A campanha eleitoral em Porto Velho, capital de Rondônia, ganhou contornos inacreditáveis na reta final. Perto de completarmos 100 anos da fundação da cidade, seus eleitores foram traídos e deles foi arrancado o direito de conhecer melhor as propostas dos nove candidatos a prefeito no pleito de 2012.
A Justiça e a maior emissora de TV aberta do Brasil, a Globo, representada no estado pela TV Rondônia, protagonizaram um verdadeiro festival de descompromisso com a democracia e impuseram à eleição local um cenário de total falta de isonomia.
Embora tivesse anunciado por muitos dias em sua programação a realização de debate entre os cinco candidatos mais bem pontuados na pesquisa do Ibope, a Globo local desistiu (à revelia do eleitor responsável e do telespectador) e cancelou o confronto horas antes do início programado.
A suspensão ocorreu porque um dos candidatos, abaixo da linha de corte, conquistou na Justiça o direito de ser o sexto participante do debate. Mas a Globo, para não acatar a decisão, declinou do debate e de prestar um serviço à comunidade. Não podemos deixar de lembrar que a televisão é uma concessão pública e deveria ter atenção especial nesses momentos importante para a cidadania e a fortificação de nossa frágil democracia.
Liminar monocrática
Não fosse isso já grave e frustrante para uma massa de eleitores que tem na TV ferramenta fundamental para construir sua decisão sobre os rumos da cidade, mais ainda foi feito contra a democracia no dia 5 de outubro.
Ocorre que, antes de anunciar a decisão, a emissora já havia exibido entrevista com os quatro candidatos que ficariam de fora do debate. É o que podemos chamar de prêmio de consolação, pré-combinado, àqueles que deveriam ter a mesma oportunidade de apresentar suas propostas. Concedeu a José Augusto (PMDB) e Aloizio Vida (PSOL) cinco minutos para cada um, e pouco mais de um minuto e meio para Mario Sergio (PMN) e Walterio Rocha (PSTU). Com a suspensão do debate, o normal, óbvio e ululante seria a convocação dos demais para um espaço de exposição de, pelo menos, cinco minutos no horário nobre. A emissora teria que conceder o mesmo direito. Não o fez. Ignorou o fato.
Mas embora não tenha cedido à decisão da Justiça no caso de ampliar o número de participantes no esperado debate, no caso para seis, a Globo rendeu-se à liminar que deu à candidata Mariana Carvalho (PSDB), cujo advogado é filho do diretor geral da Globo local, o espaço de cinco minutos no noticiário local de quinta-feira (4/10). Tal parentesco em si não denota crime ou má-fé. No entanto, tudo contribui para uma visão turva do processo.
E o que pareceria óbvio (o mesmo direito seria concedido aos quatro candidatos ainda não contemplados) não se confirmou. Após a concessão judicial do direito dos outros candidatos a serem entrevistados no mesmo horário e tempo, a Globo soube mexer seus tentáculos e cancelar as entrevistas em liminar monocrática concedida pela presidente do TRE-RO, desembargadora Ivanira Borges Feitosa, meia hora antes de a entrevista ir ao ar, quando todos já estavam na emissora. Por que a Globo recorreu tão fervorosamente e deixou o PSDB ser descaradamente privilegiado?
Ações e explicações
Os grandes questionamentos após essa avalanche de irresponsabilidade são: por que teria a Justiça local concedido o espaço na TV Globo apenas à candidata tucana? Por que teria a TV Globo, independentemente da Justiça, se furtado de garantir a isonomia?
As respostas jurídicas virão e o povo sentirá um certo gosto de enganação no ar. A Justiça Eleitoral de Rondônia ainda não concluiu o exame dos graves problemas envolvendo as eleições de 2010, em que mandatos são questionados e crimes esperam julgamento. E continuam esperando a valorização da impunidade. No entanto, a celeridade, neste caso, ocorreu em um momento “inusitado”.
Embora sendo tenra, embrionária e em formação, nossa democracia, nossa cidadania e nossa inteligência tupiniquim esperam explicações e ações em relação aos comportamentos equivocados que permearam toda essa lambança.
Vou dormir com a sensação de que minha brasilidade foi ferida e maltratada em momento particularmente festivo para a nação.
Quem vai fazer algo?
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[David Nogueira é secretário de Comunicação do PT-RO]