O livro do jornalista Amaury Ribeiro Júnior, A Privataria Tucana, da Geração Editorial, com primeira edição esgotada em menos de 48 horas, começa com uma informação de capa: “Os documentos secretos e a verdade sobre o maior assalto ao patrimônio público brasileiro. A fantástica viagem das fortunas tucanas até o paraíso fiscal das Ilhas Virgens Britânicas. E a história de como o PT sabotou o PT na campanha de Dilma Rousseff”.
Com o livro na praça, os canais telemáticos e as redes sociais movimentaram-se extraordinariamente, abundaram comentários e caixas-postais eletrônicas lotaram.
Não tardou a crítica quanto à posição silente dos denominados veículos tradicionais de mídia a respeito do livro, do seu conteúdo e dos documentos anexados.
Talvez tenham esses veículos que não se manifestaram concluído pela veracidade da afirmação do senador Álvaro Dias que, sem ler o livro, falou em “matérias requentadas”. Ou, talvez, estejam à espera do sempre tardieiro (confira-se caso Palocci) procurador-geral Roberto Gurgel. Com Gurgel, poderão correr o risco de ficar à espera de Godot, aquele personagem do teatrólogo irlandês Samuel Beckett.
A segunda edição do livro será apresentada quarta-feira [21/12], na sede paulistana do sindicato dos bancários, segundo corre pelas redes sociais.
Exceção da verdade
O estranho, a essa altura do campeonato e não se perca de vista a contundência do informado na capa do livro, é o silêncio tumular do excelentíssimo procurador-geral da República. E espera-se que não caia na prevaricação.
Como sabem até os rábulas de porta de cadeia de pobre, o direito de punir criminosos, incluída a chamada burguesia mafiosa brasileira, é do Estado-administração. E o seu exercício se dá por meio de ação criminal, cuja titularidade foi, pelo contrato social chamado Constituição de 1988, entregue ao Ministério Público. Isto porque o Ministério Público representa a sociedade civil.
Infelizmente, não temos no Brasil a ação penal popular. Aquela referida e defendida pelo saudoso jurista José Frederico Marques.
Pela ação penal popular, que não se confunde com a ação popular voltada a invalidar atos e contratos administrativos lesivos ao patrimônio financeiro público, qualquer do povo, no exercício da cidadania, poderia apresentar, para julgamento do Poder Judiciário, uma pretensão punitiva tipificada nas leis positivas criminais.
E já passou o tempo em que se cogitava que o pedido de arquivamento por parte do Ministério Público gerasse a legitimação de qualquer do povo para promover a ação. A respeito, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é remansosa no sentido de a última palavra caber ao Ministério Público.
No nosso sistema processual e criminal, frise-se, o titular da ação penal pública é o Ministério Público, observada a competência processual-constitucional dos órgãos federal e estaduais.
Até para desatentos leitores, o livro do jornalista Amaury Ribeiro Júnior apresenta notícias de crimes que não podem, exceção ao que ocorre em repúblicas bananeiras, escapar ao crivo do procurador Roberto Gurgel, procurador-geral da República e chefe do Ministério Público federal.
Em outras palavras, o procurador Roberto Gurgel deveria, até para não se cogitar crime de prevaricação, examinar, em regular procedimento a ser instaurado, o conteúdo e documentos referidos no livro A Privataria Tucana. Mais ainda, caso haja notícia de crime fora da sua atribuição, caberia enviar o procedimento à procuradoria competente.
Aqueles veículos de mídia que se mantém silentes talvez aguardem a palavra de Roberto Gurgel, até esclarecer se os documentos, em especial os que decorreram de exceção da verdade apresentada em juízo pelo jornalista Amaury Ribeiro Júnior, já foram objeto de análise pela Procuradoria-Geral da República: por evidente, não valerá o argumento de que Comissão Parlamentar de Inquérito já os apreciou, pois, como frisado acima, o titular da ação penal pública é o Ministério Público.
Pano rápido
A estranheza maior, pelo menos da minha parte, não está no silêncio de algumas mídias, mas no silêncio sepulcral de Roberto Gurgel.
O procurador Roberto Gurgel, já criticado ao se pronunciar pela constitucionalidade da Lei de Anistia aos torturadores do regime militar e que deu tratamento inusitado ao caso do ex-ministro Antonio Palocci, tarda a dar uma satisfação à sociedade. Afinal, a meta, voltando a Frederico Marques, é não deixar impunes os crimes e não punir os inocentes.
Que tal a sociedade civil organizada participar formalmente a Roberto Gurgel que o livro A Privataria Tucana apresenta notícias de crimes? O ofício seguiria com um exemplar para conhecimento de Gurgel que, pelo visto, ainda não as tem em mãos.
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[Wálter Fanganiello Maierovitch é jurista]