Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Ampliar o debate

O STF está para julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) nº 2.404, que visa a anular parte do artigo 254 do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), que trata da classificação indicativa dos programas de rádio e TV. Na TV aberta, por exemplo, a classificação impede que programas inapropriados para crianças e adolescentes sejam exibidos nos horários em que eles estão mais expostos para assistir. Prevê ainda sanções a quem a desobedece. É essa possibilidade de punição que vem sendo questionada no STF.

A ação foi proposta pelo PTB com o apoio da Abert (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão). Para eles, ao Estado cabe apenas indicar a classificação, e não punir quem veicula os programas que estariam inadequados, em determinados horários, à faixa etária indicada. Argumentam que o dispositivo fere a liberdade de imprensa e funciona como censura. A classificação indicativa vem sendo defendida pelo Conselho Federal de Psicologia e por quem trabalhava na defesa dos direitos da criança, como Andi, Conectas Direitos Humanos, Instituto Alana e Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos).

A regulamentação do horário de exibição de certos conteúdos é comum em países democráticos, como Canadá, França e EUA, visando essa proteção à infância e à adolescência, e só os programas de entretenimento estão sujeitos, não os jornalísticos. A TV está presente em 96% dos lares, e as crianças brasileiras assistem, em média, a quase cinco horas por dia. É inegável o seu impacto na formação e na saúde mental e emocional delas. O argumento de que cabe apenas aos pais o controle sobre o que os filhos assistem desconsidera que a formação psicossocial das crianças e dos adolescentes extrapola o espaço familiar.

Queremos a interferência do Estado em nossas famílias?

A proteção dos jovens é tarefa dos pais, sim, mas com o apoio da sociedade e do governo, que é quem dá as concessões de rádio e TV. Esse é o grande avanço do ECA. Se aprovada a Adin, o estatuto perde força. A punição acaba, de fato, impondo limites e evitando abusos e distorções.

É inequívoca a relevância da discussão sobre um assunto que envolve a formação das futuras gerações de brasileiros. Portanto ela não pode ser tratada como uma mera questão de gabinete, mas, sim, ganhar a participação de cada um dos lares do país.

Como queremos criar nossos filhos? Que contribuição queremos dar a eles? Quais princípios éticos desejamos que eles vivam e replicam em seus relacionamentos? Em que medida queremos a interferência do Estado em nossas famílias? Como expressamos nosso amor aos nosso filhos?

Enfrentando tais questionamentos vamos poder decidir como queremos cuidar do futuro do Brasil.

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[Marina Silva é colunista da Folha]