O governo brasileiro, por meio da Advocacia Geral da União (AGU), resolveu tomar uma atitude com relação à imagem da mulher brasileira no exterior. Tirou de circulação o guia Rio for Partiers – escrito em inglês, por um brasileiro. Não há dúvida que evitar qualquer atitude contra o turismo sexual é louvável. O estranho é a decisão de começar a agir com a proibição do guia quando ele chega à sua sétima edição. Será que as ‘popuzudas’ (o termo ofensivo citado no argumento legal contra o guia) foram um acréscimo desta última edição, ou será que só agora a Embratur (que moveu o processo contra a editora) se deu conta da ofensa?
Eis a notícia publicada pelo UOL na segunda-feira (24/8):
O guia turístico com visão preconceituosa sobre mulheres brasileiras, Rio For Partiers, deve ser retirado de circulação imediatamente. Essa foi a decisão do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2), após recurso apresentado pela Advocacia-Geral da União (AGU), em defesa da Empresa Brasileira de Turismo (Embratur). O conteúdo do guia foi considerado ofensivo à Política Nacional do Turismo e incitante do turismo sexual. Além disso, a publicação usa irregularmente o selo Marca Brasil (conhecido como ‘Olodum’), criado para divulgar o país no exterior… Pelo teor da publicação, restam violados os princípios da Política Nacional de Turismo e um dos fundamentos do próprio Estado Democrático de Direito – a dignidade da pessoa humana, tendo em vista a exposição vexatória do povo brasileiro com o intuito de promover a exploração sexual. O guia também apresenta uma indicação de locais para os turistas que buscam sexo na cidade do Rio de Janeiro’.
‘Bode expiatório’
Embora se trate de censura, a notícia não parece ter sensibilizado os jornais. Nem mesmo o Estado de S.Paulo, que todo dia enfatiza o fato de estar sofrendo censura prévia no noticiário sobre as investigações contra o filho do senador José Sarney, tocou no assunto. Segundo notícia da Folha, o editor, procurado depois da decisão, não quis falar sobre o caso.
O editor Cristiano Nogueira, no entanto, usou o site da sua editora para se defender: ‘O livro Rio For Partiers está na sua sétima edição e com grande aplauso dos críticos. Divulga o lado humorístico, jovial, moderno e esportivo da fantástica cidade do Rio e já ganhou três prêmios internacionais na categoria de publicações turísticas’.
E diz mais:
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‘O erro da AGU/Embratur mais grave foi tirar duas páginas do livro fora de contexto, e avaliar somente essas duas páginas, como se fossem um estudo antropológico sobre o Rio. O Rio For Partiers é um guia do Rio de Janeiro altamente opinado e humorístico, e por isso ninguém leva a sério.’**
‘A Embratur está seletivamente atacando o Rio For Partiers, por motivos ainda desconhecidos pela nossa parte, já que todos outros guias turísticos do Rio falam sobre a sexualidade carioca. Por que não censurar esses outros?’**
‘Usaram uma edição já fora de circulação, a 4ª edição do Rio For Partiers, que saiu em 2005. Na atual edição não usamos o termo ‘sex machine’ e sim ‘sex bomb’, cuja tradução mais próxima seria ‘ultra-sexy’.’**
‘O pedido de retirar um livro de circulação se enquadra como censura, algo que não é permitido na Constituição.’**
‘Foi a Embratur que vulgarizou a imagem da brasileira, por 25 anos, ao divulgar pôsteres com mulheres ‘gostosudas’ de biquíni segurando frutas tropicais perto do rosto. Usaram esses pôsteres ate a década de 90. Esse passivo é uma carga negativa, e, provavelmente, querem transferir essa culpa para qualquer outro. Sou um simples e conveniente bode expiatório.’Imagem do Brasil
Gostaria muito – e acho que a imprensa deve isso aos leitores – de saber como os homens cariocas reagiram às classificações de ‘pit-bull’ (o encrenqueiro) e ‘mauricinho’. E como a comunidade gay reagiu ao glossário publicado no guia. Se o tratamento for considerado igualmente ofensivo, talvez o erro maior do editor seja confundir preconceito e grosseria com uma visão bem humorada das pessoas.
É uma pena que, apesar de um objetivo louvável – acabar com o turismo sexual no Brasil – a Embratur tenha patrocinado um episódio de censura – que não é, nunca foi e jamais será uma forma de solucionar problemas ou melhorar a imagem do país lá fora. É uma pena também que a imprensa, quando se trata de censura, só se manifesta quando diretamente atingida.
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Jornalista