Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A perigosa busca pela magia instantânea

Enquanto parte da mídia – especialmente as revistas dedicadas às celebridades – continuar divulgando lipos e implantes como conquistas, as mulheres vão continuar atrás da solução mágica para suas insatisfações pessoais. Esse tipo de mídia, aliada a profissionais inescrupulosos, acaba induzindo suas leitoras a procurar a magia instantânea, como mostrou a Folha de S.Paulo na matéria ‘Médicos fazem parcerias com famosas para divulgar clínicas’:

‘Quando Mirella Santos, modelo, ex-participante do programa A Fazenda e atual mulher do cantor Latino, trocou as próteses de silicone dos seios, um fotógrafo acompanhou cada passo. A moça, maquiada e sempre sorridente, foi fotografada ao se preparar para a cirurgia, ao ser medicada e enquanto o cirurgião plástico fazia a incisão em seu corpo. `Achei bacana. Pelo menos eu dou um moral também para o médico´, diz ela.

O médico em questão é Ricardo Cavalcanti Ribeiro, que aparece abraçado com ela em parte das fotos. A operação, segundo Mirella, foi fruto de um acordo com o cirurgião plástico. `A gente fez uma parceria, né? Afinal, eu também estava divulgando o nome dele.´ Parcerias como essa estão cada vez mais comuns. Enquanto o médico entra com o bisturi, a celebridade entra com a propaganda na mídia. A cirurgia de Mirella, segundo o médico, saiu de 30% a 40% mais barata. E as fotos foram bastante publicadas’ (Folha de S.Paulo, 27/06/2010).

As mortes após cirurgia plástica, especialmente lipoaspirações, têm sido notícia de dois anos para cá. Sempre envolvendo mulheres. Os jornais de domingo voltaram ao assunto, para discutir, desta vez, a atuação dos médicos.

73% das cirurgias plásticas são estéticas

O Estado de S. Paulo traz uma matéria alertando para os riscos da anestesia, fazendo uma importante denúncia: a de que, por economia, a consulta prévia com o anestesista é eliminada antes de algumas cirurgias plásticas:

‘A maioria dos pacientes de uma cirurgia plástica se preocupa sempre com o preço, às vezes com a expertise do médico e quase nunca com a anestesia. Se o que determina o sucesso do procedimento do ponto de vista estético é a habilidade do cirurgião, cabe ao anestesista – ou anestesiologista, como eles preferem ser chamados – a tarefa mais importante: fazer com que o paciente saia, além de mais bonito, vivo da mesa de operação. Uma das formas que o mercado usa para enxugar o custo é eliminar etapas importantes de avaliação médica, como a consulta com o anestesista, profissional que o paciente encontra só na mesa de cirurgia’ (O Estado de S.Paulo, 27/06/2010).

O professor Irimar de Paula Posso (da Faculdade de Medicina da USP), entrevistado pelo jornal, diz: ‘Estou cansado de ouvir casos de pacientes que morrem na mesa de operação. Toda cirurgia tem um risco, mas quando o procedimento é muito barato, alguma coisa foi deixada de lado.’

O custo menor das cirurgias – que o jornal não discute – é, certamente, o responsável pelos números apresentados no box da matéria: 73% das cirurgias plásticas feitas no país são estéticas e apenas 27% são reparadoras, segundo a SPCB. Das cirurgias estéticas, 21% são para implante de prótese mamária; 20%, lipoaspirações e 15%, abdome.

Atrás de soluções mágicas

Ao mostrar aos leitores os riscos envolvidos nos vários tipos de anestesia e dar a palavra a médicos para dizer por que preferem um tipo ou outro, o jornal presta um bom serviço. Mas ainda fica devendo: seria preciso discutir o assunto em termos mais simples e diretos e mostrar aos leitores – especialmente às mulheres, a grande maioria das pacientes desses procedimentos – a relação custo-benefício destas cirurgias. Por quanto tempo elas vão continuar com o corpo sonhado – sem barriga, peito perfeito etc. etc? Quanto tempo – e dinheiro – gastariam para obter os mesmos resultados sem cirurgia? Mais interessante ainda seria mostrar a diferença – no bolso e no organismo – entre dieta/exercícios e cirurgia.

As revistas femininas mais sérias, que hoje dão uma grande ênfase às dietas e exercícios, no passado costumavam mostrar ‘antes de depois’ em cirurgia plástica, principalmente no começo das lipoaspirações. Elas estão em dívida com suas leitoras e deveriam tentar pagar a conta mostrando que as cirurgias plásticas só funcionam se a pessoa estiver disposta a uma vida de controle. Mas deveriam, mais do que isso, mostrar que o corpo perfeito não é a solução para todos os problemas.

Enquanto as revistas de celebridade, as revistas femininas, os jornais e a TV continuarem fazendo a apologia das top models e das mulheres com corpo perfeito, as mulheres vão continuar atrás de soluções mágicas, mesmo correndo o risco de morrer por isso.

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Jornalista