O Superior Tribunal de Justiça reafirmou o entendimento de que chats de sites jornalísticos estão submetidos às regras da Lei de Imprensa e não ao Código Penal. A decisão foi tomada pela Corte Especial, no dia 16 de agosto, no julgamento de Embargos de Declaração do ministro aposentado Edson Vidigal.
Vidigal apresentou queixa-crime contra o procurador regional da República José Pedro Taques. O fato ocorreu em dezembro de 2003, quando o site Mídia News, de Cuiabá (MT), publicou afirmações do procurador em entrevista na sala de bate-papo. Para Vidigal, as afirmações ofenderam sua honra. No entanto, ele só ajuizou a ação em maio de 2004.
O STJ entendeu que o chat é regulado pela Lei de Imprensa, que em seu artigo 12 descreve: ‘são meios de informação e divulgação, para os efeitos deste artigo, os jornais e outras publicações periódicas, os serviços de radiodifusão e os serviços noticiosos’.
O ex-presidente do STJ, Edson Vidigal, sustenta que o delito não pode ser enquadrado na Lei Imprensa, mas sim no artigo 140 do Código Penal. O dispositivo prevê as punições nos casos de injúria e ofensa à dignidade ou decoro.
Segundo o ministro aposentado, ‘não se pode considerar internet como imprensa, pois, a vingar esse raciocínio, os atos judiciais publicados nos sites oficiais dos tribunais terão de valer como marco inicial da intimação e não é assim que ocorre, porque considera-se realizada a intimação pela publicação no órgão oficial (artigo 236 do CPC)’.
O relator, ministro Fernando Gonçalves, entendeu que a ação deveria ser extinta, com base no prazo de prescrição de três meses, previsto na Lei de Imprensa, e não o prazo de seis meses, conforme o Código Penal.
Segundo o relator, as supostas ofensas tiveram ampla e irrestrita publicidade por terem sido publicadas no site e, por isso, vale a Lei da Imprensa. Ele comparou a hipótese ao caso de uma ‘entrevista proferida em um auditório de um jornal impresso, restrita a um limitado número de pessoas, mas que é publicada nas páginas do mesmo periódico’.
Edson Vidigal contestou. Segundo ele, pelo fato de as supostas ofensas terem sido ditas em um chat, as afirmações ficaram restritas àqueles que participavam da discussão virtual, sem alcançar a publicidade ampla que justificaria a incidência da Lei de Imprensa.
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A íntegra da decisão
EDcl no AgRg na AÇÃO PENAL Nº 442 – DF (2005/0199167-5)
RELATÓRIO
EXMO. SR. MINISTRO FERNANDO GONÇALVES:
Trata-se de embargos de declaração opostos por EDSON CARVALHO VIDIGAL contra acórdão que guarda a seguinte ementa:
‘PENAL. INJÚRIA. PUBLICAÇÃO OFENSIVA. SITE DA INTERNET. APLICAÇÃO DA LEI DE IMPRENSA. DECADÊNCIA. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE.
‘1 – Uma entrevista concedida em um chat (sala virtual de bate-papo), disponibilizada de modo ‘on line’ na home page de um jornal virtual, se reveste de publicidade bastante para se subsumir ao art. 12 da Lei nº 5.250/67 e, pois, atrair a incidência do prazo decadencial de três meses (art. 41, §1º).
Precedente da Corte Especial e da Quinta Turma – STJ.
2 – Extinção da punibilidade decretada.
3 – Agravo regimental não provido.’ (fls.261)
Afirma o embargante violação ao princípio do devido processo legal, matéria de natureza constitucional, cujo prequestionamento alvitra, com o escopo de submeter a matéria ao crivo do Supremo Tribunal Federal.
É o relatório.
Os argumentos defendidos pelo embargante, para dar supedâneo à pretensa violação ao devido processo legal, na verdade, já foram ampla e claramente decididos pelo acórdão em apreço, ou seja, a questão da subsunção de publicação ofensiva, via periódico virtual (internet), apta a atrair a aplicação do prazo de decadência da Lei de Imprensa.
Nesse sentido o julgado é de tranqüila intelecção:
‘A irresignação não merece acolhida, porquanto as palavras proferidas pelo querelado, no caso concreto, apesar de terem sido em um chat, uma sala virtual de bate-papo, o que, em tese, estaria a atrair a incidência do art. 140 do Código Penal, foram publicadas na home page do jornal ‘MidiaNews’, caracterizando, portanto, crime de imprensa.
Veja-se que o documento de fls. 23-32, trazendo a íntegra do que foi dito, é intitulado ‘Entrevista online’, com o logotipo do periódico ao lado. A publicidade, pois, foi ampla e irrestrita, porque todo aquele que acessou a página do jornal naquele dia teve conhecimento da entrevista e, como é óbvio, do seu conteúdo. Na verdade é o mesmo que considerarmos uma entrevista proferida no auditório de um jornal impresso, restrita a um limitado números de pessoas, mas que é publicada nas páginas do mesmo periódico. Ou ainda, é o mesmo que transmitir, ao vivo, uma entrevista televisiva, ocorrida nas dependências de uma empresa de teledifusão. Não há como fugir da incidência do art. 12 da Lei de Imprensa.’ (fls. 252)
Além do mais, baseia-se o julgamento não só em doutrina sobre o tema, mas também em precedente de órgãos julgadores deste Tribunal, inclusive da Corte Especial, sua expressão máxima.
Não ocorrem, portanto, nenhuma das hipóteses do art. 619 do Código de Processo Penal, impróprio o intento de prequestionar, por si só, para atribuir força bastante a ensejar o acolhimento dos embargos.
A propósito transcrevo:
‘Processual Civil. Recurso Especial. Embargos Declaratórios (art. 535, I e II, CPC).
I. Sem a ocorrência das restritas hipóteses legais autorizadoras (art. 535, I e II, CPC), os embargos declaratórios não têm cabimento.
2. O fito de prequestionamento da via extraordinária, por si, não viabiliza os embargos.
3. Embargos não conhecidos.’ (DEREsp 159.275- SP, Rel. Min. MILTON LUIZ PEREIRA, DJU, 28.05.2001)
‘Recurso especial. Falta de prequestionamento. Improcedência da alegação de ofensa ao art. 535, II, do Cód. de Pr. Civil. Súmulas 282/STF e 211/STJ.
1. A mera oposição de embargos de declaração, por si só, não é suficiente para prequestionar o tema cujo conhecimento se pretende devolver ao STJ.
2. A interposição de recurso especial com base em violação no art. 535, II, do Cód. de Pr. Civil só é possível se despropositada a rejeição dos embargos de declaração pelo tribunal de origem.
3. No caso, o colegiado local pronunciou-se sobre todos os temas acerca dos quais deveria; não tendo sido provocado antes, não cabia mesmo a ele manifestar-se a respeito da ilegitimidade passiva da União.
4. Agravo regimental improvido.’ (AgRgResp 716.400/ RS, Rel. Min. NILSON NAVES, DJ de 17.10.2005)
‘PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.
1 – Não ocorrentes as hipóteses do art. 535 do CPC, é de rigor a rejeição dos embargos, ainda que tenham também o escopo de prequestionar eventuais violações a dispositivos constitucionais, aptas a viabilizar a interposição de recurso extraordinário, o que, por si só, não tem força bastante para o acolhimento da súplica.
2 – Embargos declaratórios rejeitados.’ (EdclAgRg na Rcl 1164/SP, Rel. Min. FERNANDO GONÇALVES , DJ de 26.06.2006)
Rejeito os embargos.
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Repórter do Consultor Jurídico