Única emissora venezuelana que se mantém abertamente crítica ao governo de Hugo Chávez, a TV Globovisión acusa o chavismo de dar-lhe um golpe potencialmente mortal. O canal não foi incluído na grade de programação do sistema de TV digital gratuito, que começou a operar, em caráter experimental, na semana passada. Denunciando o que qualifica de discriminação, o diretor jurídico do canal, Ricardo Antela, afirmou que a decisão pode se converter numa “sentença de morte” da Globovisión. “Fora da grade da TV digital de sinal aberto, poderemos estar impedidos de transmitir em pouco tempo”, afirmou ao Estado.
O novo sistema, anunciado pelo vice-presidente Nicolás Maduro, incluiu 11 canais em sua grade – todas as emissoras estatais e outras três privadas, Televén, Venevisión, e Meridiano TV. Os decodificadores serão entregues gratuitamente a todas as famílias do país, um investimento estimado em mais de US$ 250 milhões.
De acordo com Antela, o telespectador só poderá seguir vendo a programação da Globovisión em UHF se abrir mão da transmissão digital, mas a ameaça contra a TV não para por aí. A concessão da emissora, para seguir operando como canal aberto, vence em 2015 e há claros sinais por parte do governo de que ela pode não ser renovada, a exemplo do que ocorreu em 2007 com a Radio Caracas Televisión (RCTV) – então a rede de TV de maior audiência da Venezuela.
Intenções ideológicas
Fora da grade da TV digital gratuita, porém, o governo nem precisaria lançar mão da medida impopular para calar a Globovisión. Logo depois de completar a distribuição dos decodificadores, o Estado abandonará a estrutura da transmissão analógica. Inicialmente, o chamado “apagão analógico” estava previsto para 2018, mas novas análises estimam que ele pode ser implementado três anos antes.
Pelas regras da Comissão Nacional de Telecomunicações (Conatel), a agência reguladora da mídia eletrônica na Venezuela, emissoras nacionais só podem transmitir via cabo se tiverem canais-âncoras de sinal aberto. Impedida de transmitir pelo sistema de TV aberta digital, portanto, a emissora desapareceria.
“Louvável em seu princípio, este projeto parece estar subordinado às intenções ideológicas do governo”, protestou, num comunicado à ONG Repórteres Sem Fronteiras. “Ele revela, uma vez mais, a concepção perigosa para o pluralismo que o Poder Executivo tem sobre o que deve ser o espaço audiovisual.”
Silvia Alegreti, presidente do Colégio Nacional de Jornalistas da Venezuela, também assinou um comunicado solidarizando-se com a Globovisión.
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[Roberto Lameirinhas, do Estado de S.Paulo]