A cobertura do jornalismo da TV Globo à ação da Polícia Militar do estado de São Paulo para, pela terceira vez, promover na terça-feira (16/9) a reintegração de posse de um prédio de 20 andares ocupado por 200 famílias na Avenida São João foi uma comédia de desinformação e imprecisões, o que não é comum nas atividades do jornalismo da emissora.
A ordem judicial para uma reintegração de posse não é dada para o mesmo dia em que a decisão do juiz é emitida. Até porque a PM só sai do quartel pelo menos 24 horas depois em que a decisão chega ao comando para que seja feito o planejamento e todo esquema operacional para sua execução. Como os ocupantes do prédio já estavam preparados para resistir, o ato desta terça-feira contou com uma reação devidamente planejada, que se refletiu na remessa de todo tido de material dos moradores, como sofás, camas e cadeiras para atrapalhar ação da polícia.
O que se esperava é que o jornalismo da TV Globo produzisse uma cobertura à altura dos problemas ocasionados pela ação dos invasores, como a paralisação do trânsito na área com a interrupção do ir-e-vir de milhares de pessoas que iam para o trabalho de manhã. Depois de cinco horas de confusão e confronto, onde não faltaram o disparo de balas de borracha, bombas de gás lacrimogênio e policiais feridos pelo arremesso de pedras do prédio, os moradores foram finalmente retirados, rendidos pelo cansaço. Mas o confronto continuou até depois da meia-noite porque manifestantes tomaram as dores dos invasores expulsos e provocaram atos de vandalismo contra bens públicos, como orelhões de telefones fixos e o incêndio de ônibus.
As novas demandas sociais
A TV Globo ficou devendo ao telespectador matutino informações como; a) a quantidade de pessoas sem ter onde morar em São Paulo; b) o que a prefeitura e o governo estadual tem feito para resolver a questão; c) de quem é o prédio invadido; d) a origem das pessoas que invadiram o prédio. Não se pode alegar falta de tempo: outra vez, o jornalismo do Bom Dia Brasil de quarta-feira (17/9) falhou ao transmitir informações parciais e incompletas.
Não será exagero considerar-se leviana a acusação da apresentadora Ana Maria Braga: sem citar o nome, ela disse que por trás dos invasores estava uma entidade defensora dos direitos humanos usada para defender pessoas que ocupam irresponsavelmente a propriedade alheia. Mais uma vez, o sentimento patrimonialista tão presente na emissora veio à tona por uma porta-voz. Essa imprecisão derrubou a categoria da equipe jornalística de suporte ao Mais você.
O mau uso da mídia para acusações a pessoas deserdadas é uma mania que está virando regra nos tempos de liberdade de expressão. O equilíbrio na emissão de opiniões, pontos de vistas é uma exigência do novo processo de amadurecimento democrático em andamento no país. Mas a compreensão sobre as novas demandas sociais é também uma exigência da habilitação de profissionais para o exercício da atividade jornalística.
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Reinaldo Cabral é jornalista a escritor