POLÍTICA
Vozes liberais
‘Quase ao mesmo tempo, Paul Krugman, Robert Reich e Al Gore – na esteira das estripulias e dos fracassos do governo Bush – publicaram três livros: The Conscience of a Liberal, Supercapitalism e The Assault on Reason. São livros de combate político e ideológico, que pretendem esclarecer o público americano sobre a natureza das transformações ocorridas nos últimos 40 anos na economia e na sociedade dos Estados Unidos da América.
Na gramática política americana, os liberais, na boa tradição do excepcionalismo yankee, são adversários do liberalismo econômico. Adeptos da intervenção do Estado na economia, assim como os progressistas, não trepidam em apontar os riscos do capitalismo entregue a si mesmo, ou seja, aos excessos e às insuficiências do mercado desregulado. Os excessos do Supercapitalism – assim proclama Reich – foram gestados ao longo das últimas décadas. Estão, agora, a estrebuchar na agonia da destruição de renda e de riqueza. Na contracapa dos excessos, as insuficiências agravaram as desigualdades inscritas na sintaxe da sociedade de classes.’
INCLUSÃO
O ‘laptop de 100 dólares` não custa 100 dólares
‘Em meados de novembro, Nicholas Negroponte, criador do projeto Um Laptop por Criança (One Laptop per Child ou OLPC), enviou um e-mail a interessados. Informava que, agora, o chamado computador de 100 dólares estava disponível para qualquer consumidor que o quisesse. ´O OLPC oferece uma oportunidade única de providenciar laptops às crianças mais pobres e remotas do mundo. Você tem a oportunidade de dar um, além de obter um próprio, por 399 dólares. Ou dar muitos, se quiser.´
Isso é um sinal de problemas para o OLPC. A idéia original era de exclusividade. O laptop seria dado gratuitamente a crianças em idade escolar pelos governos, em sua maioria em países em desenvolvimento. O computador esteve em testes no Camboja, na Índia, na Nigéria, no Brasil, no Peru e em outros lugares. A receptividade das crianças sempre foi boa, mas os governos não foram tão entusiastas. O ministro da Educação da Nigéria, doutor Igwe Aja-Nwachuku, disse à BBC que o país tinha outras prioridades: ´Qual é o sentido de introduzir o OLPC, quando eles não têm onde sentar para aprender, quando não têm uniformes para ir à escola, quando não têm a estrutura adequada?` A Nigéria tinha o plano de comprar 1 milhão dos computadores de Negroponte.
O OLPC também não chegou a custar os prometidos 100 dólares. Custa 188 dólares, fora os custos de envio. O criador do projeto esperava que os governos fizessem pedidos maiores, o que levaria a uma produção em maior escala e a queda no preço, mas isso ainda não aconteceu. A primeira leva deve ter 300 mil computadores, e a metade deles não chegará às mãos de uma criança. Deve contemplar aqueles que podem comprar um pela oferta de 399 dólares.
Outro empecilho ao sucesso da empreitada foi a competição da Intel e da Microsoft, porque o OLPC roda um sistema operacional aberto baseado em Linux com um processador AMD. O Classmate, da Intel, roda uma versão mais básica do Windows e custa entre 230 e 300 dólares. A Líbia quer comprar 150 mil desses PCs e afirma serem muito melhores do que o OLPC. ´Não quero que meu país seja um ferro-velho para essas máquinas´, disse Mohamed Bani, gerente do comitê de assessoria técnica do governo líbio, ao Wall Street Journal.
O pecado do OLPC é ser uma excelente idéia. É um computador capaz de se conectar à internet, criar redes sem fio. Possui uma tela com boa visibilidade, mesmo contra a luz direta do sol, consome pouquíssima energia (um décimo de um laptop normal) e até por isso pode ser recarregado mecanicamente pelo usuário, por meio de uma manivela. Fundamentalmente, o OLPC funciona sem precisar de uma tomada, algo importante para crianças em áreas sem rede elétrica.
E por ser uma boa idéia, o projeto foi apropriado por empresas gigantes do mercado da tecnologia, que têm, como é natural, o lucro como objetivo final. Como disse Negroponte no e-mail: ´O OLPC é um projeto educacional, não um projeto de laptop. Crianças são uma missão, não um mercado´. É pena que governos não tenham entendido a mensagem.’
LAERTE
O cômico soturno
‘De março de 2005 para cá, houve uma grande transformação nas tiras em quadrinhos criadas pelo cartunista paulistano Laerte Coutinho e espalhadas desde os anos 70 por vários jornais e revistas do Brasil. Aos poucos, elas se tornavam mais densas, soturnas, vazadas de sangue, por vezes aparentemente indecifráveis.
Segundo conta Laerte, o jornal capixaba A Tribuna de Vitória suspendeu a colaboração, por conta de uma tirinha em que a cabeça de um poodle era utilizada como bola de golfe. Diz que o diário gaúcho Zero Hora foi explícito: ´Na hora de renovar o contrato, não renovaram, disseram que não estavam mais interessados porque eu estava fazendo tiras muito sem graça´.
Muita coisa acontecia naquele ano enquanto Laerte desenhava tiras como aquela publicada em 12 de abril na Folha de S.Paulo, em que um homem em situações cotidianas descobre, ensangüentado, que lhe cortaram fora sucessivamente um polegar, a orelha esquerda e um pé. No ambiente público, o deputado Roberto Jefferson virava protagonista e difundia o mote do ´governo mais corrupto da história´. Na vida privada, o cartunista enfrentava a morte do filho de 22 anos, num acidente de carro.’
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