Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

A guerra do narcotráfico

O Rio de Janeiro e o Brasil voltaram a ser notícia em todo o mundo, mas dessa vez não pelas Olimpíadas, e sim, pelo olímpico e hercúleo jogo de ‘gato e rato’ travado entre policiais e narcotraficantes cariocas.

O jornal espanhol El País, que havia publicado uma matéria recheada de elogios ao nosso país no dia 12 de outubro, agora publica a notícia: ‘La disputa entre facciones de dos favelas desencadena un enfrentamiento con la Policía Militar que provoca doce muertos.’ The New York Times destacou: ‘2 dead as gang shoots down Brazilian police helicopter’.

As cenas de guerra que aconteceram neste sábado (17/10) chocaram todo o mundo. A interminável crise na segurança pública carioca é algo absurda. O desrespeito ao poder constituído, em uma das principais cidades turísticas do planeta, é notório e tratado cada vez mais com desdém por quem não vive essa triste realidade. O combate nos morros e o fortalecimento do tráfico de drogas viraram temas de sucessos do cinema nacional. O filme Tropa de Elite, baseado no romance A Elite da Tropa, elevou os agentes do Bope ao nível de heróis nacionais. Prova disso foram os efusivos aplausos no desfile de 7 de setembro no ano do lançamento do filme. Mas parece que nem a tropa do capitão Nascimento conseguiu evitar mais essa tragédia de âmbito internacional.

Medo de ser taxado revanchista

Quando um crime como esse acontece, a primeira coisa a se detectar é a quem culpar. Aí, a imprensa se complica. O governador do Rio, responsável pela segurança no Estado, antes culpava o governo federal, responsável por controlar as fronteiras e impedir o contrabando de armas. O ministro da Defesa aparece em coletiva para oferecer o reforço da Força Nacional. O governador rejeita e afirma que o importante é trabalhar nas ações de prevenção para que novas tragédias como essa não se repitam. E assim caminha a humanidade.

Em entrevista coletiva, o secretário de Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro, José Mariano Beltrame, admitiu os erros da operação dos seus policiais. O chefe da Polícia Civil, Alan Turnowski, garantiu: ‘A gente sabe quem foi, sabe como foi e vamos dar a resposta na mesma medida.’ E para finalizar, o comandante-geral da PM, Mário Sérgio Duarte, disse que ‘agindo dentro da legalidade, da legitimidade, iremos atrás deles, onde for preciso’. Ou seja, o primeiro assume o erro, o segundo garante a retaliação e o terceiro afirma que irão usar os métodos dentro da legitimidade e de forma legal. Essas duas últimas afirmações despertam uma triste sensação coletiva. Se a polícia sabe quem foi, por que eles ainda estavam soltos? E mais, por que a preocupação do comandante-geral em destacar em sua afirmativa ‘dentro da legalidade’?

Simples: porque existe um sistema judiciário em nosso país que se preocupa muito mais com a ‘segurança e bem-estar’ do marginal do que com a segurança pública coletiva e os direitos humanos dos que protegem os cidadãos. Já o medo do comandante Duarte é outro. O medo de ser taxado pela nossa grande imprensa como um revanchista e de tentar fazer justiça com a as próprias mãos.

Um ato fascinante e cinematográfico

Dezenas de marginais (e alguns inocentes) dos morros cariocas serão mortos nos próximos dias, isso é fato. Saber como a imprensa reagirá a isso é a grande questão. Se vão apoiar a retaliação da polícia carioca ou se irão condená-la, afirmando que não há pena de morte no país e que houve desrespeito aos direitos humanos é uma incógnita definida apenas pela linha editorial (ou política) de cada veículo de comunicação.

A morte dos policias, irá passar despercebida. Seus nomes nem foram citados na coletiva sobre o caso, onde os profissionais que deram suas vidas na luta contra o tráfico foram reduzidos a meros números. Serão somente estatísticas no jogo de ‘polícia e ladrão’ travado nas favelas da cidade-sede dos Jogos Olímpicos de 2016.

Mas, digamos que a polícia efetuou a prisão de todos os envolvidos. E agora? É difícil acreditar no sistema carcerário nacional como um ponto de recuperação para os cada vez mais violentos traficantes brasileiros. Serão tratados como heróis e estrelas do crime, festejados por terem cometido um ato fascinante e cinematográfico como a derrubada do helicóptero da PM. Será que os representantes dos Direitos Humanos e advogados irão fazer um ato público na mídia e ajudar os parentes dos policiais mortos em combate, assim como apareceram no momento da prisão dos marginais para ‘garantir a integridade física de seus clientes’? Decerto que não.

Cena de guerra afegã

A ousadia, a impunidade, o uso crescente de drogas financiando o tráfico, a burocracia, a corrupção em todas as suas instâncias e os Direitos Humanos àqueles que não respeitam os direitos dos outros são e serão sempre entraves para a segurança nacional. E o pior é que ainda serei taxado (como já fui, no Observatório da Imprensa) de fascista, por defender menos Direitos Humanos aos desumanos marginais do meu país.

Mas tudo bem. Depois de um mês, essa tragédia vira ‘matéria fria’, a imprensa perde o interesse e o povo esquece. O governo ajudará a família das vítimas com uma pensão de um ou dois salários-mínimos e pronto. Sérgio Cabral, que dispensou a ajuda da Força Nacional, estará inaugurando outra praça, sorrindo para a mídia visando à próxima eleição em 2010. As mesmas câmeras que noticiaram a cena de guerra afegã, no morro do Rio, filmarão um campeonato de futebol financiado pela facção criminosa Comando Vermelho ou pelo ADA (Amigos Dos Amigos), dependo somente de quem estiver comandando o tráfico na ocasião. Tudo isso onde outrora caiu um helicóptero…

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Analista de marketing, Salvador, BA