais, pois o homem público está sujeito a críticas, porquanto inerentes ao sistema democrático, necessárias ao aperfeiçoamento das instituições”, considerou o magistrado. “Os conteúdos disponibilizados pelo apelado (Noblat) em seu blog eram de conhecimento público e se basearam em diversos outros meios de comunicação que, em meados de 2007, deram ampla cobertura aos fatos”, acrescentou.
Recurso
Após a decisão, a defesa de Renan Calheiros recorreu ao STJ, alegando que houve claro abuso do direito de informação e ofensa à honra na utilização das expressões “patife, corrupto, pervertido, depravado, velhaco, pusilânime, covarde”, e também quando o jornalista afirmou que o senador teria “superado seus próprios recordes de canalhices”. A ministra Nancy rebateu a decisão do TJDFT. Para ela, a condição de homem público de Renan não justifica a utilização contra ele de “expressões altamente ofensivas”.
Nancy ressaltou que Noblat tem histórico de ser diligente na divulgação das informações sobre as investigações em andamento, mas “acabou ultrapassando a linha tênue existente entre a liberdade de expressão e a ofensa aos direitos da personalidade de outrem”. O tribunal fixou indenização de R$50 mil, corrigidos monetariamente a partir da data do julgamento e acrescidos de juro de mora de 1% ao mês, a contar da data de sua publicação.
Natural de Recife, radicado em Brasília desde 1982, o jornalista passou pela redação de alguns dos principais jornais e revistas do país. Desde 2004, mantém no ar o Blog do Noblat, considerado um dos blogs de maior prestígio da capital federal.
Sob pressão
Renan renunciou à presidência do Senado em 2007. A principal acusação que recaia contra ele na época era de que um lobista da empreiteira Mendes Júnior pagava R$ 16,5 mil mensais à jornalista Mônica Veloso, com quem o senador tem uma filha. Como mostrou a revista Veja, entre 2004 e 2006 a empreiteira recebeu R$ 13,2 milhões em emendas parlamentares do senador destinadas a uma obra – feita pela empresa – no porto de Maceió. Salvo pelo plenário duas vezes, o senador escapou da cassação. Passou a atuar de maneira discreta até voltar à liderança do PMDB dois anos depois.
No início do ano passado, conseguiu se eleger presidente do Senado, com o apoio do Palácio do Planalto e de setores da oposição. Dois dias antes de sua eleição até duas semanas após sua posse, dois abaixo-assinados virtuais somaram mais de 2 milhões de apoios de internautas de todo o país. Todos, contra a sua volta ao cargo.
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Carol Oliveira, do Congresso em Foco