Não teve a esperada repercussão a proclamação de Dilma Rousseff em homenagem às mulheres veiculada pela TV em rede nacional na noite da sexta-feira (8/3). Pelo menos em São Paulo. E a culpa não foi da presidente – que estava muito bem, descontraída – nem do teor da mensagem anti-inflacionária em que anunciava cortes nos impostos que incidem sobre a cesta básica.
O pronunciamento não “bombou” por razões prosaicas e, ao mesmo tempo, dramáticas: um gigantesco engarrafamento parou a cidade e atrasou por algumas horas a volta para casa. Em muitos bairros a luz estava cortada desde o meio da tarde e ainda não fora restabelecida até àquela hora (20h30).
A NET (maior operadora da TV por assinatura do país) estava fora do ar em diversos pontos da cidade. Também era impossível utilizar o recurso de assistir à TV pela internet porque muitos provedores de acesso, inclusive o maior deles, o UOL, estavam inertes ou funcionando precariamente.
Os boletins radiofônicos e telejornais da noite só obtinham informações por meio das assessorias de comunicação dos órgãos públicos que atendiam apenas à compulsão estatística: tantos quilômetros de engarrafamento, tantos pontos de alagamento, tantas árvores caídas, tantos semáforos desligados (ou em amarelo intermitente).
Nem uma palavra de tranquilidade das autoridades sobre as providências, a extensão do apagão da rede elétrica – setor hoje fundamental no funcionamento de uma cidade – nem sobre os estratégicos serviços de transmissão de dados e informações.
Obrigação de informar
A iniciativa privada inventou o milagre tecnológico da conectividade, mas não sabe mantê-lo em situações anormais ou diferenciadas. Mas cobra pelos serviços, deveria estar apta a enfrentar emergências. Não estamos falando de terremotos, tsunamis, ciclones ou tufões: o temporal da sexta-feira (8), em São Paulo, foi intenso, teve muito granizo, porém típico do final de verão.
As “águas de março” estão rolando há, pelo menos, 459 anos em São Paulo e 448, no Rio.
É verdade que os ventos e descargas elétricas aumentam de forma preocupante a cada temporada. São eles os grandes responsáveis pelos apagões, panes e vítimas eletrocutadas. A culpa não é dos deuses, é daqueles que preferem produtos orgânicos, mas não se importam com o ritmo alucinante da urbanização nem com a poluição ambiental que está alterando drasticamente nossas condições de vida.
Os jornalões de sábado (9/3) não puderam dar a devida dimensão ao que aconteceu na véspera porque a dramática sexta-feira estendeu-se até à madrugada. Como no sábado as redações funcionam em regime de plantão e choveu torrencialmente à tarde, o rescaldo foi adiado. Como também choveu forte no domingo seguido por um grande apagão/desconexão, a cobertura na segunda-feira (11/3) só não foi pífia porque desgraçadamente houve duas vítimas fatais.
Em matéria de emergências, o que falta à nossa mídia é a noção de prestação de serviços. Sua obrigação é informar mesmo quando uma subsidiária ou empresa-irmã está em pane. O atual culto numerológico é deletério: o cidadão estressado por uma incrível sucessão de emergências precisa saber exatamente o que está acontecendo. O UOL, a NET, o Speedy, a Oi ou a Claro precisam assumir com clareza as suas dificuldades – seja por meio dos serviços de atendimento ao cidadão-consumidor, seja na mídia, no trato com o cidadão-eleitor.
Serviços privados
A presente temporada de cataclismos hídricos vem sendo tratada fragmentadamente, como o faz a mídia digital, sem mostrar o conjunto nem as dimensões. O cidadão está sendo agredido diariamente com a perda de seus mais elementares direitos – não pode locomover-se, não pode usar a eletricidade, não pode comunicar-se, muito menos trabalhar tal como os vendedores de gadgets e as operadoras de telefonia lhe prometem nos glamourosos comerciais.
Enquanto a Folha de S.Paulo não aprender a noticiar com naturalidade os pepinos do UOL, ou os veículos platinados se acostumarem a informar falhas da NET no fornecimento de conteúdo, não conseguiremos criar uma verdadeira sociedade de serviços. Denunciar a falta de transparência nos serviços públicos e esconder a opacidade dos serviços privados é uma contradição pela qual a grande mídia pode pagar caro.