Há 17 anos assumi com a sociedade o compromisso de manter um jornal que tivesse como único compromisso divulgar a verdade e só a verdade. Para não sofrer nenhum tipo de restrição, o Jornal Pessoal, fundado em setembro de 1997, nunca aceitou publicidade e jamais condicionou a apuração dos fatos a fatores subjetivos e objetivos condicionantes. O limite da sua atuação sempre foi sua capacidade de investigação e raciocínio.
Exercido com dedicação total e aplicação máxima, esse compromisso levou o redator solitário do jornal a passar por muitos dissabores: ameaças de morte, processos judiciais, pressões. Mas no último dia 21, vivi uma experiência nova: a agressão física. Não em cena de rua, em meio a tumulto, num conflito. Encontrava-me num dos mais sofisticados restaurantes de Belém, que funciona em um parque público, onde antes era a residência oficial do governador. Como faço às sextas-feiras, almoçava com um grupo de amigos do ‘senadinho’.
Meia hora depois, ali também chegou o diretor corporativo das Organizações Rômulo Maiorana, o principal grupo de comunicação do Pará e do Norte do país. Ronaldo Maiorana estava acompanhado de um amigo. Sentou em uma mesa atrás da minha, ficando às minhas costas. Continuamos normalmente nosso almoço, embora, a princípio, houvesse uma tensão mal disfarçada à mesa. É que a última edição do Jornal Pessoal trouxera, como matéria de capa, um artigo sobre o desmesurado poder exercido pela corporação da qual Ronaldo era um dos proprietários. E o exercício abusivo desse poder como fonte de desinformação, manipulação e coação da sociedade paraense, submetida a um verdadeiro monopólio das comunicações, certamente o maior do Brasil.
Passados 40 minutos, um dos integrantes da mesa, o arquiteto Paulo Cal, recém-designado para a diretoria de planejamento da Companhia de Desenvolvimento da Área Metropolitana de Belém (Codem), saiu da nossa mesa e foi sentar-se com Ronaldo, do qual é amigo também. Subitamente, o diretor das ORM se levantou, partiu na minha direção e começou a me agredir, pegando-me de costas e de surpresa. Deu-me um soco, puxou-me pela camisa (arrebentando-lhe os botões todos), aplicou-me uma gravata e me empurrou com toda violência. Cai sobre cadeiras, arrastando pratos e copos. No chão, fui chutado, enquanto Ronaldo, com a cobertura de dois seguranças pessoais (ex-PMs ou ainda integrantes da corporação) gritava, dizendo que me mataria ali ou depois, quando me encontrasse de novo. Nunca mais eu iria falar da família dele. Quando finalmente consegui me levantar e começar a reagir, verbalmente, os seguranças arrastaram Ronaldo Maiorana, que assim escapou ao flagrante (uma viatura da PM, que eu chamei por telefone imediatamente, só chegou ao local 20 minutos depois).
‘No pasarán’
A agressão foi cometida num dos mais conhecidos restaurantes da cidade, que integra um espaço público, administrado pelo governo do Estado, através da Secretaria de Cultura. Esse espaço é protegido por uma empresa particular de segurança, paga pelo governo. Nenhum dos seguranças que estavam de serviço interveio para proteger um cidadão que estava sendo vítima de um crime grave, agressão física combinada com ameaça de morte. O agressor não teve qualquer escrúpulo diante de um restaurante lotado, com mais de 120 pessoas presentes, de agredir covardemente uma pessoa que estava desprotegida. A certeza da impunidade e a presunção do próprio poder, ilimitado, devem tê-lo estimulado a consumar a covarde agressão.
O fato é ainda mais grave porque Ronaldo é presidente do PL local e dirige uma empresa jornalística, exatamente quando a imprensa, em conjunto com outras representações da sociedade, participa de uma campanha nacional contra o desarmamento e a violência. No Pará, um jornalista é o agente da violência, contando com a cumplicidade do seu poderoso grupo de comunicação para coagir, constranger, intimidar e punir os que lhe são desafetos.
Como Ronaldo Maiorana proclamou, aos brados, que vai me matar para que eu ‘nunca mais fale’ de sua família, a partir de agora ele é o responsável por qualquer violência que me vier a acontecer, seja a praticada pessoalmente por ele, seja a acertada com seus cães de fila, sobre os quais pesa a suspeita de integrarem a corporação de polícia organizada para defender a coletividade.
Não me intimidarei. Continuarei a fazer o jornalismo que sempre fiz ao longo de quase 40 anos e a reagir a todas as violências, contra mim e contra terceiros. Tomarei também as providências administrativas e judiciais cabíveis contra esse cidadão que se considera acima do bem e do mal, dono do Estado.
Como não estou à venda, não sou covarde e jamais me curvei aos prepotentes, mesmo que esteja ao seu alcance o maior dos poderes, faço minhas as famosas palavras da lendária heroína espanhola, La Pasionária: ‘No pasarán’. Não passarão sobre mim pessoas indignas como Ronaldo Maiorana.
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Jornalista em Belém