A notícia de que a Justiça Eleitoral do Rio mandou suspender as obras na favela da Providência está presente com destaque em todos os jornais de quarta-feira (25/6). Com a decisão, o Exército retirou seus soldados da favela, onde, no dia 15 de junho, um grupo de onze militares entregou a traficantes de um morro vizinho três jovens moradores, que foram posteriormente torturados e mortos.
A medida oferece ao Comando Militar do Leste uma solução honrosa para sua retirada do Morro da Providência, onde a relação com os moradores havia se tornado extremamente tensa. De certa forma, também sinaliza que a Justiça Eleitoral está atenta aos abusos cometidos por candidatos nas eleições municipais deste ano.
Os militares trabalhavam na segurança dos operários que faziam a recuperação de 782 moradias populares. Chamada de projeto Cimento Social, a obra foi proposta pelo senador Marcelo Crivella, que faz uso desse tema em campanhas eleitorais desde 2004.
Tudo isso está bem relatado nos jornais de quarta, que registram ainda a frustração e o protesto dos 150 operários que haviam sido contratados para as reformas. O que não está bem esclarecido é que o senador Crivella, candidato anunciado a prefeito do Rio, também pode ter usado a obra – e as verbas públicas alocadas para ela – em benefício de uma organização religiosa.
Apuração inconclusa
Crivella é bispo da Igreja Universal do Reino de Deus e sobrinho do fundador da seita, Edir Macedo. Uma nota publicada na coluna ‘Painel’ da Folha de S.Paulo informa que Marcelo Crivella mantém um cadastro dos moradores do Morro da Providência, inclusive com informações sobre orientação religiosa. Segundo o jornal, o senador alega que as informações eram necessárias para identificar potenciais beneficiários do projeto Cimento Social. Só não explica o que tem a ver com isso a escolha religiosa de cada eleitor. O Globo observa que o cadastro foi feito pela própria Igreja Universal.
O Brasil vive sob um regime laico, e é vedado aos detentores do poder público privilegiar organizações religiosas. A imprensa poderia ir mais fundo, lembrando que a Igreja Universal tem antecedentes na prática de cercear a liberdade de informação. A organização tentou calar os jornais, alguns meses atrás, com uma sucessão de processos judiciais coordenados, impetrados por seus seguidores em várias partes do Brasil.
A decisão da Justiça, de embargar a obra foi motivada por suspeita de abuso de poder econômico. Mas pode haver mais a ser apurado.
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