Em ‘A favor de cotas no mestrado‘ (Correio Braziliense, 15/5/2010), lemos que Dilma Rousseff se manifesta favoravelmente à adoção de cotas raciais para mestrado e doutorado durante o encontro nacional de negras(os) do PT. A pré-candidata afirmou ainda que ‘temos que ter compromisso com a saúde negra. Temos que ter negros no Itamaraty (…)’. Mencionou também que o presidente Lula visitou todos os países da África e a criação da Sepir. Claro que a presidenciável de forma alguma desapontaria os militantes negros e negras de seu partido, mas cotas para mestrado e doutorado talvez seja pesar na mão.
A discussão vai para outro rumo em ‘Após seis anos, UFRJ volta a debater adoção de cotas raciais‘ (O Estado de S.Paulo, 15/5/2010). Trata-se de uma proposta do economista Marcelo Paixão que afirma haver um ‘certo desconforto’ pelo fato de a maior universidade do país não ter um sistema de cotas. Não é de se estranhar se as coisas continuarem assim, principalmente no que depender do reitor da universidade, Aloisio Teixeira, que declarou: ‘No Brasil, só 2% ou 3% dos jovens de 18 a 24 anos têm acesso às instituições públicas. Estabelecer cotas para um universo tão pequeno não modifica a realidade. A luta tem de ser para que a universidade se transforme e absorva uma quantidade cada vez maior de jovens.’
Tonalidade agressiva
Um posicionamento ao gosto do sociólogo Demétrio Magnoli, autor de outra peça contra as cotas raciais em ‘Ensinando o ódio‘ (O Estado de S. Paulo, 13/5/2010). Comentando uma fala do filósofo Renato Janine Ribeiro, Magnoli retoma sua ladainha já meio que batida na qual a criação de cotas para negros representa uma política deliberada para dividir o país identitariamente. Para reforçar seu argumento, utiliza exemplos dos EUA, África e Índia, onde afirma que políticas semelhantes não deram resultados, geraram apenas ódio e matança.
‘No Brasil, percorremos a etapa inicial dessa trajetória pedagógica. Como em tantos outros lugares, tenta-se ensinar o ódio primordialmente na escola’, pontifica o autor. Vejo mais ódio na sua tonalidade agressiva: ‘O MEC distribui livros didáticos dedicados a dividir os jovens estudantes em `brancos´ (…) e `negros´ (…), enquanto suas comissões de seleção aplicam as diretivas oficiais para excluir as obras que não retratam o Brasil como o país binacional.’ Se é assim, então gostaria que Magnoli explicasse o fato de assinar seu nome em uma coleção de livros didáticos de geografia aprovada no PNLD (Programa nacional de Livros Didáticos).
Discurso eleitoreiro?
O tema das cotas para negros ainda não saiu da ordem do dia. Enquanto universidades ainda debatem se vão adotar cotas raciais em seus vestibulares, os movimentos negros reivindicam cotas para pós-graduação. Um tema tão espinhoso passa longe de ser pacífico e, certamente, se levado adiante, não vai deixar de mobilizar os intelectuais defensores do argumento da discriminação reversa, como Magnoli, da academia e outros tantos na imprensa. A observação da história de outros países que adotaram ações afirmativas e sua possível distorção continuará, então, servindo de arma argumentativa contra as cotas raciais no Brasil. Mas cotas para pós-graduação?
A fala, já referida, da presidenciável Dilma Rousseff, aponta na direção da criação de cotas para mestrado e doutorado. Seria, no calor do momento, uma forma de ganhar a confiança de seu público no palanque? Ou será mesmo que passa pela cabeça de Dilma implementar cotas raciais nestes níveis de formação universitária? Seja como for, a pré-candidata já se manifestou como favorável ao tema, mas questionamos: aumentar o acesso dos negros ao ensino superior já não é o bastante para que quando profissionais formados trilhem seus caminhos sem o artifício das cotas?
As pesquisas indicam que os cotistas não rebaixaram o nível do ensino superior, como profetizavam os detratores desta ação afirmativa, mas a idéia de cotas para pós-graduação é uma desnecessidade que espero não passar de discurso eleitoreiro.
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Professor de História, Ponta Grossa, PR