Friday, 27 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Cobertura deficiente

Enquanto nos ‘penalizamos’ ao ver deficientes físicos ou mentais, alguns deles se tornam cada vez mais eficientes naquilo que fazem. Um exemplo disso são os atletas paraolímpicos. Em 19 de setembro de 2004, o Brasil levou para Atenas 98 paratletas, que voltaram com 33 medalhas. Em 29 de agosto, 20 dias antes, os atletas olímpicos regressavam ao país com 10 medalhas, apesar de seus 247 atletas. A mídia fez um grande ‘estardalhaço’ diante de um apático 16º lugar nas Olimpíadas de Atenas, e apenas citou o alto rendimento dos atletas paraolímpicos.

Apesar de os deficientes se mostrarem competentes e talentosos, a sociedade ainda acredita em sua incapacidade, e os meios de comunicação refletem essa mentalidade. Estamos numa sociedade dita inclusiva, mas na qual o preconceito com o deficiente é ainda muito grande. Segundo Claudia Werneck em seu livro Ninguém mais vai ser bonzinho, na sociedade inclusiva o preconceito em relação à deficiência se revela de inúmeras e discretas formas, e o da mídia também. No deficiente já está incutido o arquétipo da incapacidade, sendo a atuação do jornalista de suma importância no processo de desmistificação desse arquétipo. Contudo o que a mídia faz é refletir uma imagem imprecisa e incompleta daqueles que superam suas limitações, o que torna impossível reconhecer-se nelas.

O ‘exótico-humano’

Sendo assim, vemos que enquanto os Jogos Olímpicos são divulgados à exaustão, os Jogos Paraolímpicos ficam relegados a uma ínfima cobertura jornalística, não existem favoritos ao podium, nem mesmo depósito de confiança e esperança nas atividades esportivas desses atletas. Aqueles que conseguem uma imagem positiva na mídia, devido às suas vitórias, são tidos como símbolo de superação, e à sociedade cabe somente a função de reconhecer e aplaudir o sucesso daqueles que teriam vencido as suas próprias limitações.

Os meios de comunicação fazem com que as pessoas tenham compaixão por esses paratletas. Portadores de qualquer deficiência ou doença devem ganhar não a solidariedade, mas o respeito e a confiança da mídia. Materiais jornalísticos sobre esse assunto não devem causar compaixão, mas levar a uma reflexão.

A sociedade continua sem (in)formação para acreditar nas potencialidades dessas pessoas. A diferenciação que os meios de comunicação fazem entre as Olimpíadas e as Paraolimpíadas é o maior exemplo de que a mídia, como reflexo da sociedade (ou o inverso), constrói uma realidade para ser consumida pelo público, já que mostrar a deficiência só dá ‘ibope’ em situações que explicitem o ‘exótico-humano’. Os atletas paraolímpicos são de alto rendimento e o esporte paraolímpico é eficiente, já a cobertura midiática é deficiente.

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Mestre, professor da Faculdade de Comunicação Social da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF); graduanda do curso de Comunicação Social da UFJF