O artigo ‘O crescimento dos observatórios no Brasil‘, publicado neste Observatório, contém dados que precisam ser contestados. O mais importante refere-se ao registro da primeira concepção dos observatórios da imprensa de formato ‘fiscal’ dentro e fora da comunidade científica.
Segundo seus autores esta inédita concepção deve ser atribuída a Armand Matttelart e Ignacio Ramonet, especialmente a este, que ‘em artigo de ampla repercussão propõe que os observatórios de imprensa sejam caracterizados como `Quinto Poder´ (…) um novo núcleo de poder cujo protagonista seria a sociedade civil (…) apresentando-se ao mesmo tempo como uma instância que ultrapassa as figuras do ombudsman e do defensor do leitor ou os códigos deontológicos das empresas jornalísticas’ etc., etc.
Embora assíduo freqüentador de eventos na América Latina, Ignacio Ramonet não tem obrigação de saber português e de acompanhar com a devida atenção as discussões e inovações que ocorrem no universo midiático brasileiro.
Os autores do texto, altamente qualificados nos meios acadêmicos, não poderiam desconhecer um texto publicado com destaque em 2007 neste Observatório da Imprensa onde se demonstra que Ramonet utilizou no seu badalado artigo e aulas magnas conceitos amplamente discutidos neste Observatório e no Labjor da Unicamp desde 1994.
Calças rasgadas
Ramonet fala em Quinto Poder – numeração errada já que o lugar pertence ao Ministério Público – e este OI foi mais amplo e até mais dialético ao afirmar que cada poder cria automaticamente um contrapoder – e o legítimo contrapoder da imprensa é representado pela crítica aos meios de comunicação (media-criticism).
Ramonet foi rigorosamente corporativo imaginando organizações semi-abertas, destinadas apenas a jornalistas, pesquisadores e usuários. Este OI foi mais social, mais público e mais democrático ao propor que o contrapoder da mídia deve ser exercido por todos aqueles que se consideram mal servidos por ela.
Se os autores do trabalho acionassem o mecanismo de busca deste OI teriam encontrado em poucos minutos o farto material que segue abaixo. Não foi por preguiça que deixaram de fazê-lo (o minucioso texto que assinam é recheado de quadros, remissões e referências – commme il faut). Simplesmente não queriam dar a impressão que refutavam o eminente e emérito Ramonet ou impugnavam suas primazias. Era mais cômodo passar ao largo do que fazem seus compatriotas.
Ramonet é o exemplo perfeito do franco-centrismo contemporâneo: descobriu a América e quer ser festejado por lá. Já seus denodados admiradores em Pindorama não se importam em repetir aquela velha situação dos cortesões que preferem o rei nu a adverti-lo de que suas calças estão rasgadas.
Este é o texto que deveriam ter lido antes de escrever o seu: ‘Bem-vindo ao Observatório, Monsieur Ramonet‘.
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Como a mídia cobre a mídia – OI na TV, 28/3/2007
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Dois escândalos simultâneos – A.D. [5/1/1997]
Editorial do OI na TV nº 57 (1/6/1999) [rolar a página] – A.D.