Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

As investigações do caso Brad Will

[O CPJ enviou a seguinte carta ao Procurador Geral da República do México, Eduardo Medina Mora, manifestando sua preocupação pelas acusações contra três homens no caso do assassinato do jornalista norte-americano Brad Will]

24 de outubro de 2008

Eduardo Medina Mora, Procurador Geral da República

Ciudad de México, México

Por fax: 52-55-5346-0901

Exmo Procurador Medina Mora,

O Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ) está muito preocupado pelas novas informações sobre a investigação do assassinato do jornalista norte-americano Bradley Roland Will, ocorrido em 27 de outubro de 2006 em Oaxaca. A recente acusação contra três manifestantes ignora evidências importantes que indicam que pistoleiros pró-governamentais são os responsáveis pelo assassinato.

Em 21 de outubro, o juiz de Oaxaca Luis Salvador Cordero determinou que o suspeito Juan Manuel Martínez Moreno seja julgado pelo assassinato de Will, de acordo com os informes da imprensa. Outros dois suspeitos, Octavio Pérez Pérez e Hugo Colmenares Leyva, foram acusados como cúmplices e, em seguida, libertados sob fiança, informou o jornal Milenio da Cidade do México.

Will, de 36 anos, trabalhava para a agência de imprensa Indymedia, radicada em Nova York, e morreu quando fazia a cobertura de um confronto, nos arredores da capital estadual, entre partidários do governo armados e manifestantes, muitos dos quais pertenciam ao movimento de esquerda conhecido como Assembléia Popular dos Povos de Oaxaca, a APPO. Durante meses, o movimento de esquerda tomou o controle de algumas partes da capital, exigindo a renúncia do governador de Oaxaca, Ulises Ruiz, segundo as investigações realizadas pelo CPJ.

O CPJ entrevistou testemunhas, o médico forense de Oaxaca, e outras pessoas para compilar o informe investigativo divulgado em 2007 ‘A Killing in México‘ (‘Um Assassinato no México’). Will e outros jornalistas que documentavam os distúrbios se encontravam entre os manifestantes no dia do assassinato, segundo apurou o CPJ. Estes jornalistas disseram ao CPJ que partidários do governo dispararam na direção dos manifestantes. Fotografias tiradas pelos jornalistas documentam tais disparos. Um repórter fotográfico, Oswaldo Ramírez, foi atingido por um tiro na perna. Outro fotógrafo, Raúl Estrella, ouviu a bala que passou raspando por sua cabeça. Will recebeu dois tiros. A primeira bala o atingiu de frente, a segunda pelo lado. Imediatamente, os manifestantes se aproximaram de Will e tentaram reanimá-lo. Ele morreu minutos depois.

O médico forense de Oaxaca, que realizou a autópsia, concluiu que os ferimentos no corpo de Will correspondiam a disparos efetuados a longa distância. Os tiros, segundo o perito forense, não foram efetuados à queima-roupa. Mas hoje, dois anos depois da morte de Will, os promotores federais sustentam que Will foi, na verdade, atingido a curta distância. Martínez e os outros acusados, todos integrantes da APPO, estavam próximos de Will durante os confrontos.

Precedente perigoso

O CPJ acredita que as conclusões apresentadas pelo subprocurador de Direitos Humanos, Juan de Dios Castro Lozano, e o promotor especial para atenção a delitos contra imprensa, Octavio Orellana Wiarco, durante uma coletiva de imprensa em 17 de outubro, levantam dúvidas sobre a integridade da investigação federal. Os promotores não apresentaram evidência forense, declarações de testemunhas ou motivações claras e contundentes para a acusação contra Martínez e os demais suspeitos do assassinato. Ao mesmo tempo, parecem ter descartado evidências – balísticas, fotográficas e médica – que implicariam simpatizantes do governo de Oaxaca.

A ausência de evidência específica e contundente contra os acusados, e o aparente fracasso em seguir outras linhas de investigação, consternou a família de Will e equipes de trabalho independentes que têm investigado o caso, incluindo a Comissão Nacional de Direitos Humanos (CNDH).

A Procuradoria Geral da República, por sua vez, comprometeu-se a investigar crimes contra a liberdade de expressão, mas estamos seriamente preocupados com o rumo tomado por este caso. As últimas decisões dos promotores federais, que ignoram o prévio trabalho investigativo, abrem um perigoso precedente para a imprensa no México e para o direito à livre expressão, garantido na Constituição mexicana. Nós o instamos a reconsiderar as conclusões adotadas neste caso e a demonstrar que a acusação tem muito mais terreno a cobrir.

Agradecemos sua atenção a este urgente assunto e aguardamos sua resposta.

Sinceramente,

Joel Simon, Diretor Executivo

Com cópia para: Felipe Calderón, Presidente da República do México; Arturo Sarukhan, Embaixador do México ante os Estados Unidos; Juan de Dios Castro Lozano, Subprocurador de Direitos Humanos, Atenção a Vítimas e Serviços à Comunidade; Octavio Orellana Wiarco, Promotor especial para a Atenção a Delitos contra Jornalistas; Gerardo Priego Tapia, Deputado Federal por Tabasco e Presidente da Comissão Especial para Acompanhamento de Agressões contra Jornalistas e Meios de Comunicação; Comissão Nacional de Direitos Humanos; American Society of Newspaper Editors; Amnesty International; Article 19 (Reino Unido); Artikel 19 (Holanda); Article 19 (México); Canadian Journalists for Free Expression; Freedom of Expression and Democracy Unit, Unesco; Freedom Forum; Freedom House; Human Rights Watch; Index on Censorship; International Center for Journalists

******

O CPJ é uma organização independente, sem fins lucrativos, sediada em Nova York, que se dedica a defender a liberdade de imprensa em todo o mundo