Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Desfazendo mitos e preconceitos sobre as cotas

“Nenhuma das justificativas das pessoas contrárias às cotas se mostrou verdadeira.” [Ricardo Vieira Alves de Castro, reitor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)]

As cotas deram certo. Uma década depois, a política de inclusão de negros nas universidades brasileiras explode em resultados surpreendentes. É o que asseguram, num trabalho jornalístico de grande fôlego e do melhor quilate, estampado na IstoÉ de 10 de abril, os jornalistas Amauri Segalla, Mariana Brugger e Rodrigo Cardoso. A reportagem mostra que os cotistas vêm conseguindo notas mais elevadas que a média dos alunos. Nos vestibulares, têm-se saído tão bem quanto os não cotistas. No que lhes toca, os índices de evasão são baixos e a maioria já sai da escola com emprego garantido. Tem mais: graças às cotas, a qualidade do ensino brasileiro melhorou. E a vida de milhares e milhares de brasileiros se transformou.

As considerações alinhadas desmontam mitos e preconceitos, ainda hoje utilizados nos argumentos dos que, equivocadamente, se contrapõem à sábia política de inclusão social perseguida com o regime de cotas. É bastante sugestivo anotar os mitos e as verdades levantados no substancioso estudo. Um mito surrado é o de que as cotas estimulariam o ódio racial. A verdade apurada em pesquisa nas universidades federais é de que 90% dos educadores entrevistados são de parecer que as cotas não estimulam jeito maneira o racismo.

Outro mito derrubado: o de que os cotistas largariam a universidade no meio do caminho. Os fatos demonstram que a evasão entre cotistas e não cotistas se equivale. O exemplo do curso de Medicina da UERJ elucida bem a coisa. Em 2004, 94 candidatos a médicos passaram no vestibular, 43 deles cotistas. Da turma, 86 chegaram à colação de grau em 2010. Dos oito desistentes, quatro eram cotistas e quatro não cotistas.

Transformações substanciais

Outro mito, inspirado em rançoso preconceito, que também não sobreviveu à realidade dos fatos: as cotas viriam comprometer o nível de ensino, degradando o currículo das Universidades. A análise de especialistas revelou que o desempenho de cotistas e não cotistas é parecido. Em não poucos casos, a performance dos cotistas mostra-se até superior. Na UERJ, a comparação, ao longo de cinco anos, assinalou nota média de 6,41 para os cotistas e nota 6,37 (ligeiramente pior, está visto) para os não cotistas. Na Unicamp, segundo palavras textuais dos autores do trabalho “os alunos que ingressaram na Universidade por meio de um programa parecido como de cotas (e que estimulou a inclusão de negros) superaram seus colegas que não tiveram esse beneficio em 33 dos 64 cursos”.

Mais um mito jogado estrepitosamente por terra: com as cotas o vestibular teria discrepâncias. “A pontuação dos alunos aprovados como cotistas seria muito menor que a pontuação dos candidatos aprovados pelo sistema tradicional. Pior: ficariam de fora candidatos que tiveram notas muito mais altas do que os cotistas.” O que despontou foi algo bem diferente. De acordo com dados do Sisu (Sistema de Seleção Unificada), as cotas favoreceram, em 2013, 36 mil estudantes. Na disciplina mais concorrida, a nota de corte dos cotistas foi de 761.67. A dos não cotistas foi de 787,56. Diferença de apenas 25,9 pontos, ou seja, 3%.

Os repórteres vaticinam que as próximas gerações vão experimentar transformações ainda mais substanciais graças à aprovação recente pelo Senado Federal do projeto que regulamenta o sistema de cotas e que prevê que, até 2016, 25% do total de vagas nas Universidades federais contemplem estudantes negros. Esse é um dos caminhos, queira Deus indesviáveis, que o Brasil vem percorrendo na invasão do futuro.

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Cesar Vanucci é jornalista, Belo Horizonte, MG