Até junho, a Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados vai votar um projeto de lei (PL) que regulamenta a veiculação de propaganda dirigida a crianças. A expectativa é da deputada Aline Correa (PP-SP), relatora de três projetos sobre o tema na comissão. De acordo com a parlamentar, a autorregulamentação, defendida por agências de propaganda e anunciantes, ‘está em condição de falência’ uma vez que não há punição aos profissionais.
Depois de aprovados na comissão, os projetos seguem para o plenário da Câmara e em seguida para o Senado. Entre os projetos relatados por Aline Correa está o que estabelece a proibição de publicidade ‘nos meios de televisão e radiodifusão voltados ao público infantil, nos horários compreendidos entre as 6 horas e as 20 horas’.
‘Seria cômico se não fosse trágico’, ironizou o advogado Edney Narchi, vice-presidente do Conselho de Autorregulamentação Publicitária (Conar). Para ele, o projeto expressa ‘radicalismo’ e está ‘fora dos padrões aceitáveis pela sociedade brasileira, que gosta de propaganda’. Segundo o vice-presidente do Conar, que participou hoje (27/4) de uma audiência pública na Câmara dos Deputados, as queixas às propagandas nos órgãos de defesa do consumidor não passam de 1,5% do total recebido em todo o país.
‘Conar não representa a sociedade’
A mesma opinião tem o representante da Associação Brasileira de Agências de Publicidade (Abap), Stalmir Vieira. Para ele, o projeto ‘não faz sentido’ e representa a tentativa de criminalizar um setor. ‘Muita gente aprendeu, por meio da televisão, hábitos elementares’, acredita. Em sua avaliação, a regulamentação não é necessária porque ‘está provado que a sociedade sabe se mobilizar’, em referência a protestos recentes contra o anúncio de uma agência de viagens que dizia que era ‘pateta’ quem não viajasse para a Disney (Estados Unidos). A propaganda foi retirada do ar.
Para a coordenadora do Projeto Criança e Consumo do Instituto Alana, Isabella Henriques, o Brasil não tem legislação que regulamente a propaganda para crianças. Além disso, a atuação do Conar não ‘é suficiente’ uma vez que o órgão não está organizado em todo o país e não tem poder punitivo conferido por lei.
A psicóloga Roseli Goffman, do Conselho Federal de Psicologia, afirma que o ‘Conar não representa a sociedade brasileira’, pois envolve apenas os próprios publicitários. Ela lembra que o fim da publicidade infantil é uma reivindicação aprovada na 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), realizada em dezembro do ano passado.
Pais apoiam algum tipo de restrição
Segundo dados do Ministério Público da União apresentados na audiência, o investimento em propaganda infantil no ano passado foi de R$ 209,7 milhões para setores que movimentaram mais de R$ 15 bilhões na economia (roupas, R$ 5,58 bilhões; fast food, R$ 5 bilhões; brinquedos, R$ 1 bilhão, entre outros).
O Brasil conta hoje com 50 milhões de crianças. Dessas, 22 milhões estariam fora do mercado consumidor de produtos anunciados.
O brasileiro (adulto e criança) assiste a mais de cinco horas por dia de televisão. Pesquisa do Instituto Sensus (2007) revela que 58,3% dos pais não sabem ao que os filhos assistem. Outra pesquisa, feita pelo Datafolha em São Paulo, revela que 73% dos pais entrevistados concordam com algum tipo de restrição à publicidade dirigida [Edição: Lílian Beraldo].