Firdoze Bulbulia, diretora do The Children´s Broadcast Forum of África (CBFA), é uma das representantes da 4ª Cúpula Mundial de Mídia para Crianças e Adolescentes (CMMCA) no continente Africano. Ela afirma que a qualidade de mídia voltada para crianças e adolescentes só se tornará uma prática quando, de fato, a sociedade se sentir proprietária da mídia e de sua produção.
Firdoze destaca que é preciso dar vez e voz às crianças. O problema é que, na sua avaliação, os adultos não entendem que as crianças são capazes de produzir suas histórias, articular seus pensamentos e propor novos conceitos, valores e conhecimentos. Não entendem que as crianças são capazes e ousadas.
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The Children´s Broadcast Forum of África (CBFA) foi criada, em 1995, para lutar pelos direitos das crianças e defender uma mídia de qualidade para elas. Esta continua sendo a missão da instituição? Que tipos de dificuldades a entidade vem enfrentando para desenvolver este trabalho?
Firdoze Bulbulia – A CBFA vem trabalhando energicamente na defesa de uma mídia de qualidade e na participação das crianças nos processos de produção. Acabei de lecionar dois cursos de verão, oferecidos pela Universidade de Ohio, nos Estados Unidos: Criança e a Produção Televisiva na África e Roteiro para Criança. A realização destes cursos representa o reconhecimento do nosso trabalho. Foi uma troca de experiências fantástica. Agora, nós temos estudantes de todo o mundo interessados em pesquisar e levar adiante o trabalho da CBFA. Isto é muito bom.
Por outro lado, temos encontrado dificuldades para financiar projetos e, outras vezes, para convencer e propor nossas idéias. Os adultos não entendem que as crianças são capazes de produzir suas histórias, articular seus pensamentos e propor novos conceitos, valores e conhecimentos. Não entendem que as crianças são capazes e ousadas. Na maioria das vezes, também temos que defender, junto aos governantes e profissionais de mídia, a aprovação de nossos programas e idéias. Isto porque promovemos e envolvemos as crianças nos processos de produção e também trabalhamos com imagens positivas da África, imagens positivas de crianças africanas. O problema é que as pessoas preferem trabalhar no sentido contrário, mostrando somente o lado negativo. É mais fácil. A mudança de paradigma sempre é um longo caminho a ser percorrido. Mas continuaremos nesta luta, promovendo nossas crianças e adolescentes.
A sociedade deve participar da produção de mídia? Deve exercer um controle sobre o processo?
F.B. – A sociedade deve estar envolvida nos processos de mídia e em seus resultados. É preciso, é necessário. As vozes das crianças e da sociedade civil devem ser ouvidas – e isto só acontecerá quando as comunidades se apropriarem da mídia e de sua produção. Este engajamento fará diferença, sim, a partir do momento em que as pessoas estiverem envolvidas. Este comprometimento proporcionará novas visões – o que agregará sensibilidade, seriedade e fidedignidade às produções.
A senhora afirma que a CMMCA é o mais importante evento internacional sobre o tema, particularmente a 4ª edição. Por quê? Qual a diferença desta edição para as outras?
F.B. – A 4ª CMMCA é a oportunidade de os países em desenvolvimento mostrarem sua produção. Estaremos em uma posição que permitirá que nossas vozes sejam ouvidas, nossas produções sejam assistidas e nossas histórias contadas. O chamado ‘primeiro mundo’ não está trazendo nada de novo. Está, sim, de olho em nossas produções, contando nossas histórias. Mas todo este tesouro é nosso. Temos que estar prontos para divulgar e defender toda esta riqueza. Riqueza de histórias, de produções e de mídias.
O tema da 4ª Cúpula é Mídia de todos, Mídia para todos. Quais são suas expectativas?
F.B. – Durante a 2ª Cúpula Mundial de Mídia para Crianças e Adolescentes, realizada na Inglaterra, a África propôs, com veemência, a realização da 4ª edição no Brasil. A realização desta cúpula é, portanto, uma vitória de todos nós, de todos os países em desenvolvimento. É a oportunidade de os países do hemisfério sul estabelecerem um diálogo direto entre eles. É o momento de dividirmos experiências e participarmos efetivamente de todos os temas. É a hora de promover nossa cultura e nossa gente para as outras partes do mundo – garantindo que nossas vozes sejam ouvidas. É a oportunidade de dar voz para os que não têm voz, dar vez aos marginalizados, aos abandonados. Contudo, estou preocupada se haverá algum suporte financeiro por parte dos organizadores para a participação da África. A voz da África tem que ser forte e marcante – é a voz de vários países em desenvolvimento. Quando participamos da 3ª CMMCA, tínhamos cerca de 140 delegados, 30 crianças e, pelo menos, 30 delegados representantes da África do Sul. Minha preocupação, agora, é se vamos ter a mesma energia e se vamos participar da mesma forma. Não queremos apenas participar como delegados. Queremos estar presentes como palestrantes e crianças engajadas. Também queremos garantir que as vozes das crianças sejam suas vozes e não interpretações de adultos. A participação das crianças não pode ser uma fachada ou apenas mais uma presença. Temos que ter cuidado com isto.