Thursday, 07 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1313

Atentado contra a revista deixa 12 mortos. Os primeiros vídeos

Ao menos 12 pessoas morreram e quatro correm risco de morte em consequência do ataque com fuzis automáticos ocorrido na manhã de quarta-feira (7/1) contra a sede da revista semanária satírica Charlie Hebdo, em Paris, segundo dados oficiais. Os autores do atentado, um dos mais graves da história da França, foram três homens vestidos de preto, encapuzados e armados com fuzis Kalashnikov. O presidente François Hollande afirmou que a França vive “um momento extremamente difícil”.

O ataque ocorreu pouco depois das 11h (8h, no horário de Brasília). Os dois terroristas já entraram atirando no hall do jornal. Durante mais de dez minutos, os agressores efetuaram pelo menos 30 disparos contra os jornalistas e funcionários da publicação. Em alguns momentos, segundo uma testemunha citada por vários veículos da França, eles gritavam os nomes de jornalistas. Dezenas de funcionários refugiaram-se na terraço do edifício, situado no bulevar Richard Lenoir, no 11º distrito da capital francesa.

Entre os mortos já confirmados está o diretor da revista, Stéphane Charbonnier, conhecido como Charb, e um dos desenhistas, Jean Cabut, informaram fontes oficiais. Charb dirigia a revista desde 2009 e vivia sob escolta policial desde 2011, ano em que a editora sofreu um ataque. Tanto ele quanto outros funcionários do semanário recebiam ameaças constantes. A última capa da Charlie Hebdo foi dedicada ao livro Soumission (Submissão,em português), de Michel Houellebecq, que descreve o futuro da França caso o presidente fosse muçulmano.

Após o atentado, os criminosos gritaram "Alá é grande" e fugiram em um carro — que foi abandonado a algumas quadras do local. Eles ainda não foram identificados nem presos. De acordo com testemunhas, eles falavam em francês "sem sotaque".

O presidente francês, François Hollande, visitou o local pouco após o atentado. "É um ato excepcional de barbárie”, declarou Hollande, para onde foi acompanhado do ministro do Interior, Bernard Cazaneuve. À imprensa, Hollande disse ainda que as autoridades vão se empenhar para "perseguir" os responsáveis e levá-los à Justiça. O chefe de Estado convocou uma reunião extraordinária do Governo, que elevou ao nível máximo o “alerta de atentados” –o alerta antiterrorista. A segurança foi reforçada em veículos de imprensa, grandes estabelecimentos comerciais e no transporte público.

Charlie Hebdo estava especialmente protegida porque já havia sido alvo de ameaças e ataques menores nos últimos anos, especialmente por ter publicado, em 2006, caricaturas do profeta Maomé. Em 2011, foi atacada com coquetéis molotov e teve de fechar seus escritórios durante várias semanas. Entre as vítimas fatais do ataque de quarta-feira estão dois policiais que vigiavam a área. Uma das viaturas foi atingida por 15 tiros.

Fontes do Ministério do Interior optaram por não divulgar oficialmente nenhuma pista sobre os autores do atentado, mas consideram que a possibilidade de se tratar de um ataque de origem de fundamentalistas islâmicos “é uma opção possível”. Segundo a rede de televisão BFM, um dos terroristas teria afirmado em vídeo que estariam “vingando” Maomé.

O último tuíte publicado pela revista é uma caricatura do autoproclamado chefe do Estado Islâmico, Abu Bakr al Baghdadi, acompanhado do comentário “meilleurs voeux” (boas festas).

A França está em alerta antiterrorista desde que iniciou sua participação nos bombardeios contra o Estado Islâmico no Iraque em setembro passado. Pelo menos 1.200 militares participam do dispositivo de alerta. Porta-vozes do EI pediram em diversos vídeos que os franceses sejam atacados em qualquer lugar do mundo.

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Revista já havia sido atacada em 2011

Ana Teruel # reproduzido do El País, 7/1/2015

Em 3 de novembro de 2011, a sede do semanário satírico Charlie Hebdo – onde terroristas mataram ao menos 12 pessoas nesta quarta-feira – ficou bastante destruída por um ataque com um coquetel molotov, que provocou um incêndio e deixou as instalações inutilizadas. O ataque foi considerado uma retaliação a uma edição rebatizada como Sharia Hebdo, e dedicada ao avanço islâmico na Tunísia e na Líbia. Na capa aparece um desenho do profeta Maomé, nomeado como “redator-chefe” do número. O então primeiro-ministro, François Fillon, expressou sua “indignação” pelo atentado, que foi condenado pelo conjunto da classe política e dos meios de comunicação franceses. A capa, que já tinha provocado certa agitação nas redes sociais quando foi lançada, retrata o profeta, sorridente, prometendo “100 chibatadas àqueles que não morrerem de rir”. O número tinha como objetivo “comemorar a vitória” do partido islâmico Ennahda na Tunísia e o anúncio por parte do Conselho Nacional de Transição líbio que a sharia seria a principal fonte da nova Constituição do país. Os 75.000 exemplares distribuídos se esgotaram em poucas horas. Algumas bancas, no entanto, tinham se negado a distribuir a revista por meio de represálias.

“No Twitter, no Facebook, recebemos muitas cartas de protesto, de ameaças e de insultos”, explicou o diretor da publicação, o desenhista Stéphane Charbonnier, Charb, para quem não há dúvida de que o ataque foi obra do fundamentalismo muçulmano. Além do ataque, que destruiu o equipamento informático do semanário, o site da revista foi temporariamente pirateado e redirecionava para umas imagens de Meca com a inscrição em inglês:“No god but Allah” (Nenhum outro Deus além de Alá).

A revista, do mesmo estilo de El Jueves, já tinha recebido ameaças parecidas em 2006, quando reproduziu as caricaturas de Maomé publicadas pelo jornal dinamarquês Jyllands-Posten, em defesa da liberdade de expressão, acompanhadas por retratos de vários de seus desenhistas. No ano seguinte, a publicação foi aos tribunais, processada por várias organizações islâmicas, e foi absolvida ao considerarem que as caricaturas não atacavam o Islã, mas os fundamentalistas.

Ataque anterior incendiou parte da redação e danificou equipamentos

A classe política e os meios de comunicação da França foram unânimes em condenar o ataque e defender o direito à liberdade de expressão, alguns meios abriram suas redações aos jornalistas de Charlie Hebdo para que possam continuar trabalhando. Eles se instalaram no meio-dia da terça-feira na sede do jornal Libération.“Não importa o que acontecer, conseguiremos fazer a edição da próxima semana”, afirmou Charb.

O Conselho Nacional do Culto Muçulmano se somou às condenações, lembrando, no entanto, que fazer uma caricatura do profeta “é considerado uma ofensa pelos muçulmanos”.

Veja também

Cartunistas homenageiam vítimas de ataque à revista francesa – UOL

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Carlos Yárnoz e Ana Teruel, do El País