A economia americana criou em janeiro 243 mil empregos, quase o dobro dos 125 mil previstos pelos economistas ouvidos pela Dow Jones. A taxa de desemprego caiu para 8,3%, a mais baixa desde fevereiro de 2009. Foi a notícia internacional mais positiva desde o começo do ano, porque confirma, salvo um grande engano, uma recuperação firme, embora lenta, da maior economia do mundo. Isso interessa a todos, especialmente porque os europeus permanecem atolados na estagnação e na crise das dívidas soberanas.
A Folha de S.Paulo deu chamada na primeira página, abaixo da dobra: “Desemprego nos EUA cai ao menor nível em 3 anos; Obama comemora”. Outros grandes jornais deram algum destaque ao assunto, mas em páginas internas, sem sequer uma referência na capa do caderno especializado. Quatro anos e meio depois de iniciada a maior crise desde a Grande Depressão, uma sequência de sinais de melhora nos Estados Unidos – porque se trata de uma sequência – transcende os interesses eleitorais americanos.
Exceto no caso da Folha, essa notícia ficou reservada aos leitores habituais do material econômico, assim como a informação sobre a Mensagem ao Congresso enviada pela presidente Dilma Rousseff na abertura do ano legislativo. A mensagem é parte de um ritual, mas ninguém qualificará 2012 como um ano igual a qualquer outro. O documento contém um balanço de governo e um roteiro de ações para um período especialmente difícil, por causa do quadro internacional. O texto tem 472 páginas e o tempo seria escasso para uma leitura completa e minuciosa no mesmo dia, mas valeria pena dar um pouco mais de atenção àquele calhamaço.
Mínimo indispensável
O Valor publicou um bom material, detalhado e enriquecido com um quadro. A cobertura dos outros jornais quase se limitou às informações contidas em press-releases oficiais, com os títulos destacando as palavras “disciplina e ousadia”, o único sound bite contido nas páginas de apresentação.
A expectativa de um ano difícil havia sido ressaltada poucos dias antes pela secretária de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Tatiana Prazeres. A receita de exportações deverá crescer bem menos que em 2011, segundo a secretária, principalmente se a economia chinesa perder impulso. Dois dias depois, o ministério divulgou o resultado comercial de janeiro – um déficit de US$ 1,29 bilhão. Houve quem apresentasse esse número como o pior resultado em 39 anos, ou “da série histórica para o mês de janeiro”. Mais de um repórter teve o trabalho de cavar velhas estatísticas para montar essa comparação. Isso é um despropósito.
Não tem sentido comparar números absolutos do comércio exterior dos últimos cinco anos com os de períodos muito anteriores. Em 2000 o Brasil faturou cerca de US$ 55 bilhões com a exportação; no ano passado, US$ 256 bilhões. Em 1992, o valor vendido ao exterior ficou em US$ 35,8 bilhões. Atualmente, o país exporta mais que isso em dois meses.
Se a comparação for levada para mais longe, ficará ainda mais absurda. Não fica bem publicar besteirinhas desse tipo. Um jornalista especializado em economia deveria ter alguma informação básica sobre a evolução da economia nacional pelo menos no século passado – para ficar no mínimo indispensável, por se tratar de uma profissão de nível universitário.
História familiar
A maior parte dos jornais deu pouca importância, na mesma semana, às discussões internas do governo sobre como ficará o orçamento deste ano. Desde o começo de janeiro vem-se falando em controle de gastos para se garantir a meta fiscal de 2012. O Valor publicou na sexta-feira (3/2) um material extenso a respeito do assunto, indicando um contingenciamento provável de R$ 60 bilhões. Mas uma política severa poderá exigir um corte permanente ao longo do ano, em vez de um contingenciamento temporário. A importância do tema requer um acompanhamento mais constante e minucioso.
Os jornais cobriram com maior atenção a troca do comando no Ministério das Cidades, com a substituição de Mário Negromonte, acusado de irregularidades várias, por Aguinaldo Ribeiro, também do PP. Só o Valor e a Folha de S.Paulo foram mais longe ao traçar o perfil do novo ministro, mostrando suas ligações familiares com a velha oligarquia paraibana acusada de muitos desmandos e muita violência.
A história familiar, num caso desses, pode ser muito interessante, até para mostrar, se for o caso, o contraste entre a atual e as velhas gerações. O Ministério das Cidades tornou-se economicamente importante pela amplitude de seus programas e por sua responsabilidade em relação a obras para a Copa de 2014.
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[Rolf Kuntz é jornalista]