Como toda revolução nas comunicações, a internet produziu uma série de efeitos inesperados com os quais sociedades e governos precisam lidar. Por vezes, não existem nem mesmo instrumentos jurídicos para abordar as novas realidades.
É nesse contexto que o governo apresenta seu projeto de marco regulatório civil para a rede. A proposta, que vai a consulta pública antes de ser encaminhada para o Congresso, parece equilibrada.
Ela ao menos soube escapar dos excessos que marcaram o polêmico projeto de legislação penal para a internet -apelidado de Lei Azeredo- que tramita no Legislativo.
Em suas versões iniciais, o substitutivo do senador tucano previa que cada internauta se cadastrasse antes de logar-se na rede e exigia que os provedores atuassem como policiais, monitorando os passos cibernéticos de seus clientes e os delatando à menor suspeita de abuso. Essas invencionices acabaram ceifadas da proposta.
Quando se trata de regular a internet, é preciso atuar com moderação, pois eventuais excessos legiferantes, dado o caráter transnacional da rede, acabam se revelando inócuos e até mesmo contraproducentes.
Delito de opinião
O paralelo é com a invenção dos tipos móveis por Johannes Gutenberg, em torno de 1455. Antes da imprensa, o número de manuscritos em circulação na Europa se contava em milhares. Cinco décadas depois, em 1500, havia mais de 9 milhões de livros no Velho Continente. No início, foram impressas bíblias, hagiografias, livros de orações e material religioso. Logo, porém, vieram obras laicas e, pior, as ‘subversivas’.
Em 1559, a Igreja Católica emite o primeiro ‘Index Librorum Prohibitorum’ (catálogo dos livros proibidos). A censura estava institucionalizada.
O contexto, entretanto, era o da Reforma e da Contrarreforma. O índex e as fronteiras não bastaram para evitar que livros subversivos para um lado fossem impressos nas terras do adversário e voltassem contrabandeados a seu público-alvo.
Com a internet, onde basta um ‘enter’ para navegar por terras estrangeiras, é impossível controlar ideias e o que o Direito chama de delitos de opinião. E não se pode afirmar que isso seja um mal.