Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Censura nunca mais

Abolida formalmente pela Constituição de 1988, a censura prévia persiste no Brasil. Ainda que isolados, os casos se multiplicam, exigindo considerável dispêndio de esforços e de tempo até que, chegando às instâncias superiores do Judiciário – quando chegam –, desmandos evidentes sejam revogados.

Completaram-se na semana passada 90 dias de censura ao jornal O Estado de S.Paulo, impedido de publicar notícias referentes a uma operação da PF envolvendo o filho do presidente do Senado, José Sarney.

Segundo a ANJ (Associação Nacional dos Jornais), outros casos de violência contra o direito da sociedade à informação se registraram recentemente.

O jornal O Povo, do Ceará, foi proibido por decisão judicial de noticiar o andamento de um processo sobre o jogo do bicho naquele Estado. Na Bahia, o jornal A Tarde conheceu a censura prévia para quaisquer notícias a respeito de um desembargador, acusado de suposta venda de votos. Em Florianópolis, decidiu-se pela apreensão de um jornal (e a retirada de seu site na internet) por trazer acusações contra o prefeito da cidade. Nesta Folha, o colunista José Simão teve silenciados seus comentários humorísticos a respeito de uma atriz de telenovela.

Incerteza jurídica

A defesa da plena liberdade de expressão e do direito à informação não exclui, por certo, que jornalistas e órgãos de comunicação venham a ser responsabilizados pelos deslizes e abusos que cometam. Nos planos penal e civil, a sociedade conta com mecanismos capazes de coibir violações da honra e da privacidade dos cidadãos.

Todavia, parece ainda mal compreendida – mesmo em alguns meios jurídicos – a diferença entre censurar um órgão de comunicação e puni-lo pelo que publicou. A censura prévia é um prejulgamento: incide sobre o comportamento futuro de quem a sofre. Qualquer que seja o teor do que viria a ser publicado, suspende-se de pronto, e arbitrariamente, o direito básico de exprimir-se e de informar.

Desde que o Supremo Tribunal Federal considerou inconstitucional, em sua totalidade, a Lei de Imprensa promulgada pela ditadura militar, inaugurou-se um período de incerteza jurídica. A censura prévia, inadmissível pela Constituição, tende a reaparecer em decisões judiciais de primeira ou segunda instância, sem que o princípio constitucional que a abomina possa ser invocado de imediato.

Histórico de arbitrariedades

Felizmente, uma iniciativa no sentido de corrigir essa tendência parece a caminho. Ainda a ser publicado, o acórdão do Supremo acerca do fim da Lei de Imprensa deverá incluir uma condenação explícita à censura prévia, em qualquer circunstância.

A elucidação, em tese, não deveria ser necessária, uma vez que a Constituição afirma o princípio com todas as letras. Todavia, dado o impressionante histórico recente de incompreensões e de arbitrariedades em torno do tema, a atitude do STF não poderia ser mais oportuna.