Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Chavismo consolida sua hegemonia com a compra de mídias

Às agressões, ameaças, processos administrativos e penais contra jornalistas e veículos de comunicação; aos fechamentos, com os quais o governo de Hugo Chávez, antes, e o de Nicolás Maduro, agora, procuraram silenciar as vozes críticas na Venezuela, acrescentou-se uma nova estratégia: a compra de jornais, portais da internet e emissoras de rádio e de TV por empresários ligados à revolução bolivariana.

Desde que, em maio de 2013, a família Zuloaga vendeu a Globovisión – o único canal especializado em notícias do país e abertamente contrário ao Executivo – a Gustavo Perdomo e Álvaro Gorrín, acionistas da seguradora La Vitalicia, mais quatro empresas de comunicação tiveram o mesmo destino. A última vítima é o centenário jornal El Universal, de Caracas, muito crítico da gestão chavista. Em todos os casos, os novos proprietários decidiram suavizar a linha editorial e torná-la mais favorável ao governo; para tanto, não hesitaram em demitir os jornalistas contrários.

Para o diretor do Centro de Direitos Humanos da Universidade Central da Venezuela, Héctor Faúndez, as aquisições de meios de comunicação no último ano e meio são mais um passo para a hegemonia da informação que, em 2007, foi anunciada pelo então ministro da Informação, Andrés Izarra, apresentando-a como necessária para “garantir o predomínio do pensamento e dos valores socialistas do coletivo, do solidário e do social”.

“Na Venezuela ainda inexiste a liberdade de expressão, mas nos últimos tempos ocorreu uma importante mudança na forma como se foi restringindo ou coibindo esse direito. Agora, o governo já não recorre ao fechamento dos veículos, pois descobriu que é mais fácil e menos dispendioso em termos políticos comprá-los diretamente, ou por meio de terceiros. E isso lhe permite se exibir para o exterior como um governo que aceita e tolera veículos independentes”, afirmou Faúndez, em clara alusão às críticas que há sete anos provocaram a decisão de tirar do ar a Radio Caracas Televisión (RCTV), então a emissora privada mais antiga do país e a de maior audiência.

Em termos semelhantes, expressou-se o secretário-geral do Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Imprensa, Marco Ruiz: “O caso da RCTV ensinou às autoridades que é melhor comprar os veículos de comunicação e silenciá-los com as portas abertas do que fechá-los no velho estilo das ditaduras”. Para Ruiz, esta nova estratégia governamental representa “uma escalada na arremetida contra a liberdade de expressão” lançada pelo chavismo em seus 15 anos de poder, pois graças a ela certos fatos e vozes que incomodam estão sendo calados. “Em um país em que a impunidade é de mais de 90%, e a justiça que a maioria dos cidadãos conhece é a denúncia pública, o que está ocorrendo é grave”, alertou.

Críticas dos leitores

Um exemplo recente da política de restrição da liberdade de imprensa na Venezuela é a demissão da caricaturista do jornal El Universal, Rayma Suprani, por uma vinheta na qual aparecia a assinatura do presidente falecido. “O governo está escondendo a gravidade da situação da saúde e por isso exigiu que os compradores dos veículos de comunicação, entre eles El Universal, que os encham de informações banais (…) Banalizar um jornal é outra forma de censura”, denunciou a artista, denunciando claramente que, poucos dias depois da venda do jornal, a inflação, a escassez de alimentos e remédios que o país está sofrendo, a pobreza e outros temas incômodos para as autoridades foram retirados da primeira página e foram substituídos por temas menos controvertidos como os efeitos da seca ou a realização de obras de infraestrutura na capital.

A demissão de Rayma provocou uma onda de críticas contra a nova administração do diário. Em um comunicado, os jornalistas condenaram a decisão por considerá-la “um dos custos maiores (… ) que paga para se amoldar a uma linha editorial favorável aos interesses do governo, e pretende suavizar uma realidade angustiante para os venezuelanos de todas as camadas sociais”. Faúndez, por sua vez, acrescentou: “Isso também demonstra a atitude autoritária e pouco tolerante do atual regime”.

Mas a saída da caricaturista não é o único sinal de alarme que ocorre três meses após a venda do diário. Dias antes de anunciar a venda, cerca de 40 articulistas foram demitidos por “não se ajustarem ao código de ética do jornal que proíbe as ofensas”. Mas o verdadeiro alerta ocorreu em 15 de agosto quando a informação sobre o conflito entre os trabalhadores da Siderúrgica del Orinoco e a estatal foi substituída por outra da agência oficial de notícias.

As mudanças no El Universal foram duramente criticadas pelos leitores. Por exemplo, a devolução de exemplares aumentou de 8% para 25% nas últimas semanas, e a leitura pela internet e do número de seguidores no Twitter freou seu crescimento.

“Se as pessoas que compravam El Universal não conseguirem a volta dos jornalistas ou a informação que recebiam, mudarão para outro veículo onde possam obtê-las”, alertou Carlos Correa, diretor da organização pela liberdade de expressão, Espacio Público. Além disso, importantes anunciantes pediram para espaçar a publicação de seus anúncios. 

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Juan Francisco Alonso é jornalista do El Universal